#ArtistaFOdA A potência preta de Caio Prado
Desde o lançamento do seu primeiro álbum – Variável Eloquente (2015) -, Caio Prado, cantor e compositor criado no bairro de Realengo – Rio de Janeiro, conseguiu tocar muitas pessoas e provocar reflexões através do seu trabalho.
Por Marcelo Mucida, para @planetafoda*
Desde o lançamento do seu primeiro álbum – Variável Eloquente (2015) -, Caio Prado, cantor e compositor criado no bairro de Realengo – Rio de Janeiro, conseguiu tocar muitas pessoas e provocar reflexões através do seu trabalho. “Não Recomendado”, uma das faixas deste primeiro disco, se tornou conhecida nacionalmente e foi considerada por muitos um hino para a comunidade LGBTQIAP+. A música foi cantada por diversos artistas e gravada por Elza Soares em Planeta Fome, 2019.
Caio é o artista entrevistado para a editoria #ArtistaFOdA desta semana. Ele contou um pouco sobre o seu novo projeto, que se chama Griô – terceiro álbum autoral da sua carreira. O trabalho será dividido em etapas, sendo que a primeira compreende o lançamento de três singles: “Não Sou Teu Negro”, que será lançado nesta sexta-feira, dia 20 de novembro; “Baobá”, apresentado no dia 04 de dezembro; e “Cantiga de Erê”, que sairá no dia 15 do mesmo mês, concluindo assim o ciclo de 2020.
“Griô procura apresentar as narrativas da busca por uma identidade preta. Acredito que o trabalho seja um amadurecimento nessa interseção entre raça e gênero em que me encontro, sendo uma bicha preta de Realengo, que por muito tempo foi silenciada. […] Procurar entender esse processo de ser uma bicha preta efeminada do subúrbio do Rio é algo contínuo e acho que estou traduzindo isso em Griô.” – conta Caio sobre a nova criação.
A palavra que dá nome ao disco remete à prática cultural que nasceu na África Ocidental e que corresponde ao compartilhamento de histórias e de experiências vividas, que são transmitidas por gerações através da oralidade. É a preservação da história, da sabedoria e da mitologia de um povo, que são passadas para as novas gerações através da tradição oral.
Fazendo relação com esta prática, o álbum de Caio possui um teor político, como muitos dos seus trabalhos, mas se propõe também a pensar sobre uma cultura preta, como comenta o artista. A obra fala também de afeto, de amor entre os pretos, de uma luta antirracista, de ancestralidade e religião.
Você vê a construção da sua arte como forma de protesto? – foi uma das perguntas direcionadas nesta entrevista. O artista, então, pontuou que para ele a arte é um reflexo da realidade e que, sobretudo agora, ela deve sim tocar em questões urgentes, como as mortes provocadas pela pandemia de COVID-19, o genocídio preto causado pela militarização da política e a luta contra um discurso fascista que se difunde atualmente.
“É o que eu acredito e é o que eu acho que pode refletir na sociedade e amplificar vozes, porque o retorno que eu recebo do público que acompanha o meu trabalho é muito profundo. Eu me sinto representando muitas pessoas nesse momento. E pessoas que acreditam nos seus sonhos, no seu valor, e que podem desenvolver os seus propósitos de vida com ética, com justiça e buscando essa equidade na sociedade. […] Então é um manifesto artístico, porque a arte existe para isso. Para ser um fator social, e não só entretenimento. A arte é um fator decisivo pra gente educar e mudar a sociedade”, diz Caio.
No dia 20 de novembro, dia da Consciência Negra e de Zumbi dos Palmares, o artista lançará o primeiro single de Griô, que se chama “Não Sou Teu Negro” – composição gravada no Estúdio Toca do Bandido, com produção musical de Felipe Rodarte. A música se apresenta como um manifesto antirracista, fazendo uma saudação a Zumbi e traçando a trajetória histórica da desumanização que o povo preto sofre desde a colonização. O trabalho traz também uma reflexão sobre como o racismo é uma questão estrutural que perdura por muito tempo na nossa história, e que só poderá ser combatida quando houver de fato uma maior representatividade preta nas mais diversas instâncias da sociedade.
O artista reforça a importância para que esta representatividade aconteça também de forma institucional: “… que os espaços sejam devidamente ocupados. Institucionalmente. A gente precisa ter esses espaços escurecidos, porque somos a maioria da população. Uma maioria que não tem condições iguais atualmente”.
As outras duas músicas que serão lançadas em 2020 trazem parcerias de Caio com outros artistas, fator que marca uma nova fase na sua trajetória. “Baobá”, foi criada a partir de uma poesia escrita por Verônica Bonfim, e fala sobre uma conexão com a ancestralidade e sobre a liberdade para que os corpos possam ser o que quiserem, sem estarem moldados a partir de julgamentos e/ou falsos moralismos.
Já “Cantiga de Erê”, é uma parceria de Caio com Jean Kuperman, que o artista apresenta como uma canção de acalanto, esperança e amor, que se propõe a falar para e com as crianças. Ele também comenta que a composição lembra o formato de uma parlenda e aborda a cultura preta.
“Não Sou Teu Negro” estará disponível nas plataformas digitais de Caio Prado no dia 20 de novembro, e os links podem ser acessados através do seu perfil no Instagram: @ocaioprado.
*@planetafoda é a página de conteúdos LGBTQIAP+ produzidos pela rede FOdA, da Mídia NINJA, junto a colaboradores em todo o Brasil.