
Atos contra ‘PL da Devastação’ tomam ruas do Brasil
Milhares protestaram contra nova lei do licenciamento ambiental, pediram veto de Lula e respeito a Marina Silva
Neste domingo (1º), milhares de manifestantes ocuparam as ruas de ao menos 12 estados em protesto contra o Projeto de Lei 2.159/2021, apelidado de “PL da Devastação” por ambientalistas e movimentos sociais. A proposta, que altera profundamente as regras do licenciamento ambiental no Brasil, foi aprovada pelo Senado em maio e agora aguarda votação na Câmara dos Deputados.
As mobilizações, que ocorreram em diversas capitais como São Paulo, Brasília, Manaus, Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre, reuniram ativistas ambientais, estudantes, organizações da sociedade civil e cidadãos indignados com o avanço do projeto, que é visto como o maior retrocesso ambiental das últimas décadas.
Um dos principais pontos de crítica é a criação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), que permite o autolicenciamento de empreendimentos de médio impacto sem análise prévia dos órgãos ambientais — bastando o preenchimento de formulários online. A medida enfraquece o papel de instituições como o Instituto Chico Mendes (ICMBio), a Funai, o Iphan e o Incra, retirando o caráter vinculante de suas análises no processo de licenciamento.



“Marina merece respeito” e “Veta, Lula!”
Além da rejeição ao PL, os manifestantes saíram em defesa da ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, que foi alvo de ataques misóginos no Senado na última semana, durante uma audiência na Comissão de Infraestrutura. A ministra deixou a sessão após ser hostilizada por senadores como Marcos Rogério (PL-RO) e Plínio Valério (PSDB-AM). Valério, inclusive, já havia declarado anteriormente ter “desejado enforcá-la”.
“É inacreditável que uma autoridade seja tratada com tanto desrespeito”, afirmou Claudia Paes, socióloga de 55 anos, durante a manifestação na Avenida Paulista. “Mas a gente sabe o que é ser mulher neste país.”
Cartazes com frases como “Marina merece respeito” e “Veta, Lula!” foram vistos em todos os atos, assim como críticas ao presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), pressionado a barrar a tramitação da proposta. Gritos de “Cadê o Lula defendendo a Marina?” também ecoaram entre os manifestantes.



Memória, resistência e urgência
Em Belo Horizonte, os protestos lembraram os desastres causados pela mineração em Brumadinho e Mariana e alertaram para os riscos da liberação de atividades mineradoras em terras indígenas, o que o PL poderia facilitar. Em Porto Alegre, mais de 60 movimentos populares se reuniram em frente ao Parque da Redenção com palavras de ordem que conectaram a proposta às enchentes históricas do ano passado: “Se o PL passar, a enchente vai voltar”.
Já em Florianópolis, manifestantes marcharam pela icônica Ponte Hercílio Luz denunciando a influência do agronegócio na formulação de políticas ambientais e no avanço do projeto no Congresso. Em Brasília, o Eixão do Lazer virou palco de faixas e bonecos em homenagem à Marina Silva. Também foi anunciada uma nova mobilização nacional no próximo dia 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, na Esplanada dos Ministérios.






Contradição diante da COP30
Em Belém (PA), cidade que sediará a COP30 — Conferência da ONU sobre o Clima — em novembro, o protesto foi marcado pela presença de representantes da sociedade civil e da Igreja Católica. O padre Dario Bossi, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), questionou a coerência do governo federal. “É uma grande contradição que um governo que se prepara para receber a COP30 esteja, ao mesmo tempo, permitindo mudanças que fragilizam a legislação ambiental”, afirmou. Ele defendeu o veto presidencial e uma eventual intervenção do Supremo Tribunal Federal (STF) para declarar a inconstitucionalidade do projeto.
O que está em jogo
Apresentado como uma medida para desburocratizar o licenciamento, o PL 2.159/2021 propõe, entre outros pontos:
- Licenciamento automático por autodeclaração para atividades de baixo e médio impacto;
- Dispensa de licenciamento para atividades agropecuárias tradicionais e manutenção de obras já existentes;
- Regularização de empreendimentos que operam ilegalmente;
- Uniformização nacional das regras, enfraquecendo a autonomia de estados e municípios.
Especialistas alertam que a proposta ignora o princípio da precaução, favorecendo interesses econômicos em detrimento da proteção ambiental, justamente em um momento em que o mundo observa o Brasil como protagonista climático.


Mobilização digital
Além das manifestações de rua, o movimento contra o PL também se articula nas redes sociais e em iniciativas virtuais. Um abaixo-assinado disponível no site www.pldadevastacao.org reúne o apoio de diversas organizações locais, nacionais e internacionais.