Bar de Curitiba é condenado a pagar R$ 10 mil a analista negro barrado na entrada
Juliano Trevisan foi impedido por um gerente de entrar no local porque “estava parecido com o segurança”
Seis anos depois de ter sido barrado na entrada do James Bar, localizado em Curitiba, o analista de marketing Juliano Trevisan deverá receber uma indenização de R$ 10 mil por danos morais e constrangimento, após decisão de 1ª instância da Justiça do Paraná. À época advogado, Juliano foi impedido por um gerente de entrar no local porque “estava parecido com o segurança”.
“Imaginem a seguinte situação. Um homem é informado de que não pode entrar em uma casa noturna porque não está com roupas adequadas. Qual seria essa tal de roupa adequada?”, questionou.
Naquela noite, Juliano acabava de sair de um outro evento e usava uma camisa com manga curta de cor preta, calça social, sapato marrom e gravata preta. Embora os seguranças estivessem com outras peças de roupa, o gerente do local alegou que a prática da casa era impedir que ‘clientes pudessem ser confundidos com seguranças’. Ainda que diversas pessoas brancas com trajes semelhantes fossem permitidas a entrar no local, Trevisan foi o único a ser barrado, em uma explícita forma de racismo.
“Eu sabia o quanto é difícil comprovar um caso de racismo no Brasil. No meu caso a juíza não deixou claro na decisão o racismo”, aponta Trevisan em entrevista para Mídia NINJA.
Em sua decisão, a juíza Débora de Marchi Mendes apontou evidente constrangimento, além de afirmar que afirmar “que a mera circunstância de vedar o ingresso do autor no local em razão de sua vestimenta – sem que esta se apresente agressiva ou vexatória –, já resulta em claro abuso da ré e configura ato ilícito, na medida em que provocou evidente constrangimento”, disse.
À época, o bar disse que demitiu os funcionários envolvidos na açãovexatória. Para Trevisan, apesar da decisão judicial não citar o crime de racismo, é possível apontar fundamentos pedagógicos para que situações semelhantes não aconteçam com outras pessoas negras.
“Eu acho que o resultado demorou bastante para sair. São quase seis anos de processo, mas mesmo assim, é um sim que recebi. E foi um ‘sim’ da Justiça. E pra gente que recebe tanto ‘não’ na vida, quando recebe um ‘sim’ em uma situação como essa é motivo para comemoração, principalmente, porque vai servir como exemplo e amparo para outras ações que venham a acontecer”, disse.
O bar decidiu recorrer da decisão no último dia do prazo e caso deve ir para segunda instância.
Racismo no Brasil
Em um levantamento recente, a Fundação Getúlio Vargas (FGV) e Núcleo de Justiça Racial e Direito constatou que os registros dos casos de racismo no Estado de São Paulo são feitos como injúria racial e a maioria dos réus acabaram absolvidos dos crimes raciais cometidos.
Ao todo, 84% das denúncias eram registradas na Delegacia Especializada em Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) como injúria racial e não racismo. Em números absolutos, a pesquisa mostra que, dos 1.001 boletins de ocorrência, apenas 191 foram registrados como racismo, em oito anos de levantamento.
Só agora em 2022, o governo brasileiro decidiu regulamentar a lei que equipara injúria racial ao crime de racismo. O ato aconteceu durante a cerimônia de transmissão de cargo à ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. Na prática, a mudança altera o texto do Código Penal e torna as penas mais rígidas em casos de crimes cometidos contra indivíduos nas mais diversas situações, incluindo eventos esportivos.