Por Leila Monnerat

Na madrugada do último dia 5, um ataque violento ocorreu na Ocupação Aliança com Cristo, localizada no bairro Jiquiá, Recife/PE, onde um grupo de mulheres desenvolve uma horta comunitária. Uma das lideranças do grupo e coordenadora do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto de Pernambuco (MTST-PE) foi ameaçada de morte. Houve disparo com arma de fogo. Homens encapuzados tentaram invadir a residência de uma moradora que abrigou as vítimas. O conflito, motivado por uma disputa territorial antiga envolvendo o Sítio Agroecológico das Margaridas, resultou na destruição completa do espaço de cultivo.

Essa ocupação enfrenta uma situação marcada por atos de violência e intimidação. No entanto, foi a primeira vez que as ameaças foram direcionadas pessoalmente. Segundo o MTST-PE, a Prefeitura havia emitido uma certidão negativa para o terreno na Rua Passo de Santa Cruz, esquina com a Rua Porto Estrela, indicando que a área não possuía registro de propriedade. Segundo o movimento, a pessoa que se diz dona do terreno é presidente do porto da cidade, filiado ao União Brasil e tem estreitas relações com figuras como Luciano Bivar, presidente do partido.

Ao ser perseguida, a vítima começou a filmar. (Fonte: MTST-PE)

Como tudo começou

O MTST/PE iniciou a atuação no território da Ocupação Aliança com Cristo em 2018. No começo da pandemia, as mulheres – por iniciativa própria – iniciaram o cultivo da horta na comunidade. No começo, era algo bem simples, com poucas pessoas. O número de mulheres foi se ampliando, se tornando uma rede consistente, também com o estabelecimento de parcerias, como com a Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE) e o Centro Sabiá, dando formato à Horta das Margaridas.

As mulheres se mobilizaram e a ocupação de um terreno, que até então estava sem uso e cujo dono era desconhecido, foi ganhando volume. Com o crescimento da ocupação e do número de pessoas envolvidas, foi proposto um projeto pelo MTST/PE e instalação de um espaço de convivência coletivo dentro do terreno da horta, um parque para as crianças brincarem. E a partir daí se iniciaram os conflitos e ameaças, com o aparecimento de um suposto “dono” do terreno. Por conta das ameaças sofridas, as mulheres decidiram transferir a horta pra outro terreno, cedido por um morador do bairro. Há cerca de um ano e meio as mulheres vinham desenvolvendo a horta no novo endereço.

Voluntárias em atividade na Horta das Margaridas (Foto: MTST-PE)

Omissão do poder público

Há aproximadamente seis meses, a Prefeitura do Recife, através da Secretaria de Agricultura Urbana, fez contato com a liderança da horta, e propôs a instalação do primeiro Sítio Agroecológico de Recife. Na ocasião, a Prefeitura fez uma série de levantamentos em cartório e verificou que o terreno anteriormente ocupado pela horta – e que vinha sendo alvo de disputas – não tinha registro de posse, ou seja, não tinha um dono. Sendo assim, a Prefeitura garantiu à liderança que não havia nenhum impedimento legal para a reocupação do terreno pela horta.

Por esse motivo, em 13/06, foram reiniciadas as atividades de reocupação do terreno anterior, para recompor a horta. As ameaças voltaram a acontecer a partir do último dia 03, culminando com o episódio violento do dia 5/7. Segundo o MTST/PE, a Secretaria de Agricultura Urbana abandou as voluntárias à própria sorte, não abrindo diálogo com moradores e lideranças para solucionar essa disputa.

Só restaram destroços no terreno ocupado pelo Sítio Agroecológico das Margaridas (Foto: MTST-PE)

O Secretário Executivo de Governo informou que o suposto proprietário não apresentou comprovação legal de posse do terreno. Diante disso, os movimentos sociais envolvidos na horta exigem que a Prefeitura do Recife garanta a segurança da Ocupação Aliança com Cristo e se responsabilize pela legalidade do terreno.

A iniciativa da horta comunitária é reconhecida pela Secretaria Executiva de Agricultura Urbana da Prefeitura de Recife. As ações de Agroecologia e Agricultura Urbana na área são apoiadas por diversos movimentos sociais e organizações e, apesar do aval da Prefeitura, o MTST-PE alerta que disputas como essa são cada vez mais frequentes na comunidade e na Região Metropolitana de Recife. Voluntários se encontram vulneráveis e em risco de morte devido à falta de ação do governo municipal. O MTST-PE enfatiza a importância de investigar o caso para evitar impunidade e reforça que qualquer reivindicação de posse deve ser resolvida por meios legais, não por ações criminosas.