por Raul Mareco

A Amazônia, patrimônio de relevância planetária e repositório inigualável de biodiversidade, confronta-se com uma situação de insegurança extraordinária que compromete tanto sua integridade ecológica quanto a estabilidade geopolítica regional. A realização da COP30 em Belém representa uma encruzilhada crucial para que líderes mundiais e representantes dos países amazônicos instituam compromissos sólidos de colaboração internacional no embate contra o crime organizado que devasta a maior floresta tropical do globo.

A região enfrenta uma avalanche de violência e ilegalidade que transcende fronteiras nacionais, manifestando-se em mais de dois terços dos municípios amazônicos, segundo apuração reveladora da Amazon Underworld. Em 662 cidades espalhadas pela Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, a presença de facções e grupos paramilitares tornou-se trivial, configurando um cenário de dominação territorial e confrontos sangrentos.

Particularmente inquietante é o fato de que em 32% desses municípios, não existe um único grupo criminoso, mas múltiplas organizações disputando o domínio. Agentes transnacionais como o Comando Vermelho (CV), o Primeiro Comando da Capital (PCC), os Comandos de la Frontera, a Segunda Marquetalia, o Estado Mayor Central (EMC — dissidência das FARC), o Exército de Libertação Nacional (ELN) e Los Choneros tecem uma rede de terror regional.

Mariana Plum, especialista em segurança e CEO do Centro Soberania e Clima, afirmou em entrevista à Agência Brasil: “Onde o Estado não chega, o crime ocupa. E onde o crime se instala, a floresta, as pessoas e o futuro ficam sob ameaça. Facções criminosas vêm se alastrando de maneira assustadora. Crimes contra a floresta e infrações ambientais cresceram mais de 50% no último ano. A devastação da Amazônia está andando de mãos dadas com a criminalidade.”

Atividades ilícitas enraizadas na floresta

A Amazônia brasileira transformou-se no novo epicentro do crime organizado na América do Sul. Num território de proporções continentais, 473 municípios — equivalentes a 71% das áreas amazônicas mapeadas nos seis países — sofrem sob o domínio sistemático de duas organizações: o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC). Estas deixaram de operar exclusivamente no tráfico de drogas, metamorfoseando-se em conglomerados multifacetados com interesses em garimpo ilegal, apropriação de terras públicas, extração clandestina de madeira, tráfico de fauna e redes sofisticadas de ocultação de capitais.

Ouro cor de sangue: Mineração ilegal como vetor de destruição

Entre os tentáculos dessa economia clandestina, a mineração predatória emerge como a mais rentável. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) revelam a magnitude do fenômeno: entre 2016 e 2022, a extração mineral em territórios indígenas multiplicou-se por 787%, ocupando 25 mil hectares distribuídos em 17 terras, superando posteriormente 241 mil hectares em toda a Amazônia brasileira.

Em determinadas regiões, o cenário adquire proporções cataclísmicas. Na Terra Indígena (TI)  Kayapó, a exploração expandiu 1.339% em quatro décadas. Na TI Munduruku, a invasão cresceu 129 vezes. Entre os Yanomami, a mineração se multiplicou mais de 20 mil vezes, consumindo terra, cursos d’água e existências com a mesma desonestidade que sustenta esta economia paralela.

O resultado emerge de forma inescapável: rios envenenados, florestas transformadas em crateras e comunidades tradicionais cercadas pela violência. O aspecto mais perverso desta nova fronteira criminosa reside na omissão estatal — um vazio institucional que consentiu às facções edificar sua própria estrutura econômica e territorial, convertendo a Amazônia num laboratório de dominação militarizada e mercantil onde o conceito de “lei da selva” deixou de ser meramente metafórico.

Soleane Manchineri, historiadora indígena e Ouvidora-Geral na Defensoria Pública do Acre, declarou em depoimento ao Amazônia Real: “Quando há uma denúncia, há uma retaliação, e geralmente a pessoa que denuncia é assassinada. Como a gente não tem um programa de proteção que seja eficaz para proteger a vida dessas pessoas que fazem denúncia, elas se negam a falar.”

