Por Mariana Walsh para NINJA Esporte Clube

A primeira edição da nova Copa do Mundo de Clubes terminou no último domingo (13), com uma vitória categórica do Chelsea sobre o Paris Saint-Germain por 3 a 0, no MetLife Stadium, em Nova Jersey. Mais do que espetáculos em campo, o torneio ofereceu um vislumbre do que esperar da Copa de 2026, e também dos caminhos que o futebol tem trilhado em escala global.

A competição funcionou como um verdadeiro laboratório de testes para a FIFA. Para além do campo, expôs tendências e tensões do futebol moderno: questões políticas, climáticas, logísticas e econômicas emergiram como peças-chave para compreender não apenas os bastidores do torneio, mas também os dilemas do futebol atual. Se o futebol é cada vez mais um produto, essa foi sua prévia.

Um torneio que começou sob risco de fracasso

A competição nasceu sob fortes desconfianças: até outubro de 2024, não havia patrocinadores nem contrato de mídia. Apenas no fim daquele mês a chinesa Hisense foi anunciada como parceira. Em dezembro, um contrato de US$ 1 bilhão com a plataforma DAZN garantiu o fôlego necessário para o plano sair do papel.

O calendário também foi alvo de intensos debates. Com um produto valioso nas mãos, clubes e entidades enxergam qualquer nova oportunidade de lucro bem-vinda, o que inevitavelmente significa mais competições. O sindicato dos jogadores, no entanto, alertou para a sobrecarga de jogos e os riscos à integridade dos atletas.

A FIFA apostou alto na emoção dos torcedores diante da rara chance de ver seus clubes em ação em um torneio internacional de grande escala. O resultado veio com um alto engajamento e retorno financeiro acima do esperado. Apesar das dificuldades iniciais, o saldo financeiro superou as expectativas. Segundo Gianni Infantino, presidente da entidade, o torneio gerou mais de US$ 2 bilhões em receita — uma média de US$ 33 milhões por partida.

Trump, FIFA e os bastidores da Copa como palco político

Um dos momentos mais emblemáticos do torneio aconteceu fora das quatro linhas: Donald Trump entregou o troféu ao Chelsea diante de mais de 80 mil torcedores. Mais do que simbólico, o gesto expôs a proximidade entre o presidente dos EUA e Infantino, que recentemente anunciou a abertura de um escritório da FIFA na Trump Tower, em Nova York.

Essa relação não é novidade e vem causando desconforto há tempos. Em janeiro, uma viagem de ambos ao Oriente Médio atrasou a chegada de Infantino ao congresso da FIFA no Paraguai. A UEFA reagiu com críticas públicas, acusando o dirigente de colocar “interesses políticos privados” acima da agenda institucional.

A aproximação entre FIFA e Trump gera dilemas éticos, pois suas rígidas políticas anti-imigração contrastam com o discurso da entidade, que defende inclusão e diversidade. Em um evento que depende da circulação global de torcedores, atletas e delegações, essa aliança revela uma contradição difícil de ignorar, ainda mais às vésperas de uma Copa do Mundo em solo americano.

Crise climática em campo: o alerta que a FIFA não pode ignorar

O calor acima da média e as tempestades intensas se tornaram protagonistas inesperados da competição. Em diversos jogos, houve paralisações por alertas meteorológicos e a famosa “pausa para hidratação” se tornou indispensável. 

Segundo um estudo Scientific Reports, a previsão é de que o verão de 2026, nos Estados Unidos, seja um dos mais quentes da história, reflexo direto da aceleração do aquecimento global. A FIFPRO, entidade que representa os jogadores, já alertou: sem ajustes, as condições serão impraticáveis. A Copa do Mundo de Clubes foi um alerta climático que a FIFA não pode mais ignorar. Mais do que nunca, esse assunto deve fazer parte do planejamento da entidade. 

O futebol descentralizado desafia o domínio europeu

Se a princípio o torneio apenas reforçaria a desigualdade financeira já conhecida entre clubes europeus e o restante do mundo, ele expôs um novo cenário: o futebol está mais descentralizado do que parece.

O domínio técnico das grandes ligas ainda é alimentado por investimentos milionários, mas em campo, clubes de fora da Europa mostraram que o talento e organização podem desafiar qualquer orçamento. O Fluminense, por exemplo, equilibrou forças com adversários bilionários ao chegar até a semifinal do torneio. 

O futebol deixou de ser exclusivamente europeu. A Copa foi um lembrete de que, apesar da concentração de recursos, o jogo ainda pertence a quem o joga melhor — e não apenas a quem o compra.

Conclusão: futebol em transformação

A nova Copa do Mundo de Clubes foi mais do que uma experiência esportiva: foi um retrato antecipado dos desafios e contradições que a FIFA precisa enfrentar. A busca por lucro, a politização da gestão e os entraves estruturais se entrelaçam com o espetáculo que vai ao ar. 

Entre alianças controversas, riscos climáticos ignorados e um sistema econômico que favorece poucos, o torneio foi tão revelador quanto rentável. Mas também apontou caminhos. Com jogos disputados, engajamento em alta e arrecadação recorde, o novo torneio mostrou força.

O futebol está em constante transformação porque precisa acompanhar as mudanças do mundo e da sociedade. Se a FIFA for capaz de encarar suas contradições e aprender com os próprios erros, poderá liderar esse movimento com mais coerência, visão e responsabilidade.