O ‘Lobisomem’ calvo e anêmico de Leigh Whannell
Apesar do histórico do diretor em trabalhar com horror psicológico, “Lobisomem” é uma obra anêmica, que parece perder todo o fôlego criativo encontrado em seu excelente “O Homem Invisível”, de 2020
Por Hyader Epaminondas
Com uma trama localizada nos dias atuais e bastante efeitos práticos, a Blumhouse assumiu o desafio de reimaginar o icônico “O Lobisomem” (1941), de George Waggner, em um remake que, infelizmente, falha em justificar sua própria existência. Trata-se de uma produção desprovida de substância, conceitos de utilização de sombras interessantes porém combinada com escolhas estéticas que desprezam o legado do personagem presente no imaginário popular.
Apesar da sonoplastia aguçada, que funciona com perfeição para explorar os pequenos detalhes na ambientação silenciosa do campo, o maior problema do longa está na sua dificuldade em transformar momentos de tensão em algo verdadeiramente impactante ou pelo menos simbólico. Embora o desenvolvimento dessas cenas seja compreensível, com enquadramentos fechados no campo de visão dos personagens, falta precisão no timing para que elas alcancem o impacto desejado.
Principalmente quando fica explícito o quão sem fôlego o filme fica depois da primeira meia hora, nos fazendo duvidar se o sentimento de angústia é causado pelas situações em cena ou pela falta de coesão da produção, que insiste em cenas repetitivas de entra e sai da casa. Leigh Whannell entrega uma direção no piloto automático com poucas cenas memoráveis, mas completamente sem tesão, chega a ser cômico como não teve nenhuma cena de lua cheia em um filme sobre lobisomens.
A escolha da caracterização do lobisomem, elemento crucial para qualquer reinterpretação do personagem, é especialmente decepcionante. Ao optar por uma abordagem minimalista, que substitui a monstruosidade visual por uma estética sem glamour, o filme desperdiça a oportunidade de entregar um horror visualmente impactante. O resultado é um lobisomem calvo, sem presença e completamente anêmico, cuja falta de imponência é tão evidente que as cenas anteriores à transformação acabam sendo mais envolventes.
Christopher Abbott, que interpreta o protagonista Blake, oferece uma performance competente ao transmitir o tormento de um homem lentamente desumanizado. Contudo, sua atuação intensa não é acompanhada por um roteiro que explore verdadeiramente as implicações psicológicas e emocionais de sua transformação. Ele é infectado, gradualmente perde sua humanidade e, eventualmente, cede à maldição, mas tudo isso ocorre de maneira superficial, como se fossem meros checkpoints em uma história que nunca se aprofunda em absolutamente nada.
Quando um clássico vira um filme genérico e sem sal
É uma abordagem incrivelmente rasa, quase preguiçosa, que escancara a falta de interesse em explorar ou oferecer respostas às próprias questões apresentadas. A narrativa se esquiva de qualquer tipo de contextualização, optando por uma explicação simplista nos créditos iniciais e genérica durante o decorrer da história de que “ele contraiu uma doença” devido ao contato com um outro lobisomem.
O foco no núcleo fechado da família de Blake, que também desconhece os mistérios da trama, apenas amplia o sentimento de frustração. A troca de interações entre a Charlote de Julia Garner e Abbott mostra um vislumbre do potencial de Whannell para explorar dinâmicas humanas em situações extremas, mas delega a Garner um papel praticamente mudo e vazio de profundidade. Comparado a outras versões do lobisomem, desde o clássico de 1941, passando pelas releituras modernas como “O Lobisomem”, de 2010, até mesmo o nacional “O Coronel e o Lobisomem”, de 2005, este remake, com uma estética plastificada que tenta evocar o estilo folclórico característico da A24, falha com sucesso em ter uma voz própria e em evocar qualquer fascinação pelo monstro-título.
“Lobisomem”, emerge como uma oportunidade frustrante, especialmente se considerarmos o impacto recente do deslumbrante “Nosferatu”, de Robert Eggers, que mostrou ser possível modernizar essas figuras clássicas mantendo intactos tanto o terror visceral quanto a riqueza mitológica que as tornaram atemporais.
Infelizmente, Whannell parece ter se perdido no processo de equilibrar tradição e inovação, algo que demonstrou dominar em seu projeto anterior, se contentando confortavelmente com uma entrega medíocre. Neste caso, a lua cheia não iluminou um caminho de renovação, mas expôs as limitações de uma abordagem que carece de ousadia e força de vontade.
Se você busca uma adaptação moderna e bem executada sobre lobisomens, além das já mencionadas, vale a pena conferir “Werewolf by Night”, o especial de Halloween disponível no Disney +.
Texto produzido em colaboração a partir da Comunidade Cine NINJA. Seu conteúdo não expressa, necessariamente, a opinião oficial da Cine NINJA ou Mídia NINJA.