Por Estela Monteiro

Na última quinta-feira (12), o procurador regional da República, Felício Pontes Jr, falou sobre o tema “Amazônia: Litigância Estratégica na Defesa da Sustentabilidade”, em mais uma edição do Café Democrático, promovido pela Associação Advogadas e Advogados Públicos para a Democracia (APD) e Advogados pela Democracia, Justiça e Cidadania (ADJC). O evento é feito em parceria com o Café Oyá, cozinha vegetariana, que funciona na 109 norte, em Brasília (DF), onde o debate ocorreu. A mesa foi presidida por Carlos Gondim, procurador federal e membro da APD e também contou com a presença de Aldo Arantes, constituinte e coordenador da ADJC.

Pontes Jr iniciou o debate explicando as estratégias adotadas pelo Ministério Público Federal para dar celeridade e garantir um julgamento favorável à causa do meio ambiente em ações que envolvem povos tradicionais e seus territórios e sustentabilidade. “Na 1ª Região, temos que fazer com que o processo seja pautado, primeiramente. No entanto, temos o entrave do tamanho do acervo — cada desembargador que milita por essas causas tem cerca de 23 mil processos em seus gabinetes — e, sabemos que a segunda instância é onde o processo trava, chega a tramitar por mais de 20 anos. Isso é muito desfavorável a nós, porque o processo geralmente se estabiliza de forma contrária à nossa causa” contextualiza.

De acordo com o procurador, o MPF optou por fazer uma triagem de quais ações são as mais urgentes para a causa ambiental. Em muitos deles, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e a Fundação Nacional do Índio (Funai) são parte. “Na primeira listagem, foram 789 processos. Depois fizemos uma peneira e baixamos para cerca de 580. Distribuímos entre os procuradores que militam na área e cada um fica responsável por uma parte deles. Utilizamos dois sistemas para acompanhar o andamento dos processos: push do Tribunal Regional Federal e o sistema único do MPF”, explica. O acompanhamento do processo pelos desembargadores permite que eles se organizem para fazer a sustentação oral no julgamento, buscando ganhar a causa em favor do meio ambiente e consolidar jurisprudência.

Pontes Jr explicou também que os processos selecionados são de ações que geralmente contrapõem dois lados da moeda do desenvolvimento: o desenvolvimento predatório, que inclui pecuária, mineração, madeira, monocultura e, de alguma forma, energia e o modelo socioambiental. “De um lado, temos um madeireiro ou fazendeiro querendo entrar em áreas públicas ou querendo deslocar uma população local de quilombolas ou indígenas e do outro, esse modelo de exploração (socioambiental) das comunidades, que parece antigo, mas não é”, esclarece.

Foto: Thiago Moscoso

Desenvolvimento sustentável

Outro tema discutido no Café Democrático foi a questão do desenvolvimento. Para Aldo Arantes, o modelo de desenvolvimento incorpora três fatores: o econômico, o social e o ambiental. “Não incorporar o fator ambiental é um retrocesso, mas absolutizar essa questão não leva em conta o interesse das populações dos trabalhadores, não só indígenas e quilombolas, mas os de trabalhadores rurais e urbanos”, levanta o constituinte. “A questão está exatamente em formular um modelo de desenvolvimento que leve em consideração os três fatores. No caso da Amazônia é mais complexo, porque temos a mata amazônica. E sua maior riqueza é a biodiversidade. Esse é o grande manancial. Temos o minério, a madeira, as águas, mas a biodiversidade é o mais rico”, completa.

O procurador Felício Pontes Jr acredita que a Amazônia é deixada de lado nos planos de desenvolvimento desde a época das capitanias hereditárias, quando a região também ficou de fora do rateio e a exploração predatória tomou conta da região. “Quando se pensou no desenvolvimento da Amazônia, só se pensou em madeira, pecuária e no ciclo da borracha. Fora isso, ela ficou esquecida. E foi destinado muito dinheiro nisso, com financiamento da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), Banco do Brasil e Banco da Amazônia. A Sudam destinava 90% do financiamento para madeira e pecuária. E mesmo após a sua extinção, esse projeto predatório insiste em não morrer”, afirma.

O procurador afirma que o modelo de desenvolvimento sustentável calcado na agroecologia é a resposta para que a floresta continue de pé. De acordo com ele, o modelo é altamente lucrativo. “Hoje são catalogados 1200 produtos da floresta economicamente viáveis. Se não se fizesse nada com a Amazônia, ela já nos renderia 692 bilhões de dólares. Além disso, se descobriu que a faixa mais fértil e mais rica do Brasil, o centro-sul do Brasil, depende dos “rios voadores”, que vem da Amazônia. Na mesma latitude, essa área é deserta em toda a faixa do globo terrestre”, explica. Ele se refere ao fenômeno descoberto pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, pelo qual o ciclo das águas formado com a contribuição das plantas da floresta leva chuvas para o todo o território brasileiro.

Já sobre os produtos passíveis de exploração econômica na Amazônia, Pontes Jr. cita o açaí como um dos mais rentáveis e que só conseguiu se posicionar no ano passado. “O açaí, por exemplo, é um produto que vinha muito abaixo no ranking de retorno econômico para a Amazônia. Só em 2018 ele passou ao segundo lugar, que era da madeira, e ficou atrás somente da pecuária”, afirma.

Queimadas

Para Aldo Arantes, o agravamento das queimadas é de responsabilidade do Governo Federal. “O senhor Bolsonaro estimulou as queimadas, tanto que no Pará se fez um dia do fogo. E foi dito claramente pelos fazendeiros de lá que isso era para ajudar o presidente a terminar de colocar fogo na floresta. Além disso, houve a desestruturação de todos os órgãos de defesa do meio ambiente. Uma decisão central foi colocar à frente do Ministério do Meio Ambiente um homem que é contra o meio ambiente. Há uma responsabilidade clara do Governo Federal nesse processo de queimada”, afirma.