Por Ana Pessoa

Acompanhando a 14ª edição do Animage – Festival Internacional de Animação de Pernambuco – fica evidente o poder transformador da animação. Com sua combinação única de poesia visual e narrativa simbólica, a animação consegue abordar temas complexos, como guerras, aceitação do corpo e maternidade, de forma sensível e profunda. Essa linguagem artística não só transcende barreiras culturais e linguísticas, mas também oferece novas perspectivas sobre temas difíceis de serem retratados em outros formatos audiovisuais.

Apesar de sua capacidade de contar histórias delicadas com impacto visual e emocional, a animação ainda é muitas vezes subestimada. Em grandes festivais de cinema, ela acaba relegada a segundo plano. No Brasil, essa arte deveria receber mais destaque, especialmente porque oferece uma maneira única de reinterpretar e dar novas camadas a histórias locais. Festivais de cinema, de modo geral, precisam olhar com mais atenção para essa produção, dando o reconhecimento que a animação já conquistou em outras partes do mundo.

Este ano, a Mostra Competitiva, com 71 filmes, reflete uma significativa representatividade feminina: 41 dos filmes têm direção de mulheres, somando 49 diretoras e compondo uma programação onde 57,8% das produções são assinadas por mulheres. Essa presença é uma resposta à necessidade urgente de mais diversidade e inclusão em uma indústria ainda dominada por homens, mostrando que a animação é um espaço de liberdade criativa e de vozes plurais.

Os filmes selecionados também abordam temas políticos e sociais relevantes, como as guerras no Leste Europeu em There Are People in the Forest, o nazismo e o antissemitismo em Papillon, e a guerra da Ucrânia em Usual Day. Outros, como Nebsei, exploram o conflito da Guerra do Tigré na Etiópia, enquanto The Car That Came Back from the Sea reflete sobre o fim da União Soviética. Questões como a repressão na Faixa de Gaza são discutidas em Hide & Seek, e a violência parental é retratada em Kakomando. Temas contemporâneos, como a dependência digital em A Menina com os Olhos Ocupados, e a repressão política em It’s a Gray, Gray World também estão em destaque. As identidades de gênero são exploradas em La Eterna Busqueda del Quién, e o conservadorismo que afeta crianças e adolescentes é abordado em Our Uniform. Outros filmes, como Kissing Day, tratam da criminalização da homossexualidade na Rússia, enquanto The Meatseller foca em uma refugiada nigeriana e Hermanos Casablanca na ditadura chilena.

É por isso que festivais como o Animage são tão essenciais. Eles não apenas exibem o que há de melhor na animação global, mas também incentivam a produção local e oferecem uma plataforma vital para a troca de ideias entre cineastas. Com oficinas, masterclasses e debates, o festival cria um espaço de formação que fortalece o setor e estimula novas gerações de animadores.

Mais do que um entretenimento ou fantasia infantil, a animação é uma linguagem artística capaz de capturar a condição humana de maneira singular. O Animage, com sua curadoria inclusiva e plural, nos lembra que essa arte merece mais visibilidade e respeito, não apenas como parte do cinema, mas como uma forma de expressão com profundidade e relevância própria. O Brasil precisa de mais festivais como este, que valorizem nossos cineastas de animação e seus trabalhos.

Foto: Ana Pessoa/Mídia NINJA