Por Sonia Acosta *

Corre o mês de maio do ano de 2025.
Muitos de nós temíamos este dia, sabíamos que ele chegaria, mas, como aqueles pesadelos que não nos deixam dormir, tínhamos medo.
Começar a viver um tempo em que o velho Pepe já não estará fisicamente entre nós.
Que difícil tentar compreender algo que invade todo o nosso corpo e coração, essa tristeza que vem de nos sabermos órfãos.
Pepe foi a construção e a síntese coletiva de um longo tempo histórico.
Como não estar tristes se com ele se vai um pedacinho de cada um de nós?

Nos últimos tempos, ele se transformou em uma referência mundial para as esquerdas, um homem sábio que prega a vida com o exemplo, que defende, a partir de uma ética de esquerda, cada um de seus princípios.
Com Pepe, construímos uma relação de confiança, de puxões e afrouxamentos, de alegrias, de raivas quase familiares, mas de um respeito imponente. Sua humanidade nos acolheu e amparou por muito tempo, talvez apesar dele mesmo, foi um farol para nossas consultas e interpelações.

Gostaria de poder escrever-lhes com a certeza de que aquilo que ele nos semeou prevalecerá, nossa… como gostaria de poder dizer-lhes que isso que ele deixa seguirá vivo em nós!
Me invade essa incerteza, não gostaria de mentir-lhes.
Mas sinto, do mais profundo, que ele também nos semeou o desejo de viver militando, de “lutar como os pássaros, que a cada dia que amanhece, cantam”.
Vivemos junto a ele a emoção de lutar por causas justas, sabemos que estamos do lado certo da história.
No acerto e no erro, ele nos semeou uma consciência crítica para que pudéssemos construir nosso próprio caminho.

Em seus últimos tempos, dedicou-se a falar com os/as jovens, tentar transmitir com palavras seus aprendizados de vida, sabia que a vida era finita, e nessa angústia de se saber mortal, contagiou sua vontade de viver e nos fez parte de sua luta.
Nossas causas latino-americanas sentirão sua falta, ele sempre soube enxergar além do presente, com um olhar de longo alcance, velou com suas ações pela paz de nossos povos. Sem ânimos revanchistas, construiu com todos, sobretudo com aqueles que pensavam diferente, sabia que as maiores causas pelas quais lutar precisam de todos nós juntos.

Em tempos de uniformização do pensamento, de gurus com receitas mágicas de felicidade e sucesso, ele sempre pregou uma vida de humildade; a felicidade está nas pequenas coisas, e elas são decididas todos os dias. Triunfar na vida não é vencer, é perder e se levantar novamente a cada derrota.

Nossos sentimentos estão tomados por uma profunda tristeza, mas, embora pareça contraditório, não é: também de muita força. Ninguém nos tirará o que vivemos e aprendemos.
Recorreremos a ele quando sentirmos o naufrágio ou o desânimo a que este sistema capitalista voraz e alienante nos leva, como sempre fizemos.
Ele viverá nos sonhos de uma Pátria Grande, em cada guri/sa que enfrentar a vida com coragem e valentia, em cada sentimento de indignação diante de uma injustiça, em cada resposta coletiva e solidária diante de um direito violado.

Desde este cantinho do mundo, nos abraçamos forte, buscando transmitir que, apesar dessa ausência, temos uns aos outros, acima de tudo, temos uns aos outros.

Querido Pepe… até breve.

*Militante feminista Frente Amplio