A vice-presidente da Colômbia, Francia Márquez, descreveu nesta quinta-feira (24) como um “marco histórico” a exigência de reconhecimento e inclusão dos povos afrodescendentes nos mecanismos e órgãos de negociação sobre biodiversidade, no final de um fórum realizado na COP16 em Cali.

Um fórum internacional sobre pessoas de ascendência africana na COP16 foi realizado hoje no centro de conferências onde as negociações para salvaguardar a biodiversidade decorrem desde segunda-feira.

A reunião, liderada por representantes da Colômbia e do Brasil, teve como objetivo o “reconhecimento da categoria ‘afrodescendente’ no âmbito da Convenção sobre Diversidade Biológica” (CDB), que será submetida ao plenário da COP16 para aprovação.

“Foram necessários mais de trinta anos para que a necessidade da presença dos afrodescendentes na estratégia de conservação da biodiversidade fosse reconhecida”, disse Márquez, a primeira vice-presidente negra na história da Colômbia.

A vice-presidente destacou que a COP16 “coloca discussões sobre a mesa” sobre o papel das comunidades afro na defesa do meio ambiente e estendeu o seu reconhecimento aos “homens e mulheres que até colocaram suas vidas em risco para defender um manguezal, para “defender uma floresta, para defender os rios”.

“Justiça reparativa”

“Reconhecer a presença dos afrodescendentes neste quadro de diversidade biológica é reconhecer a diversidade étnica e cultural, é reconhecer a territorialidade ou os direitos étnicos territoriais que ocupamos há muitos anos”, acrescentou Márquez, que acredita que “os afrodescendentes são fundamentais para que a estratégia de conservação do planeta seja completada.

Segundo os participantes do fórum, os descendentes de escravizados africanos representam 21% da população da América Latina, ou seja, 154 milhões de pessoas, distribuídas principalmente na Colômbia e no Brasil.

Reconhecer na COP16 “os afrodescendentes como atores principais na preservação da biodiversidade planetária seria um enorme passo”, considerou o ministro das Relações Exteriores da Colômbia, Luis Gilberto Murillo, também afrodescendente.

Os grupos afro “querem ser reconhecidos na arquitetura das convenções, especialmente as ambientais”, acrescentou o chefe da diplomacia colombiana.

O fórum suscitou debates, especialmente face à oposição de vários países africanos.

“Um dos principais problemas tem sido reconhecer os afrodescendentes como um coletivo. É aí que reside o desafio”, disse June Soomer, presidente do Fórum Permanente da ONU sobre Pessoas Afrodescendentes, na mesma conferência de imprensa.

“Muitos países, e não apenas os africanos, não nos reconhecem colectivamente. Porque se nos reconhecem como povo, também reconhecem o dano colectivo que nos foi causado. E isso é um desafio para muitos países”, disse Soomer. .

“Esse reconhecimento seria um trampolim para muitas outras discussões, incluindo aquelas relacionadas com a justiça reparativa”, insistiu.

“No sistema das Nações Unidas, o termo ‘afrodescendente’ já é reconhecido”, acrescentou Soomer. “O próximo passo será integrá-lo aos órgãos da ONU (…) E se conseguirmos isso nesta COP, vocês não imaginam a importância histórica que terá, porque nos devolverá a dignidade que merecemos como pessoas.”