Aiala Couto, pesquisador quilombola e doutor em Ciências do Desenvolvimento Socioambiental pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da UFPA (Naea), ressaltou ao Amazônia Real que o Acre adquiriu importância estratégica no mapa do narcotráfico regional. A fronteira com a Bolívia transformou o estado numa das principais entradas da cocaína que percorre silenciosamente a floresta rumo aos grandes núcleos de distribuição.

“É isso que está fazendo com que tenha hoje a entrada de facções criminosas em territórios indígenas. Há uma necessidade de o Estado criar mecanismos estratégicos de proteção desses territórios, considerando que as reservas indígenas são áreas territoriais que têm um tamanho bastante expressivo”, explicou.

Contaminação por mercúrio: envenenamento sistêmico

A multiplicação descontrolada dos garimpos ilegais abriu uma ferida invisível nas artérias amazônicas: a intoxicação em larga escala por mercúrio. Encoberta pelo brilho do ouro extraído, essa tragédia se espalha silenciosamente, convertendo rios inteiros em canaletas de veneno e populações ribeirinhas em vítimas de envenenamento sistêmico imperceptível.

No procedimento de mineração, o mercúrio funciona como agente atrativo para capturar ouro do sedimento. A complicação emerge quando o excesso é despejado sem regulação nos cursos hídricos e o remanescente é queimado em fogueiras improvisadas, liberando vapores venenosos que se dispersam quilômetros pela atmosfera, alcançando localidades onde o Estado não intervém, mas o crime já se enraizou.

Nas águas, a química torna-se assassina. Microrganismos convertem o metal em metilmercúrio — uma variante ainda mais devastadora, cem vezes mais letal. Inicia-se então uma reação cascata: o veneno é incorporado pelo fitoplâncton, transita para organismos menores, e destes aos predadores maiores, concentrando-se em níveis alarmantes a cada estágio da cadeia trófica.

O ciclo encerra no prato das populações amazônicas. Povos indígenas, ribeirinhos e agrupamentos inteiros que há gerações subsistem do pescado agora consomem um antagonista invisível. Inadvertidamente, recebem quantidades regulares de um metal pesado que lesiona o sistema neurológico, destrói o fígado, ameaça nascituros e crianças. O preço do ouro, na Amazônia, é mensurado em moléculas de mercúrio na circulação — e em existências deterioradas pela indiferença e pela ganância criminosa.

Thiago Sabino, geógrafo e pesquisador do Instituto Mãe Crioula (IMC), além de membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), declarou à Revista Veja: “Na floresta, a lei do mais forte prevalece. Violentas e com poderio financeiro, as facções veem ali a chance de acumulação de capital. O rol de negócios ilícitos tocados pelas quadrilhas vai muito além do tráfico de drogas. Há registros de sua atuação em garimpos ilegais, extração de madeira, grilagem de terras e tráfico de animais.”

Tráfico de fauna: desequilíbrio ecológico via criminalidade

Enquanto a mineração predatória lacera o solo e os cursos fluviais amazônicos, um outro comércio mortífero prospera sob a copa das árvores: o tráfico de animais silvestres. A floresta converteu-se num dos epicentros planetários desse mercado ilícito, conduzido não apenas por caçadores esporádicos, mas por estruturas sofisticadas que movem milhões de reais, aproveitando-se da corrupção institucional e das falhas de fiscalização.

Essas quadrilhas agem metodicamente, com rotas determinadas, bases clandestinas de triagem e plataformas digitais de comercialização que fundem atividades ilegítimas e legítimas. O processo mais perverso denomina-se “esquentamento” — a adulteração minuciosa de espécimes capturadas na mata para simular proveniência legítima. Para os passeriformes, entre as mercadorias mais procuradas, o Sistema de Controle e Monitoramento da Atividade de Criação Amadora de Pássaros (SisPASS) se tornou a lacuna perfeita.

Mediante anéis de identificação falsificados e registros adulterados, os traficantes produzem aves “fantasmas” que nunca existiram, fingindo um mercado lícito que funciona como biombo para o saque da fauna amazônica. Os bancos de dados oficiais, que deveriam salvaguardar a biodiversidade, acabam se convertendo no álibi impecável para o delito.

