“A pesca é nossa arte e nosso trabalho, que nossos antepassados nos ensinaram para que a gente viva com dignidade e respeito pela natureza. Somos felizes no mangue estamos e é lá que queremos ficar”. A fala de Mailton, liderança extrativista da costa amazônica, abriu a 2ª Marcha dos Manguezais Amazônicos, realizada neste sábado (26), em Belém (PA), no Dia Mundial de Proteção dos Manguezais. A mobilização reuniu cerca de 300 pessoas, com concentração na Escadinha do Cais do Porto e caminhada até a Pedra do Ver-o-Peso. Participaram representantes das Reservas Extrativistas do Pará, além de delegações do Maranhão e do Amapá.

A marcha reforça o papel essencial das comunidades tradicionais na conservação dos manguezais, ecossistemas que cobrem cerca de 1/3 dos manguezais do Brasil e sustentam a biodiversidade, a segurança alimentar e os modos de vida costeiros. Esses territórios também são verdadeiros aliados climáticos: estimativas indicam que um hectare de manguezal no Brasil pode armazenar entre duas e quatro vezes mais carbono do que um mesmo hectare de qualquer outro bioma — incluindo a floresta amazônica. O dado é de um estudo publicado em 2022 na revista Frontiers in Forests and Global Change, e reforça o papel dos mangues no combate às mudanças climáticas.

Às vésperas da COP 30, que será sediada em Belém em 2025, populações costeiras reforçam sua mensagem ao mundo: não há solução climática sem os povos do mangue. “Nossa cultura está enraizada aqui. Nossos pais nos ensinaram a pescar com braço, anzol, linha, espinhel e camboa. A gente existe e nossa campanha exalta as pessoas dos mangues. Nós estamos no berçários das espécies, é lá que tem a dourada, a pescada, a ostra, o sarnambi, o turu e também o caranguejo”, completou Mailton.

Este ano, as ações têm como lema: “Nosso Mangue Tem Valor com Gente!”, reafirmando que conservar os ecossistemas costeiros é também valorizar os saberes tradicionais e garantir justiça climática. As atividades são uma iniciativa das Associações dos Usuários das Reservas Extrativistas Marinhas e Costeiras do Pará (AURENS-PA), Colônia de Pescadores do Oiapoque e da Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Marinha de Cururupu, com apoio da Rare Brasil e parceria do Programa Petrobras Socioambiental, por meio do Programa Pesca para Sempre.

Também fortalecem a mobilização coletivos como a Rede Mães do Mangue, o grupo de jovens Cuíra, as Mulheres Praianas de Cururupu e tantas outras organizações que lutam pela proteção dos seus maretórios — territórios vivos, onde cultura, natureza e trabalho caminham juntos. Apoiam a marcha também Prefeitura de Augusto Corrêa e Prefeitura de Curuçá que integra a Rede Costal 509, Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA).

A liderança Sandra Regina, da Reserva Extrativista de Curuçá, também destacou a centralidade dos pescadores artesanais na conservação marinha. “O mangue para nós é vida, é a nossa casa comum. Por isso, nosso mangue tem valor com gente. Antes a gente só lembrava da floresta, mas esquecia da gente, mas nós fazemos toda a conservação e preservação do manguezal. Celebramos quem somos: guardiãs e guardiões do litoral brasileiro.” Sandra também anunciou que a Comissão Nacional para o Fortalecimento das Reservas Extrativistas e dos Povos Extrativistas Costeiros e Marinhos (Confrem) já está presente em 17 estados brasileiros, fortalecendo a articulação entre comunidades e políticas públicas.

Julho Verde

A marcha integra o calendário do Julho Verde, campanha que mobiliza mais de 30 comunidades da Amazônia costeira, em um mês inteiro de ações em defesa dos manguezais e de quem deles vive. Renilde Piedade, liderança da Reserva Extrativista Marinha de Mocapajuba, em São Caetano de Odivelas, nordeste paraense, e coordenadora da Rede Mães do Mangue, lembrou que cuidar dos manguezais é também garantir dignidade às comunidades que deles vivem.

“Nosso maretório é fonte de sustento e vida. Queremos os mangues limpos, sem lixo nem óleo. É nosso dever cuidar, porque esse território combate a crise climática e alimenta muita gente. A marcha em Belém é para lembrar que os mariscos do Ver-o-Peso vêm de nós e também para chamar atenção na COP30: vivemos em unidade de conservação e queremos ser reconhecidas como parte da solução”, defendeu.

A programação segue ao longo da semana com atividades em diferentes territórios da costa amazônica. No dia 28 de julho, a Comunidade Quatipuru Praia, na RESEX Tracuateua, recebe a ação pela manhã. No dia 29, acontecem duas mobilizações: uma roda de conversa com mulheres na RESEX São João da Ponta, na sede da Associação Mocajuim, e atividades na APA Algodoal-Maiandeua, na Vila de Fortalezinha, Maracanã, que seguem até o dia 30. Já em 30 de julho, é a vez da Comunidade Monte Alegre, em São Caetano de Odivelas, na RESEX Mocapajuba, com programação estendida até a noite. Encerrando o ciclo, no dia 31 de julho, a RESEX Mestre Lucindo, em Marapanim, promove uma homenagem ao legado dos Guardiões, na sede da Associação AUREMLUC.

PROGRAMAÇÃO

28/07 – Segunda

8h às 12h
Reserva Extrativista Tracuateua
Local: Comunidade Quatipuru Praia

29/07 – Terça

8h às 12h
Reserva Extrativista São João da Ponta
Roda de conversa com mulheres
Local: Sede da Associação Mocajuim

8h às 12h
APA Algodoal, Maiandeua
Local: Vila de Fortalezinha, Maracanã

30/07 – Quarta

8h às 12h
APA Algodoal, Maiandeua
Local: Vila de Fortalezinha, Maracanã

15h às 21h
Reserva Extrativista Mocapajuba
Local: Comunidade Monte Alegre, São Caetano de Odivelas

31/07 – Quinta

14h às 18h
Reserva Extrativista Mestre Lucindo
Homenagem ao Legado dos Guardiões
Sede da Associação AUREMLUC, Marapanim