Sob alerta para a oitava onda de calor de 2024, Cuiabá deve registrar temperaturas acima dos 41º C nos próximos dias. Há dias encoberta por fumaça, a capital de Mato Grosso, estado que lidera o ranking nacional de queimadas, já experimenta amostras dos efeitos de uma crise climática que tende a se agravar. Ainda assim, a questão é abordada por apenas um dos quatro candidatos na disputa pela prefeitura neste ano.

Lúdio Cabral (PT), o único a usar o termo “emergência climática” para se referir ao calor extremo, está entre os três primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto, brigando contra a máquina estatal, aliada ao presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, deputado Eduardo Botelho (UB), e contra o legado bolsonarista, representado pelo deputado federal Abilio Brunini (PL).

Em seu plano de governo, o petista propõe criar o Plano Municipal de Enfrentamento às Mudanças Climáticas com políticas de adaptação e mitigação à crise, medida reforçada pelo plantio de árvores, recuperação de matas ciliares e proteção de áreas úmidas. Lúdio também propõe criar corredores verdes interligando parques, praças e outras zonas arborizadas da cidade, amenizando assim as temperaturas.

O modelo se inspira nos corredores verdes de Medellín, que desde 2016 vem mostrando eficiência para reverter esse quadro e garantiram uma queda de 2° C na temperatura da cidade, conforme divulgado pela administração local. Lá, o programa inclui mais de 30 corredores que conectam calçadas de ruas recém-arborizadas, jardins verticais, cursos d’água, parques e morros próximos.

Em Cuiabá, o trabalho começaria pelo Morro Luz, no Centro Histórico, que seria interligado ao Parque Mãe Bonifácia na região do Ribeirão do Lipa. Para isso, Lúdio quer aprimorar o Plano Municipal de Arborização Urbana/(Re)florestamento Municipal para garantir o reflorestamento em áreas urbanas e periurbanas com vegetação nativa, árvores frutíferas e plantas medicinais.

Por outro lado, se depender de Eduardo Botelho ou Abilio Brunini, representantes da direita e da extrema direita respectivamente, Cuiabá seguirá entre as 15 capitais brasileiras que não tem um plano de combate às mudanças climáticas. E pior, poderá ter sua situação climática agravada pelas propostas dos candidatos.

As apostas de Botelho, por exemplo, incluem o plantio de árvores e a capitalização do calor, aproveitando “o mote que ‘Cuiabá é a cidade mais quente do Brasil’ com ruas e festivais temáticos com sorveterias, sucos e choperias para atrair Parques Aquáticos para a cidade”. Ele também quer construir seis avenidas, inclusive sobre áreas verdes, ligando condomínios de alto padrão nos limites da cidade.

Candidato do governador Mauro Mendes (UB), amplamente usado para alavancar sua campanha, o presidente da AL vem garantindo junto ao governo estadual uma sequência de aprovações de leis que flexibilizam a proteção ambiental, ampliando permissões para a mineração em área de Reserva Legal (Lei Complementar nº 788/2024) e para a criação de gado em áreas protegidas do Pantanal (Lei 11.861/2022), por exemplo.

Abilio Brunini também defende a arborização para combater o calor extenuante. Candidato do ex-presidente Jair Bolsonaro na disputa, ele afirma em seu programa eleitoral que vai plantar 1 milhão de árvores pela cidade e já declarou que buscará parcerias com o agronegócio para isso. Em 2023 o setor derrubou 1.774.709 de hectares de árvores no Brasil, segundo o Mapbiomas.

“Cuiabá 2050 é um projeto de todos nós, que acreditamos na força da liberdade, na importância dos valores conservadores e na necessidade urgente de proteger nosso meio ambiente”, diz o plano de governo de Abilio no único trecho em que as mudanças climáticas são mencionadas.

Praia artificial

Botelho não traz um plano de enfrentamento às mudanças climáticas, mas destaca a construção de uma praia artificial com orlas para entretenimento como uma das estratégias para a crise. Sobre as águas que já banham a cidade com rios e nascentes, suas propostas se resumem a “ações de revitalização das matas ciliares do rio Cuiabá”, ignorando o rio Coxipó, que abastece a maior parte da população cuiabana.

Brunini, por sua vez, aponta sem dar muitos detalhes que implementará projetos de recuperação de rios e nascentes urbanas e realizará limpezas periódicas nesses pontos.

Já Lúdio propõe o Programa de Reestruturação do Ecossistema da Bacia Hidrográfica para recuperar Zonas de Interesse Ambiental (ZIA) do Ribeirão do Lipa, do Rio Cuiabá e do Rio Coxipó, que contará com uma zona de segurança hídrica. A iniciativa abrange ainda 29 córregos urbanos que cortam a capital, a maior parte deles contaminada ou canalizada.

Queimadas

Para além da arborização e da conservação de áreas úmidas, a emergência climática exige uma série de medidas de adaptação aos eventos extremos, como a seca severa que multiplica os incêndios ao redor de Cuiabá. A cidade está na rota da fumaça e das queimadas, que já ultrapassaram os 4.500 focos no estado esse ano, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Este problema também é encarado apenas por Lúdio Cabral, que informou que vai criar uma brigada municipal para atuar no início dos focos, dando suporte ao corpo de bombeiros tanto na zona urbana quanto na zona rural.

Além disso, seu plano prevê que uma Rede de Agentes Territoriais Ambientais atuará nas comunidades, desenvolvendo ações preventivas na área de meio ambiente e de risco de desastres, fortalecendo a área ambiental e de defesa civil. A proposta inclui campanhas de engajamento para a adesão ao programa Cuiabá – Território Verde e Resiliente e o lançamento de um programa de monitoramento da qualidade do ar.