Nas competições, nas lojas sofisticadas do Sudeste e nas feiras clandestinas, pássaros capturados na floresta aparecem com certificações emitidas por criadouros supostamente regularizados. Cada canto ouvido fora da mata representa, materialmente, um sequestro, um ninho abandonado e mais um elo desconectado da teia amazônica — uma floresta explorada não somente por motosserras e equipamentos de escavação, mas igualmente pela ambição mascarada como passatempo.

Madeira sem lei: a “lavagem verde” da floresta

Encoberta por uma aparência de operações florestais legítimas, funciona uma engrenagem criminosa que fornece o mercado globalizado com madeira extraída irregularmente da Amazônia. As agrupações criminosas especializadas que coordenam este esquema edificaram uma estrutura de cumplicidades que vai do interior do Pará até os escritórios de importadores na Europa e América do Norte. O delito ambiental, complexo e bem capitalizado, aproveitou-se das deficiências procedimentais e da desonestidade governamental para converter árvores seculares em lucro “legitimado”.

Um levantamento da Environmental Investigation Agency (EIA) demonstra que, entre 2019 e 2024, dezenas de milhares de metros cúbicos de madeira com indicadores de ilicitude foram comercializados internacionalmente com feição de legalidade. Investigações oficiais e análises de informações comprovam a participação de no mínimo 19 serrarias paraenses, das quais acima de 50% já haviam recebido multas por transgressões ambientais, mais 16 firmas exportadoras e 30 compradores estrangeiros. Aonde vai esta madeira? Para nações que se autopromovem como defensoras da sustentabilidade, como acontece na COP30 — Estados Unidos, Bélgica e França.

As espécies mais requisitadas — ipê-roxo, ipê-amarelo, itaúba, cumaru, maçaranduba e angelim-pedra — são retiradas em zonas públicas, territórios autóctones (áreas de origem natural e nativa) e áreas protegidas. Para burlar a vigilância, as organizações criminosas recorrem à chamada “lavagem verde”: falsificação de documentação, duplicação de permissões florestais e plataformas digitais alteradas que transformam madeira furtada em mercadoria “regularizada” nos registros.

O resultado é uma cadeia comercial aparentemente legítima, porém que dissimula um rastro de degradação e conivência. Cada contêiner que zarpa nos portos amazônicos leva, juntamente com o produto, o testemunho do colapso de gestão que faculta ao crime ambiental operar com a impunidade de quem controla não somente o espaço geográfico, mas igualmente o sistema que deveria impedi-lo.

Narcotráfico: motor da aniquilação ambiental

A Amazônia desvela seu lado mais sombrio quando fluxos de narcóticos e ilicitudes ambientais se entrelaçam como uma teia envenenada no mapa brasileiro. O Norte, zona histórica de rios e promessas, presencia atualmente a disseminação da cocaína como um rio subterrâneo de toxina escondido entre as ramificações da floresta — um incremento que praticamente duplicou os registros de apreensões que, constantemente, afirmam ser este o novo corredor planetário do comércio contrabandeado.

Em 2024, o Amazonas tornou-se o fulcro desta catástrofe enrustida, com toneladas de substâncias apreendidas em seus meandros — uma enxurrada que representa aproximadamente 70% do que toda a Região Norte conseguiu interromper. A floresta, outrora comercializada como celeiro de prosperidade e viabilidade sustentável, funciona hoje como pista secreta não meramente para o cereal, mas fundamentalmente para o pó branco que financia ruína e ganância.

A Rota do Solimões pulsa como artéria indispensável para traficantes, sob o domínio do Comando Vermelho. Nas sombras, unidades clandestinas nas fronteiras amazônicas alimentam os cursos d’água com componentes que ultrapassam continentes até terminais do Atlântico, capitalizando uma disputa silenciosa de apropriação territorial, destruição e comércio de seres selvagens. Os ganhos respaldam delitos — compra de propriedades roubadas, operações de mineração clandestinas e caçadas desenfreadas — enquanto agrupamentos ribeirinhos tornam-se cativos do pânico e da intimidação, números de execuções que maculam as contabilidades nacionais e comprovam que, aqui, a “lei da selva” ganhou novo sentido.

