A lista de processos criminais que aguarda Bolsonaro voltar ao Brasil
Mentira sobre vacinas e o descaso na pandemia são alguns dos processos
Mentira sobre vacinas, descaso na pandemia, reunião com embaixadores para desacreditar sistema eleitoral que elegeu Lula, e o tirou da presidência do Brasil, são alguns dos processos
O ex-presidente de extrema direita Jair Bolsonaro (PL) afirmou nessa quarta-feira (15) que deverá retornar ao Brasil para ‘Liderar a oposição’ contra o governo progressista de Luiz Inácio Lula Da Silva. Bolsonaro está na Flórida, nos Estados Unidos, desde o final do ano passado. Apesar do entusiasmo do líder extremista para o seus seguidores, dezenas de processos criminais, e que o podem tornar inelegível, estão em investigação pela Justiça brasileira.
Com base em reportagem da BBC, A Mídia NINJA separou alguns dos principais crimes que Bolsonaro responde em diversas esferas judiciais já que, agora, não possui o foro privilegiado, e deixou de ter a ‘proteção’ do seu principal escudo: o procurador-geral da República, Augusto Aras, apontado como ‘engavetador-geral da República’.
CPI da Covid
Bolsonaro também tem acusações feitas contra ele — resultantes do relatório final da CPI da Covid — que estavam sendo apuradas pela Procuradoria-Geral da República. No entanto, Augusto Aras, visto como aliado do presidente, nunca chegou a denunciar Bolsonaro pelas acusações.
Na verdade, a PGR pediu arquivamento ao STF para oito das dez apurações preliminares de possíveis crimes cometidos. Entre elas, estão: acusação de ter causado epidemia com resultado morte (por suspeita de propagar o vírus); prática de charlatanismo (devido ao incentivo de uso de medicamentos sem eficácia); infração de medida sanitária preventiva (por realizar aglomerações e não usar máscara); uso irregular de verbas públicas (por uso de recursos públicos na compra de medicamentos ineficazes) e prevaricação (por supostamente não ter mandado investigar denúncias de corrupção na compra de vacinas).
Na época da divulgação do relatório final da CPI, Bolsonaro afirmou que a comissão não fez nada “produtivo” e gerou apenas “ódio e rancor”. Ele disse que não tinha “culpa de absolutamente nada”, e que o governo fez “a coisa certa desde o primeiro momento”.
Mas o STF ainda não decidiu se acolhe o pedido da PGR e arquiva as investigações. Se tivessem sido arquivadas, elas só poderiam ser reabertas pelo Ministério Público se houvesse novas provas.
Com a perda do foro, o Supremo decidirá se envia as investigações relacionadas a Bolsonaro para análise na Justiça comum. Mas é possível que as apurações fiquem no STF, se envolverem outros investigados que ainda possuem foro privilegiado.
Se o caso for para a Justiça comum, caberá a um procurador decidir se oferece denúncia. E competirá a um juiz de primeiro grau decidir se abre ou não ações penais contra Bolsonaro.
Interferência na Polícia Federal
A investigação foi aberta após denúncias do ex-ministro de Bolsonaro (e agora senador eleito) Sergio Moro, que ao deixar o governo em 2020, afirmou que o presidente fez tentativas de interferir indevidamente na atuação da Polícia Federal.
Bolsonaro negou interferência. Em entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo, durante as eleições, disse que, segundo Moro, a prova da interferência estava numa reunião do governo. E completou:
“Eu não tinha a obrigação de entregar a fita. Entreguei a fita. Foi revelado até muitos palavrões na reunião de ministros. Não acharam nada.”
A PGR afirmou que não existem provas suficientes contra Bolsonaro para imputação de crime e pediu o arquivamento. O STF ainda não decidiu se arquivará o caso. Se não for arquivado, também pode passar para a competência da Justiça comum.
Inclusão no inquérito das fake news
Em agosto de 2021, Bolsonaro foi incluído no chamado “inquérito das fake news”, que tramitava no STF desde 2019. A investigação apura produção de notícias falsas, falsas comunicações de crimes e ameaças contra os ministros do Supremo, e está ligada a um outro inquérito sobre atuação de milícias digitais para atacar a democracia no Brasil.
A inclusão de Bolsonaro na investigação aconteceu a pedido do TSE, que enviou uma notícia crime ao STF após uma transmissão ao vivo em que Bolsonaro divulgou notícias falsas que questionavam a confiabilidade do processo eleitoral.
Para o ministro Alexandre de Moraes, “observou-se, como consequência das condutas do Presidente da República, o mesmo modus operandi de divulgação utilizado pela organização criminosa investigada” no inquérito das fake news, “pregando discursos de ódio e contrários às Instituições, ao Estado de Direito e à Democracia”.
Apesar de ter algumas decisões divulgadas de tempos em tempos, o inquérito é sigiloso e tramita no STF em segredo de Justiça.
Por ter se originado a pedido do STF, este caso deve continuar tramitando na Corte.
No entanto, agora, caso Bolsonaro venha a ser indiciado, isso pode ser feito sem necessidade de participação da PGR. Por diversas vezes, o ex-presidente criticou o inquérito das fake news dizendo que é ilegal, por funcionar sem participação do Ministério Público.
