Por Ana Ju Costa 

“No início, era tudo pincel, água e papel”, assim começa a conversa com Robson Cavalcante, diretor, roteirista e animador do curta-metragem “Diafragma”. O filme foi exibido na última quinta-feira (11), na Mostra SEDA PLAY da Semana do Audiovisual SP, seguido pela exibição do filme “Assexybilidade”, de Daniel Gonçalves, e um debate.

Nossa conversa, que poderia muito bem ser um making of da animação alagoana, Robson abordou referências que vão dos animes ao quadrinista pernambucano Shiko, a formação em animação, cinema e acessibilidade, e a cena do cinema no interior do Nordeste. Em 2024, “Diafragma” foi indicado ao Prêmio Grande Otelo do Cinema Brasileiro, uma das maiores premiações do cinema nacional.

Um processo animado de empatia e de imersão 

Em seu processo criativo e de desenvolvimento, a empatia e a imersão foram os principais caminhos, relata o diretor. Robson é Animador 2D, fundador do Aqua Studio Desenvolvimento Criativo e cofundador da Escola Primal. 

Na época em que Robson dava aulas de música no Instituto dos Cegos da Paraíba Adalgisa Cunha, onde eram oferecidos esportes e atividades com uma visão anti capacitista, ele realizou entrevistas com as pessoas com deficiência visuais e criou um banco de ideias.

“Foi um desafio para mim, porque para fazer as metáforas visuais eu tive que pensar todos os dias como seria viver e perder a visão, eu fazia esse exercício diário.”

Ele ressalta a importância da convivência com pessoas e familiares próximos que convivem com a cegueira, ecoando a fala de Jéssica Teixeira, atriz e performer de “Assexybilidade”, sobre a importância da convivência entre PcDs e pessoas sem deficiência. Percebendo que o direito à uma cidade ou cinemas inclusivos e acessíveis é uma luta de todos nós. 

A acessibilidade é poética

Quando Robson viu pela primeira vez um livro de partituras musicais em braille, que seu aluno cego trouxe, ele pensou “o cego sou eu”. O curta-metragem conta com o kit de acessibilidade – com Libras, audiodescrição e legenda descritiva – de autoria do grupo de acessibilidade “Permear” da Bárbara Lustosa, de Maceió.

Conversamos bastante sobre como a direção e a linguagem de acessibilidade tem seu valor expressivo e poético. O diretor de “Diafragma” nos conta que a direção de Libras seguiu a direção artística do filme, assim como o personagem que usa uma camiseta vermelha, o intérprete também teve esse cuidado.

“Quem fez a audiodescrição foi a Bárbara Lustosa.(…) Ela faz uma descrição poética, procura colocar algum elemento poético para que quando a pessoa ouvir ela capte algo a mais. Ela faz com que a audiodescrição seja algo paralelo,  narra o que está acontecendo, e ainda permite uma outra forma de visualização da história.”

O cinema e a animação usam o exagero do humor e constroem uma realidade na inversão do ponto de vista. Metáforas como o muro de tijolos, que acompanham o personagem do filme.  

“Ela (animação) possibilita você mexer com a forma, ela permite mostrar uma realidade que existe nas entrelinhas, a gente tira das entrelinhas para tornar gritante.”

A trilha sonora do filme são efeitos percussivos corporais, de autoria do compositor paraibano Guilherme Medeiros e interpretada pela cantora Vanessa Moreno, trazendo o lúdico e brincando com a voz. 

Entre as inspirações com narração pessoal e poéticas, o diretor lembra tanto na animação alagoana “Guaxuma”, de Nara Normande, e “Sangro”, de Tiago Minamisawa e Bruno H. Castro.

Rotas para futuras produções independentes do interior

Além de continuar com as exibições e distribuição de “Diafragma”, Robson está envolvido no desenvolvimento de seu próximo curta-metragem animado com coprodutoras alagoanas Aqua Produção, La Ursa, Samba Caita, que versará sobre a cultura interiorana. 

Fazendo parte do pensamento da soberania do audiovisual nacional e a necessidade de criar rotas sustentáveis destaca sobre a Escola Primal que oferece cursos online formativos visando o fortalecimento da economia criativa.

“Diafragma” foi exibido em dezenas de festivais nacionais e internacionais, como os festivais Lanterna Mágica e Olhar de Cinema, e continua sua trajetória pelos festivais.

A animação ficará disponível na plataforma da Mostra SEDA PLAY até dia 21 de julho.