Oligarquias e milícias transnacionais imbricam seus objetivos: confederados da Colômbia dialogam em linguagens cifradas com coordenadores brasileiros afastados, enquanto, nas profundezas amazônicas, até agentes governamentais e instituições policiais participam do espólio. Terminais anteriormente reconhecidos pelo desembarque de progresso transformaram-se em plataformas de difusão da cocaína: Manaus e Vila do Conde (PA), atualmente, funcionam como degraus de um contrabando que irradia pó tóxico pelos cinco continentes, convertendo a Amazônia em epicentro da busca planetária por delito, riqueza e devastação.

Paulo Moutinho, analista do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), alegou em entrevista ao Amazônia Real: “A região está sendo capturada por um crime organizado, abastecido e bem estruturado. Isso está nos relatórios da Polícia Federal, de instituições mais especializadas. Somos uma instituição científica com muita ação no campo e a gente vem escutando relatos de crescente ilicitude na região.”

Nexo da ilegalidade: conectando mineração, tráfico e violência

A ampliação dessas práticas alimenta um clima de intimidação e agressão direcionado àqueles que se interpõem, abrangendo protetores do ecossistema, dirigentes indígenas, comunicadores e servidores estatais.

O assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, no Vale do Javari, no extremo ocidente do Amazonas, em 2022, funciona como recordação devastadora e fatal das repercussões letais de confrontar e expor delitos ambientais na Amazônia. Seus falecimentos evidenciam que o empenho pela proteção ecológica se entrelaça inextricavelmente à luta contra a criminalidade organizada e à promoção dos direitos humanos.

O caráter pluridimensional desta emergência, na qual a ruína ecológica se alimenta e se integra em empresas criminosas, reclama uma retaliação estratégica igualmente multifacetada e articulada.

Consolidação de governança contra estruturas criminosas

A neutralização produtiva das agressões ambientais deve ser acompanhada de uma execução contundente e de uma transformação institucional de escala. Minorar os sintomas da crise — como o envenenamento mercurial — será uma empreitada inútil e perpétua se as facções criminosas que o provocarem funcionarem sem punição.

A associação pan-amazônica ganhou novo vigor com a Declaração de Belém, subscrita em 2023 pelos oito países amazônicos durante a Assembleia da Amazônia. O documento congregou 113 pactos e avançou em matérias delicadas que historicamente fracionaram a zona, como o enfrentamento de atividades criminosas transfronteiriças.

Entre os eixos temáticos instituídos situam-se defesa dos ecossistemas, parceria policial, investigação, capacitação e progresso, meteorologia, saúde e reforço institucional da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA). Levantamento da Plataforma CIPÓ documentou quase 1.700 iniciativas para impulsionar a consecução dos 16 eixos temáticos entre agosto de 2023 e junho de 2025.

Recursos para o embate à criminalidade: Plano AMAS e Fundo Amazônia

No tabuleiro da segurança amazônica, a peça mais dinâmica são os pactos de sinergia entre corpos policiais, autoridades judiciárias e departamentos de inteligência, numa operação que se estende de delitos ambientais até a estrutura maior das infrações transfronteiriças.

O nascimento da Comissão Especializada de Segurança Pública e Ilícitos Transfronteiriços e Transnacionais na Região Amazônica, iniciativa do Brasil sob o estandarte da OTCA, marcou um ponto de virada necessário frente ao enredo do abandono institucional.

Em junho de 2025, Letícia, no coração da Colômbia, converteu-se em teatro do primeiro movimento deste novo organismo, concentrando ministros e dirigentes da segurança dos oito países da rota amazônica. Estruturada em departamentos temáticos, a Comissão promete sincronizar a harmonia entre agentes de campo e o embate dos delitos que enfraquecem a floresta, com o pano de fundo da necessária operação internacional.

Entre os resultados deste encontro está a abertura do Centro de Cooperação Policial Internacional da Amazônia (CCPI-Amazônia) em setembro de 2025, em Manaus. Além de infraestrutura, o CCPI constitui um núcleo de articulação, aglutinando delegados dos nove estados amazônicos e nove nações que compartilham esperança e limites de suas demarcações.

