“Santo de Casa”: No novo romance, Stefano Volp reflete sobre as marcas da paternidade
Em entrevista, escritor capixaba fala sobre sua nova obra.
Quem lê Stefano Volp sabe que sua escrita instiga os leitores a descobrir os mistérios que suas obras guardam. Não é diferente em ‘Santo de Casa’, seu novo romance contemporâneo, em que ele tira o véu do patriarcado e reflete sobre o machismo estrutural e as violências familiares cometidas por um pai que, mesmo depois da morte, deixou cicatrizes profundas na memória daqueles que seguiram em vida. É aquela coisa: uma casa, vista de fora, é apenas uma casa, mas suas paredes guardam segredos íntimos e difíceis demais de revelar. Não é o caso aqui, pois Volp mete com força o dedo na ferida. “Uma casa pode realmente sangrar enquanto todos os seus seguidores curtem, compartilham, aplaudem e sofrem por não se parecerem incríveis à altura”, alerta.
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E é justamente sobre a sua nova obra que a coluna conversa hoje com o escritor capixaba.
Com vocês, o instigante Stefano Volp:
1 – O que te despertou a vontade de falar sobre o tema da paternidade nesse novo livro?
Quando escrevi Homens pretos (não) choram falei muito sobre paternidade. Percebi que as histórias encontraram muita ressonância no público, uma necessidade de elaborar sobre o tema, sobretudo, das ausências. Somente em 2024, mais de 90 mil crianças foram registradas no Brasil sem o nome do pai. Ter o registro do nome, por outro lado, também não atesta presença. Vejo então que estou diante de uma temática que conecta as pessoas, que merece ocupar melhor o debate público. A escrita e leitura de ficção nos ajuda a elaborar.
2 – Um recente raio x brasileiro demonstra que o país perdeu quase 7 milhões de leitores nos últimos 4 anos. Como lidar com o desafio de cativar novamente o público de não leitores no Brasil?
Aposto no melodrama e na escrita brasileira, em personagens gente como a gente, de lugares os quais estamos acostumados, com hábitos brasileiros. Assim como meus outros livros, Santo de casa é nacional, é nosso. Busco ambientalizações caseiras, geralmente de famílias da Classe C, para oferecer possibilidades de ressonância com o nosso povo. Nós, brasileiros, somos criados na escola do melodrama televisivo. Santo de casa tem bastante disso. Talvez funcione.
3 – Uma casa, vista de fora, é somente uma casa. Na sua opinião, por que muitas famílias ainda escondem em silêncio suas dores por trás de portas e janelas fechadas?
Acho que hoje, com o avanço das tecnologias digitais e estéticas, vivemos em uma era onde se dá um hipervalor à imagem, à reputação. As pessoas trabalham duro – com filtros sofisticados – para esconder suas fissuras e controlar suas imagens. Na internet, nas igrejas, escolas, universidades, no parquinho, nos clubes, em todo lugar. Talvez esse esforço para a obtenção do controle da narrativa sempre tenha existido. Eu só acho que as ferramentas de hoje são mais eficientes, e deixam marcas mais profundas. Uma casa pode realmente sangrar enquanto todos os seus seguidores curtem, compartilham, aplaudem e sofrem por não se parecerem incríveis à altura.
4 – A literatura é uma forma de encorajar outras pessoas a denunciar a violência de gênero?
Sim. A leitura é um exercício, sobretudo, individual e silencioso. Muitas vezes, é você e você mesmo. Lemos o outro para nos percebermos. Lemos a gramática do outro para dar sentido à gramática das coisas não-ditas dentro da gente.
5 – Qual legado você quer deixar com essa obra?
Eu gostaria de fabricar esperança para dias ruins, apesar da dor.