A ascensão da participação feminina nos Jogos Olímpicos Modernos
A participação feminina sofreu intensa rejeição na primeira edição dos Jogos Olímpicos Modernos. Contudo, as pressões e mobilizações reverteram o cenário, e hoje, a participação das mulheres se tornou histórica.
Por Marília Monteiro, para Cobertura Colaborativa Paris 2024
No final do século XIX, o francês Pierre de Coubertin idealizou os Jogos Olímpicos Modernos, com o intuito de promover a paz entre as nações e melhorar a condição de saúde e educacional da população por meio do incentivo esportivo. Entretanto, Coubertin se opôs à participação das mulheres no primeiro Jogos Olímpicos de 1896, em Atenas, na Grécia. Segundo ele: “a presença de mulheres em um estádio era desagradável, desinteressante e imprópria”. Então, na primeira Olimpíada da era Moderna, as mulheres não participaram do evento, se tornando exclusivamente competições com participação masculina.
A estreia da participação feminina aconteceu na segunda edição dos Jogos Olímpicos de 1900, em Paris, na França. De um total de 997 atletas, 22 mulheres competiram em cinco modalidades: tênis, vela, croquete, hipismo e golfe, representando 2,2% do total de atletas. Cada vez mais ecoava o pensamento de igualdade na competição, o movimento de mulheres pressionava contra a rejeição da participação das mulheres nas Olimpíadas.
A entusiasta esportiva Alice Milliat lutou pela igualdade das mulheres nas competições. Em 1919, pediu à Federação Internacional de Atletismo (IAAF) que permitisse a participação feminina nos Jogos Olímpicos de 1920, em Antuérpia, mas a IAAF recusou. Milliat organizou competições em março de 1921, com a participação da França, Reino Unido, Itália, Noruega e Suíça. No mesmo ano, a Federação Esportiva Feminina Internacional foi fundada. Nos dois anos seguintes, o evento foi repetido em Mônaco e também aconteceu pela primeira vez os Jogos Mundiais Femininos, em 1922, em Paris.
Nos Jogos Olímpicos subsequentes, a participação das mulheres era diminuta comparada com a participação masculina. Em 1920, na Antuérpia, foi incluído o salto ornamental. No ano de 1924, em Paris, foi inserida a esgrima. Nos Jogos Olímpicos de Amsterdã, em 1928, as mulheres representavam 10% do total de participantes, além de poder competir em mais modalidades, como atletismo e ginástica. Nas Olimpíadas de 1984, em Los Angeles, nos Estados Unidos, a participação feminina representava 23% do total. Naquele ano foi criada uma categoria exclusivamente feminina de nado sincronizado e participou da categoria individual de ciclismo.
Na Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra as mulheres, em 1979, um tratado internacional sobre os direitos das mulheres, criado pela Assembleia Geral das Nações Unidas foi assinado por 188 países. Uma das recomendações é proporcionar “as mesmas oportunidades para participar ativamente nos esportes e na educação física.” Em 1981, a ex-atleta venezuelana Flor Isava e a ex-velocista finlandesa Pirjo Haeggman integraram o Comitê Internacional Olímpico, sendo a primeira vez que mulheres se tornaram colaboradoras do órgão.
Em 1991, o Comitê Internacional Olímpico elaborou novas regras de inclusão, cujas novas modalidades deveriam permitir a participação feminina em todos os esportes que fossem incluídos. As novas práticas foram halterofilismo, pentatlo, boxe, taekwondo, triatlo, salto de esqui e trampolim. Em 1995, na IV Conferência das Nações Unidas sobre a Mulher, na China, foram analisados obstáculos a serem superados para que as mulheres pudessem exercer plenamente seus direitos, e uma das recomendações seria:
“Proporcionar instalações recreativas e esportivas acessíveis; criar ou fortalecer, nas instituições educativas e comunitárias, programas com perspectiva de gênero para meninas e mulheres de todas as idades e apoiar o avanço das mulheres em todas as atividades atléticas e físicas, inclusive instrução, treinamento e administração, assim como sua participação nessas atividades nos níveis nacional, regional e internacional.”
Depois de quatro anos, em 1995, o Comitê Internacional Olímpico criou a Comissão de Esportes Femininos, com intuito de contribuir com políticas de incentivo à participação de mulheres nos esportes e prevenção de assédios e abusos, bem como acesso a cargos decisórios. Em 2007, o Comitê elaborou um novo estatuto, conhecido como Carta Olímpica, no qual uma das missões é “encorajar e apoiar a promoção das mulheres no desporto em todos os níveis e estruturas com vista à aplicação do princípio da igualdade entre homens e mulheres”. Nos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012, conhecido como “os jogos das mulheres”, foi a primeira vez que todos os países integrantes tiveram participação de uma mulher em suas delegações. No total, as atletas representaram 44% dos participantes, se tornando um marco histórico e de grande efervescência. Nas Olimpíadas de Tóquio, em 2021, a primeira mulher transgênera, a neozelandesa Laurel Hubbard participou do levantamento de peso, na categoria de +87Kg, considerado um marco para a comunidade LGBTQIAPN+ na participação das competições.
Nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016, 44% das medalhas olímpicas foram conquistadas por mulheres, o maior percentual de todos os tempos. Nas Olimpíadas de 2024, em Paris, a participação feminina bateu recorde. Após 124 anos da estreia das mulheres nas Olimpíadas, também em Paris, em 1900, a participação feminina nos Jogos se torna histórica, com 5.250 são mulheres, representando 50% do total de atletas.
No caso da participação feminina das atletas brasileiras, só foi possível nos Jogos de 1932, em Los Angeles, com a nadadora Maria Lenk, de 17 anos, a primeira atleta a competir pelo Brasil e a única sul-americana na competição. Nas Olimpíadas de 2024, a delegação brasileira tem maior número de mulheres do que homens, com a representação de 55% do total. Até o momento, as mulheres foram responsáveis por cinco das sete medalhas do Brasil. Entre os ganhadores estão Bia Souza, no judô; Willian Lima, no judô; Caio Bonfim, na marcha atlética; duas de Rebeca Andrade, no individual e no salto (ginástica); Rayssa Leal, no skate; Larissa Pimenta, no judô; por equipes na ginástica e no judô.
As competições vão até 11 de agosto, então, ainda temos a expectativa de mais medalhas.