Por Henrique André

Nos dias de hoje, o design vai muito além da estética. Ele se tornou uma ferramenta política de transformação social, voltada para resolver problemas complexos, promover inclusão e projetar futuros mais sustentáveis. Esse conceito encontra um paralelo potente no homem preto contemporâneo, que, através da tecnologia, da ancestralidade e da cultura, ressignifica sua existência e ocupa espaços antes negados. O design contemporâneo e o homem preto compartilham uma missão em comum: reconstruir narrativas e projetar realidades mais justas onde o corpo preto possa existir.

Identidade e Narrativa: o design centrado no ser preto

Assim como o design centrado no usuário busca compreender e atender necessidades reais, o homem preto reivindica sua história, seu protagonismo e sua própria narrativa. Lázaro Ramos, no livro Na Minha Pele (2017), reforça a importância de contar sua própria história, rompendo com as visões estereotipadas imposta pela sociedade. O design contemporâneo valoriza a experiência individual para criar soluções mais humanizadas. Da mesma forma, o homem preto se torna designer do seu futuro ao resgatar e reafirmar sua identidade de forma orgânica e intuitiva.

Ancestralidade e Sustentabilidade: o futuro se constrói no passado

O conceito de sustentabilidade no design não se restringe ao meio ambiente, mas também à preservação de saberes ancestrais. No livro Ideias para Adiar o Fim do Mundo (2019), Ailton Krenak defende que o conhecimento ancestral pode ser um caminho para o futuro. Isso ressoa no movimento de fortalecimento da identidade preta, onde a cultura e a história se tornam ferramentas de resistência e renovação, num movimento de Sankofa, que é um ideograma africano que significa “voltar e buscar”. É um símbolo que representa o aprendizado com o passado para construção do futuro. 

O design emocional e a afetividade negra

No design, a emoção é um fator-chave na relação entre usuário e produto. O mesmo ocorre na luta antirracista: a afetuosidade é uma forma de resistência e reconstrução de laços. Cida Bento, em O Pacto da Branquitude (2022), destaca como o afeto e a consciência coletiva podem ser estratégias fundamentais para romper estruturas excludentes. Assim como o design emocional cria experiências marcantes, a afetividade negra constrói espaços de acolhimento e empoderamento.

Tecnologia e afrofuturismo: o amanhã já começou

O design especulativo e o afrofuturismo compartilham a visão de projetar futuros possíveis, onde a tecnologia e a estética negra são protagonistas. O autor Fábio Kabral, em O Caçador Cibernético da Rua 13 (2017), propõe um universo onde a cultura africana se mistura com a tecnologia, rompendo com a ideia de que o futuro pertence apenas à branquitude. O design, assim como o afrofuturismo, cria espaços de inovação que respeitam as raízes culturais e promovem novas possibilidades de existência.

Regeneração e protagonismo social

O corpo preto está na linha de frente da regeneração cultural e social, resgatando saberes ancestrais e propondo novas perspectivas. No documentário AmarElo: É Tudo Pra Ontem (2020), Emicida evidencia como a cultura preta sempre foi um vetor de inovação e resistência. No design regenerativo, a ideia é semelhante: não basta sustentar, é preciso restaurar e criar sistemas mais saudáveis para todos.

O Design do futuro é preto

Assim como o design contemporâneo evoluiu para ser um campo de solução e impacto social, o povo preto não se limita mais a responder às imposições da sociedade: ele cria, transforma e ocupa espaços, redesenhando o mundo a partir de sua própria visão. Se o design busca projetar futuros melhores, o homem preto é a expressão viva de que esse futuro já está sendo construído.

Sobre o autor

Henrique André é designer gráfico, escritor e pesquisador Afrofuturista que busca inspiração no cotidiano e na ancestralidade. Está no Coletivo “O futuro é preto”, grupo voltado para ações de tecnologia, inovação, educação e cultura por um olhar afrodiaspórico.