por Gislana Monte Vale

No século XXI, é necessário repensar os espaços ocupados pelas pessoas com deficiência a partir de conceitos que ampliem sua inserção social, especialmente através das noções de acesso e acessibilidade. A ênfase no conceito de inclusão muitas vezes impede ou dificulta a ocupação desses corpos em espaços sociais, educacionais, políticos, de trabalho e de vida. Consideramos que, na inclusão tradicional, um corpo supostamente normativo — que enxerga, ouve, anda e socializa de maneira “comum” — precisa autorizar os corpos com deficiência a participarem, ou seja, os corpos não normativos são aceitos apenas mediante essa autorização.

Esses processos, especialmente em espaços educacionais, devem avançar, reconhecendo que a deficiência é uma condição do corpo, assim como outras encruzilhadas — raça, gênero, classe, geração, território, entre outras — que estão presentes nesses corpos. Aqui utilizamos o termo encruzilhada em substituição ao conceito de interseccionalidade, buscando ampliar as referências latino-americanas nos estudos sobre deficiência.

Dessa forma, é fundamental que universidades e programas formativos ofereçam editais e materiais em formatos diversos e acessíveis, tais como:

  • PDF acessível em formato texto;
  • Narração por voz;
  • Vídeo em Libras com legenda, a partir da narração por voz;
  • Linguagem simples em todos os formatos.

Além disso, é importante disponibilizar canais de atendimento com intérpretes-tradutores de Libras e informações gerais para atender às diversas necessidades das pessoas com deficiência interessadas nos processos de inscrição. Deve-se promover formação contínua para corpo docente, discente e administrativo, e garantir que comunicações em redes sociais e materiais impressos incluam descrição de imagens, linguagem simples e formatos digitais acessíveis. Em pronunciamentos e falas públicas, recomenda-se adotar a prática da auto-descrição adequada ao contexto.

Por fim, reiteramos a importância de que essas ações contem com a consultoria de pessoas com deficiência com formação e experiência em acessibilidade, promovendo uma prática que vá além de “fazer para” ou “falar sobre”, para fazer e falar com pessoas que habitam corpos diversos.

*Gislana Monte Vale é uma mulher negra, cega, nordestina, poeta e pesquisadora
Doutoranda em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense
Mestre em Avaliação de Políticas Públicas pela Universidade Federal do Ceará
Pesquisadora colaboradora do Laboratório de Imagens da UFF
Vice-coordenadora do Fórum de Acessibilidade Cultural da ABRACE
Consultora em Políticas Públicas e Acessibilidade Cultural