Justiça para Gisèle Pelicot: ex-marido é condenado a 20 anos de prisão por estupros em série
“Eu assumi essa batalha” pelos meus filhos e netos, diz Gisèle nos primeiros comentários após todos os 51 homens serem considerados culpados.
Um tribunal francês condenou nesta quinta-feira a 20 anos de prisão Dominique Pelicot, o homem acusado de drogar e violar sua ex-mulher, Gisèle Pelicot, além de recrutar mais de 70 homens para abusar dela durante dez anos.
O ex-marido foi considerado culpado por acusações de violação agravada, entre outros crimes, e recebeu a pena máxima estipulada pela lei francesa.
Todos os réus neste julgamento histórico foram considerados culpados pelo tribunal, sendo a grande maioria deles condenada por violação agravada.
Após a condenação, Dominique Pelicot desatou a chorar no tribunal de Avignon, onde ocorreu o julgamento, que durou quase quatro meses.
Laura Gozzi, enviada especial da BBC a Avignon, relatou que Gisèle, por sua vez, encostou a cabeça em uma das paredes do tribunal enquanto sua família processava tudo o que havia acontecido.
“A família não parece entusiasmada (não que ficasse, dadas as circunstâncias), mas, pelos meus cálculos, todos os réus, exceto Dominique Pelicot, receberam penas de prisão menores do que as solicitadas pelos promotores.”
Os outros responsáveis
Os restantes condenados receberam penas entre 3 e 15 anos de prisão.
Um deles, Jean Pierre Marechal, a quem Dominique Pelicot convenceu a seguir seus passos e também drogar e estuprar a própria esposa, foi condenado a 12 anos de prisão. A promotoria pediu 17 anos de prisão para ele.
O juiz responsável pelo caso considerou ainda que Dominique Pelicot não só era culpado dos crimes de violação agravada, mas também de armazenar imagens da sua filha, Caroline, e das suas noras, Aurore e Celine, e de violar a filha de Jean Pierre Marechal.
Durante quase uma década, Gisèle Pelicot foi drogada pelo ex-marido Dominique, que admitiu tê-la estuprado e ter convidado dezenas de homens, recrutados pela internet, para terem relações sexuais com ela na cama de sua casa, enquanto estava inconsciente.
Foi ela quem decidiu renunciar ao anonimato e trazer à luz este julgamento, fazendo, nas suas palavras, “a vergonha mudar de lado”, passando da vítima para o violador.
Embora Dominique Pelicot tenha admitido as acusações contra ele, a maioria dos outros homens no julgamento negou que o que fizeram fosse violação.
Os outros condenados, com idades entre 27 e 74 anos, pertencem a todas as classes sociais e a maioria vem de um raio de 50 km de Mazan, a aldeia dos Pelicots. O fato de serem bombeiros, seguranças e caminhoneiros lhes rendeu o apelido de Monsieur-Tout-Le-Monde (Sr. Qualquer Um).
Embora muitos tenham argumentado que, com o consentimento do marido, acreditavam estar participando de um jogo sexual em um casamento libertino — e, portanto, que o que faziam não era violação, o tribunal rejeitou esses argumentos.
Os condenados agora têm 10 dias para recorrer da decisão contra eles.
Símbolo feminista
Por todas essas razões, Gisèle tornou-se, sem querer, um símbolo feminista global e uma das mulheres mais influentes do último ano.
“Graças a todos vocês, tenho forças para levar essa luta até o fim. Dedico essa luta a todas as pessoas, mulheres e homens, que são vítimas de violência sexual no mundo. Digo: olhem ao seu redor, vocês não estão sozinhos”, declarou ela à imprensa em 16 de setembro, na primeira vez que falou ao mundo.
Desde então, tem recebido uma avalanche de apoio, com manifestações, aplausos massivos durante todos os dias do julgamento e cartazes de solidariedade espalhados por dezenas de ruas da pequena cidade de Avingon, onde o julgamento foi feto.
“Também estou pensando nas muitas vítimas que não são reconhecidas, cujas histórias muitas vezes permanecem nas sombras. Quero que vocês saibam que compartilhamos a mesma batalha.”, afirmou logo do julgamento.