O objetivo, manifesto para quem investiga o submundo do delito, é unificar esforços contra organizações que convertem os vazios amazônicos em passagens de contrabando, desmantelamento, depredação e ocultação de cifras. O centro é eixo do Plano Amazônia: Segurança e Soberania (AMAS), lançado em 2023, capitaneado por R$ 36,7 milhões provenientes do Fundo Amazônia, sob a direção do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e coordenado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Paulo Henrique Oliveira Rocha, gestor do CCPI-Amazônia, esclareceu em apresentação da Polícia Federal sobre ganhos obtidos via o Centro: “O CCPI-Amazônia não é meramente um núcleo de intercâmbio de dados, porém uma instância de administração do Plano AMAS, que impulsiona e coordena procedimentos concatenados entre seus participantes e integra iniciativas relacionadas, como Ouro Alvo, além das aquisições de aeronaves e embarcações.”

Este bunker funciona como coluna vertebral de articulação, onde cartas digitalizadas e observadores orbitais vasculham a floresta perseguindo pistas dos delitos ambientais. Ali, a Polícia Federal, Rodoviária Federal, Força Nacional e corporações estaduais trocam inteligência juntamente a nações da Pan-Amazônia, expandindo a estrutura às organizações planetárias como Interpol, Ameripol e Europol.

A tecnologia, neste contexto, manifesta-se como ferramenta de acuidade operacional — satélites exploram o manto amazônico, expondo marcas de contravenções matizadas no mapa, cada tonalidade uma contingência, cada traço uma frente inovadora de disputa.

Não é por ocasião que, perante o cortejo da inauguração, o presidente Luis Inácio Lula da Silva expressa o aviso inequívoco: “não há áreas não ocupadas”, o delito penetra onde se abre abertura, e a missão do Centro é reverter este panorama mediante a conjugação das iniciativas regionais.

Ricardo Lewandowski, secretário da Justiça, reiterou a máxima: “segurança e soberania são irmãs siamesas”, demandando ação sincronizada frente às máfias transfronteiriças.

Coadjuvantes ao CCPI, helicópteros, lanchas protegidas, viaturas e multidões de engenhos aéreos sem tripulação reforçam o poder das corporações federais, estaduais e da Força Nacional, que em setembro de 2025 foi capacitada para operar em Manaus por noventa jornadas, com propósito e meta na conservação da vida selvagem e dos povos originários.

Em 2025, o Fundo Amazônia estabeleceu marca própria, dispensando R$ 1,189 bilhão em empreendimentos — o maior volume desde 2009. Entre as campanhas, sobressaem o Restaura Amazônia, Amazônia na Escola, Sanear Amazônia e o Fortfisc para a vigilância do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama), campanhas de gerenciamento e reforço aos bombeiros, numa rede que procura reconstruir, monitorar e salvaguardar dentro e fora do verde da mata.

O enfrentamento à criminalidade organizada, em 2024, atingiu em cheio as quadrilhas: acima de R$ 2 bilhões em destruição contabilizados graças à ação da Polícia Federal em setores vulneráveis. Maquinário no valor de R$ 380 milhões foi destruído, enquanto retenções de bens, numerário e patrimônio totalizaram R$ 1,7 bilhão.

Ao todo, 2.700 procedimentos foram deflagrados, com percentual de 84% de resolução, seccionando as artérias do desmatamento. A Operação Ágata Amazônia 2025 (houve outra em 2024), realizada em maio último, mobilizou acima de 2 mil combatentes, dezenas de embarcações, viaturas e aparelhos numa superfície continental de 510 mil km², impondo perdas milionárias à máquina do delito que reiteradamente tenta fazer da floresta seu espaço de enriquecimento.

Esta luta, travada nos bastidores e sob refletores, ressalta que o devir da Amazônia depende da vigilância permanente, da sincronização entre inteligências inquietas e da coragem de publicizar o que transcorre apartado da observação coletiva. Esta é a incumbência de quem narra a facticidade — e acusa incessantemente.

Inovações tecnológicas no combate à criminalidade organizada

A tecnologia irrompeu como ferramenta imprescindível no confronto aos delitos ambientais. O Programa Brasil MAIS, plataforma de advertência com mapas de satélite desenvolvida pela SCCON, amplia as capacidades de vigilância ambiental e controle da desflorestação nos territórios da Região Norte. A tecnologia manifesta-se como elemento crítico no conflito contra os delitos que desagregam a Amazônia.

