Acordo para a floresta, mas sem consulta a indígenas: Coalizão reivindica autonomia na gestão de recursos
Taxas de desmatamento são significativamente menores em terras indígenas, o que torna fundamental investir nas comunidades
Bruna Obadowski, da Cobertura NINJA na COP26
Assinado por representantes de mais 100 países, o Forest Deal é um acordo firmado entre eles, com o objetivo de zerar o desmatamento até 2030. O Brasil também aderiu. O anúncio foi feito na segunda-feira (01), durante a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, que acontece em Glasgow, na Escócia.
O acordo prevê a distribuição de US$ 19,2 bilhões em recursos públicos e privados para ações de preservação das florestas, reflorestamento e proteção aos territórios indígenas. Mas mesmo indicando que pelo menos US$ 1,7 bi serão para comunidades dos povos originários e tradicionais, indígenas não foram incluídos na sua formulação.
Em nota, a Aliança Global de Comunidades Territoriais reivindicou acesso facilitado aos recursos e autonomia para gerenciá-los. Eles também pedem direito efetivo da posse da terra, como uma solução para mitigações das mudanças climáticas.
“Não podemos receber esta notícia com entusiasmo porque não fomos incluídos no desenho deste compromisso. Portanto, suspeitamos que muitos desses recursos serão distribuídos por meio de mecanismos tradicionais de financiamento climático, que têm demonstrado grandes limitações para atingir nossos territórios e apoiar nossas iniciativas. Embora milhões de dólares já tenham sido investidos para proteger as florestas e deter o desmatamento, os resultados são mínimos, pois os governos não estão presentes em nossos territórios e, consequentemente, têm dificuldade de administrar os recursos e implementar políticas de longo prazo que protejam os recursos naturais”, diz trecho do comunicado.
No documento, a Aliança dos Povo Indígenas também apresenta sugestões para tornar o processo mais eficaz.
“Dado que os doadores públicos e privados, bem como as filantrópicas, têm dificuldade em distribuir fundos ao nível da comunidade, desenvolvemos uma série de recomendações para facilitar este processo. Essas recomendações constituem uma nova visão, a Visão Shandia: um ecossistema de financiamento que finalmente permitirá que o apoio financeiro chegue aos nossos territórios”.
A Aliança também se comprometeu a cobrar dos governos e investidores as promessas financeiras feitas durante a COP 26 para que este recurso chegue efetivamente às comunidades. “Propomos uma nova forma de investir recursos diretamente em nossas comunidades, que estão na linha de frente das mudanças climáticas e arriscam nossas vidas para proteger a natureza”, disse em nota Tuntiak Katan, líder indígena do Equador e chefe da Aliança Global.
A Aliança Global de Comunidades Territoriais é uma coalizão de comunidades indígenas e locais da Bacia Amazônica, Brasil, Indonésia e Mesoamérica.
Guardiões da floresta
De acordo com o relatório Governança Florestal por Povos Indígenas e Tribais, apurado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura e do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e do Caribe, as taxas de desmatamento na América Latina e no Caribe são significativamente menores em territórios indígenas, o que torna fundamental o investimento nas comunidades como forma de preservação e manutenção das florestas.
Estes números complementam o comunicado da Aliança Global de Comunidades Territoriais que reforça que, entre 2000 e 2012, as taxas médias anuais de desmatamento nas florestas na Bolívia, Brasil e Colômbia foram duas a três vezes mais baixas do que aquelas não manejadas por povos indígenas, reforçando ainda mais a importância do direcionamento dos mecanismos financeiros para garantir a posse da terra na luta e, consequentemente, alcançar o objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5 grau Celsius acima dos valores médios da era pré-industrial.
Subscrevem a declaração as seguintes organizações: Coordenador das Organizações Indígenas da Bacia do Rio Amazonas (COICA) e suas organizações membros dos nove países da Bacia do Amazonas; a Aliança Mesoamericana de Povos e Florestas (AMPB) e suas organizações membros de seis países mesoamericanos; a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB); a Rede de Povos Indígenas e Comunidades Locais para o Manejo Sustentável de Ecossistemas Florestais (REPALEF) na República Democrática do Congo; e a Aliança dos Povos Indígenas do Arquipélago (AMAN), que representa 17 milhões de povos indígenas em toda a Indonésia.
Leia a íntegra do comunicado, disponível aqui.
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