Por Lucas de Paula

Anora poderia ser surpreendentemente bom, mas se torna mediano quando transforma uma narrativa cheia de potencial em um Tom & Jerry com capangas russos. A história de Ani, uma garota de programa envolvida com Vanya, o filho de um oligarca, parecia ter profundidade para explorar a fantasia do amor romântico de uma mulher que, até então, só se via feita para o sexo, mas não foi isso o que aconteceu. Conforme o filme avança, tudo vira um grande jogo de gato e rato, com um tom “pastelão” digno de um episódio do Zorra Total – e aqui me refiro ao humorístico sem juízo de valor, apenas como sinônimo de caricato.

A trama perde o fio da meada quando os capangas do pai de Vanya “sequestram” Anora e passam a buscar, a qualquer custo, o jovem recém-casado para anular a decisão, mudando totalmente o rumo de um filme que parecia querer aprofundar os dilemas da relação de dois jovens vindos de realidades totalmente diferentes. Os vilões russos (mais do que clichê, um estereótipo hollywoodiano) deveriam representar uma ameaça real, mas se tornam caricaturas que divergem completamente da proposta inicial do longa. As cenas de perseguição, as trapalhadas e o exagero enfraquecem a carga dramática da história. O problema não é a comédia presente no filme, mas a forma como é executada, principalmente quando envolve um tema que requer tanto cuidado.

A surpreendente atuação de Mikey Madison, que inicialmente conduz o filme com uma mistura de doçura e provocação, acaba sendo subaproveitada conforme a trama se transforma em um coliseu romano exagerado, onde os vilões russos se digladiam com Anora para anular seu casamento. Esse desvio impede que a relação de Ani com Vanya seja explorada de forma mais densa.
O roteiro opta por situações absurdas e muita gritaria, recorrendo a soluções fáceis e frustrando a promessa de um filme que transitava entre o drama e uma pitada leve de comédia. Ao fim, acaba sendo um espetáculo de exageros que dilui qualquer chance de redenção da narrativa. Mais do que caricato, Anora até mesmo esquece o protagonismo de sua personagem que dá nome ao filme, transformando-a em uma mera coadjuvante de uma busca incessante por alguém que, na realidade, o público não faz questão alguma que seja encontrado.

Texto produzido em colaboração a partir da Comunidade Cine NINJA. Seu conteúdo não expressa, necessariamente, a opinião oficial da Cine NINJA ou Mídia NINJA.