No Amapá, a escrivã da Polícia Civil Thalita Barcessat Pelaes testemunha o impacto deste recurso: “O uso da plataforma tem sido crucial para dar suporte às equipes durante as operações. Por meio da análise de dados de satélite, alertas ambientais e da produção de mapas georreferenciados, conseguimos orientá-las ao levantar informações precisas dos pontos de desmatamento, áreas protegidas e vias de acesso atualizadas, antes mesmo delas irem a campo”, declarou ao Media Press.

Concomitantemente, a Delegacia de Crimes Ambientais do Amazonas (DEMA/AM) utiliza a RedeMAIS para refinação das apurações. Somente no primeiro semestre, inauguraram 134 procedimentos, elaboraram 71 Termos Circunstanciados de Ocorrência e prenderam 20 envolvidos em infrações como desmatamento e pesca contrabandeada.

O Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) igualmente tem difundido novidades. No Encontro Nacional da RedeMAIS 2025, apresentou evoluções como o aplicativo Ipaam Digital, a assistente virtual Yva, que aplica inteligência sintética, e a adoção da rede Starlink nas viaturas de fiscalização. Esta conectividade de alta velocidade possibilita o desempenho em regiões remotas, sustentando agrupamentos conectados a depósitos de dados, mapeamento orbital e à base em tempo verdadeiro, essencial para impedir delitos ambientais com penetração e resguardo.

No setor da responsabilização, o Projeto Amazônia Protege, do Ministério Público Federal (MPF), aplica mapas de satélite e a fusão de informações para assinalar os agentes da desflorestação contrabandeada, que perfaz cerca de 50 mil infrações anualizadas. Informações que amparam ações coletivas para requerer reparação das cicatrizes naturais.

Hindemburgo Chateaubriand, vice-procurador-geral da República, durante o Fórum de Procuradores-Gerais da COP30, ressaltou: “O combate ao crime ambiental depende de atuação estratégica, preventiva e repressiva, usando tecnologia para abater as finanças das organizações criminosas e proteger o patrimônio nacional.” Ainda de acordo com ele, o transgressor é compelido a suportar despesas da reabilitação, “minando sua capacidade de reinvestir na ilegalidade.”

De 2017 a 2023, o MPF acionou acima de 3,5 mil procedimentos coletivos, restaurando superfícies equivalentes a 80 mil estádios de futebol e obtendo determinação para o pagamento de acima de R$ 316 milhões em ressarcimentos.

Entre as frentes específicas do embate, distinguem-se o projeto Carne Legal; ações versus a transação de mercúrio na mineração dispersa; uma pactuação com a Starlink para impedir a utilização de internet via satélite por contraventores — Projeto Rede sem Mercúrio; e intervenções preventivas na bacia do Rio São Francisco e zonas de mangue.

A colaboração do Fundo Amazônia abrange a Polícia Federal, com a ação Ouro-Alvo para rastrear a procedência do ouro amazônico e confrontar apropriação territorial, dissimulação de patrimônio e outras ilicitudes vinculadas ao desmatamento.

Desde 2010, o Inpe gerencia no Parque de Ciência e Tecnologia Guamá, em Belém, o Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter), instrumento imprescindível para a identificação imediata de abusos florestais. A agência tecnológica Solved, domiciliada no PCT Guamá, igualmente tem materializado mecanismos inovadores de vigilância, empregando inteligência sintética e estudo geoespacial para cartografar regiões frágeis e melhorar a administração dos patrimônios naturais, dinamizando a efetividade das operações de monitoramento e preservação ambiental.

A COP30 e o desafio da soberania amazônica

Por entre os espaços das Zonas Verde e Azul da COP30, uma temática permanece reiterada: a segurança amazônica. O embate à criminalidade organizada, apesar da participação anunciada da Interpol, Polícia Federal e outras forças de segurança e fiscalização nesse ponto crítico da Amazônia, o diálogo parecia atenuar a premência em reduzir o domínio de facções criminosas que movem cifras bilionárias, números que desafiam a compreensão e a permissividade.

A COP30 emerge como momento crítico, no qual é imperioso instituir compromissos concretos para desintegrar as malhas do crime organizado que contaminam a Amazônia por diversas frentes. A primeira reivindica o enrijecimento das construções da OTCA e seus órgãos especializados, particularmente a Comissão de Segurança Pública e Ilícitos Transfronteiriços, que necessita forjar protocolos de colaboração operacional, harmonizar normatizações e erigir preparações concatenadas entre corporações de segurança.