“Alexandre de Moraes abriu um inquérito de mentira, me acusando de mentiroso. É uma acusação gravíssima. Ainda mais num inquérito sem qualquer embasamento jurídico. Não pode começar por ele. Ele abre, apura e pune? Sem comentários. Isso está dentro das quatro linhas da Constituição? Não está”, disse o ex-presidente em entrevista à rádio Jovem Pan, investigada por difundir fake news sobre o processo eleitoral.
Divulgação de dados sigilosos sobre ataque ao TSE
Bolsonaro também é investigado em um inquérito aberto em 2021 como um desmembramento do inquérito das fake news. A partir de uma notícia-crime enviada pelo TSE, o ministro Alexandre de Moraes determinou a abertura de uma investigação separada.
O inquérito desmembrado é sobre a divulgação de dados de uma investigação sigilosa sobre ataques ao TSE. Os dados foram divulgados por Bolsonaro e pelo deputado Filipe Barros com o envolvimento do delegado da Polícia Federal Victor Neves Feitosa Campos.
Segundo o TSE, o objetivo do vazamento seria contribuir para um narrativa fraudulenta sobre o processo eleitoral, “atribuindo-lhe, sem quaisquer provas ou indícios, caráter duvidoso sobre a lisura do sistema de votação no Brasil”.
Em fevereiro, a delegada da Polícia Federal que comanda a investigação enviou um relatório ao Supremo com a conclusão de que Bolsonaro cometeu crime de violação de sigilo funcional. Ela, no entanto, não poderia na época indiciar Bolsonaro por causa do foro privilegiado.
Em agosto, a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, pediu o arquivamento do inquérito, mas o pedido foi negado pelo ministro Alexandre de Moraes. O magistrado argumentou que a PGR não tem poder para impedir o prosseguimento de uma investigação policial que não foi requisitada pelo próprio órgão. Com a prerrogativa do foro privilegiado, Bolsonaro acabou não sendo denunciado por esse crime, já que isso precisaria ser feito pela própria PGR.
No entanto, agora Bolsonaro pode ser indiciado pela Polícia Federal e denunciado pelo Ministério Público, respondendo pelo processo na Justiça comum, se o Supremo decidir que não cabe manter o processo lá diante da perda do foro.
Notícias falsas sobre a vacina contra covid-19
A divulgação de notícias falsas sobre a vacina contra covid-19 é um dos crimes que a CPI da Covid acusa Bolsonaro de ter cometido.
O pedido de abertura do inquérito foi feito após o presidente ler uma notícia falsa em uma transmissão ao vivo nas redes sociais feita por ele em 21 de outubro de 2021.
A notícia enganosa dizia que pessoas vacinadas contra a covid no Reino Unido estavam “desenvolvendo a síndrome da imunodeficiência adquirida [Aids]”, o que não é verdade. Na mesma live, Bolsonaro citou notícias falsas sobre uso de máscaras.
Tanto o Facebook quanto o YouTube, plataformas nas quais Bolsonaro fazia a transmissão, retiraram a live do ar para evitar a disseminação da desinformação.
O caso foi investigado pela Polícia Federal sob supervisão do STF. A PF concluiu que ações de Bolsonaro se enquadram no crime de incitação pública à prática de crime (art. 286). Segundo a PF, o discurso teve potencial de alarmar espectadores e incentivá-los a descumprir normas sanitárias compulsórias na época.
Em agosto, o ministro Alexandre de Moraes, que é relator do caso, enviou o pedido de indiciamento de Bolsonaro ao Procurador-Geral da República, mas Aras nunca denunciou Bolsonaro por isso.
Em entrevista à rádio Jovem Pan, Bolsonaro se justificou dizendo que “apenas” mencionou na live uma matéria de revista que fazia a associação enganosa entre imunizantes e Aids. E criticou o fato de estar sendo acusado de crime pela declaração.
“Eu mostrei uma matéria. Não inventei aquilo. Agora falar qualquer coisa de vacina passou a ser crime”, criticou o ex-presidente.
Com a perda do foro privilegiado, o caso deixa de ser competência da PGR e passa para o Ministério Público Federal, que pode então enviar denúncia à Justiça Federal.
Ações que podem deixá-lo inelegível
Bolsonaro também responde a doze ações no TSE por suspeita de prática de crimes contra o sistema eleitoral.
Com a perda do foro, é possível que essas ações sejam enviadas aos TREs dos locais onde os crimes teriam sido cometidos.
No entanto, também é possível que a Justiça entenda que a competência para julgar algumas das ações continua sendo do TSE — não por foro de prerrogativa de Bolsonaro, mas pela natureza dos crimes.
Uma das acusações é de que Bolsonaro e o general Braga Netto praticaram abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação ao fazer um evento para embaixadores estrangeiros no Palácio da Alvorada em julho de 2022. No evento, transmitido pela TV Brasil, Bolsonaro fez ataques ao sistema eleitoral e a autoridades do Poder Judiciário.
Na época, a Presidência da República disse, em nota, que Bolsonaro manteve encontro com chefes de missões diplomáticas para intercâmbio de ideias sobre o processo eleitoral. E seu partido afirmou que o encontro não podia ser considerado propaganda eleitoral. Segundo o PL, foi uma reunião de governo, e não de campanha.
*Com informações da BBC e agências