Na segunda frente, urge potencializar os meios de financiamento planetário devotados ao embate das agressões naturais, com pactos invioláveis de nações desenvolvidas para financiar campanhas como o CCPI Amazônia e programas correlatos disseminados pela imensidão amazônica.

A terceira via de intervenção vincula-se à instituição de arcabouços legislativos internacionais de caráter constrangedor. A Coalizão para Ação Multilateral contra Crimes que Avassalam o Meio Ambiente, proposta pelo Brasil, almeja firmar um marco no escopo da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (UNTOC).

A quarta frente salienta a cessão tecnológica e a permuta de inteligência. Os sistemas brasileiros de vigilância por satélite, plataformas geoespaciais e mecanismos de rastreamento monetário podem ser difundidos para toda a Pan-Amazônia, mediante colaboração técnica e transferência estratégica.

Finalmente, destaca-se a indispensabilidade da operacionalização de mecanismos efetivos para combater a ocultação de patrimônio oriundo de delitos ambientais, com protocolos que elucidem os percursos monetários contrabandeados, apreensão de propriedades e imposição da reparação das cicatrizes que a natureza ostenta.

Na preservação das autoridades territoriais indígenas e dos defensores ecológicos, a COP30 enfrenta uma responsabilidade arduamente demasiada. O relatório Linha de Frente, publicado pela Justiça Global com a Terra de Direitos, demonstra eventos emblemáticos como o homicídio da dirigente indígena Nega Pataxó por militâncias rurais.

No interior da floresta, as facções criminosas se imiscuem para apropriação territorial, extração contrabandeada e mineração, propagando pânico e diluindo a defesa coletiva. Os povos autóctones, guardiões confirmados da floresta, são destinatários pois obstaculizam a difusão do delito com seus órgãos de vigilância e procedimentos compartilhados de gestão territorial.

Assegurar a defesa destas coletividades demanda muito além de resguardo físico: requer reconhecimento da posse fundiária, procedência fundada nos direitos humanos, remuneração por prestações ambientais e reforço dos escudos. No último dia 18, mais quatro Territórios Indígenas foram legitimados pelo governo federal, elevando para 20 desde 2023. Ainda permanecem 66 TIs para homologação, o que evidencia uma certa lentificação nos procedimentos de legitimação.

A COP30 possui o dever de penetrar o manto da falsidade que tenta compartimentalizar segurança pública e preservação natural, como se fossem margens antagônicas do mesmo curso. É hora de confessar que resguardar o clima amazônico é confrontar o delito — uma contenda silenciosa onde motosserras são armamentos letais como braços armados que avançam sobre a vivacidade verde.

Os 198 países signatários da Convenção da Organização das Nações Unidas sobre Transformação Climática, entre eles os amazônicos, fizeram um pacto  no primeiro Inventário Planetário do Acordo de Paris, em Dubai, para sustar a sangria verde até 2030 — paralisar a desflorestação e contrariar a degeneração florestal. Porém, este juramento é letra morta se não forem desmanteladas as máquinas criminosas que convertem a floresta em ganâncias. São cartéis do incêndio e da madeira, dissimulando bilhões em ouro e quietude.

As Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) desses agrupamentos precisam superar a teatralidade diplomática: devem instituir metas específicas para asfixiar as estruturas de crime organizado e minorar a agressão que contamina as territorialidades da mata, hoje presas de atiradores, grileiros e milícias ecológicas.

Ainda no Fórum de Procuradores-Gerais, na COP30, o procurador-geral do Azerbaijão, Kamran Aliyev, soou o alarme: a destruição natural é o novo ouro negro do submundo, uma proveniência farta de recursos para o narcotráfico, contrabando de pessoas e munições. E recomendou a associação de capacidades — uma resposta sincronizada que atinja o patrimônio e a direção destes agrupamentos.

Esta inteligência articulada necessita transpor todos os espaços de negociação da COP30 — do planejamento dos fundamentos climáticos à difusão de tecnologias limpas. Contrariamente, será apenas mais um colóquio de falas polidas presenciando a floresta agonizar em câmera lenta.