Conheça Valentina Petrillo, a primeira atleta trans a competir nas Paralimpíadas
Italiana faz história nos Jogos Paralímpicos ao disputar as eliminatórias dos 400m T12 (baixa visão).
Por Igor Serrano, para Cobertura Colaborativa #NECParis2024
Na última segunda-feira (02) no Stade de France, em Paris, a velocista da Itália, Valentina Petrillo, cinquenta e um anos, fez história ao se tornar a primeira atleta trans a disputar as Paralimpíadas. Na classificatória dos 400m para mulheres com baixa visão (T12), ela conquistou a sexta colocação ao concluir a prova em 58s35. Natural de Nápoles, Petrillo descobriu aos quatorze anos possuir Síndrome de Stargardt, responsável pela perda gradativa, e quase total, de sua visão: hoje ela possui apenas 1/50 da vista e opta por correr sem guia.
Na sequência, em uma das semifinais, disputadas horas depois, a italiana conseguiu baixar seu tempo, mas não o suficiente para seguir na briga por uma medalha, ao ficar na terceira colocação (57s58) da disputa, onde somente as duas melhores competidoras avançaram para a final. Após a prova, ela declarou ao jornal inglês The Guardian que esperava ter dado orgulho ao seu filho com a participação e desabafou sobre a transfobia no esporte:
“Vamos lembrar o hoje como histórico! De hoje em diante, eu não quero mais ouvir falar de discriminação ou preconceito destinado para pessoas trans. Eu consegui, então todes podemos conseguir, se eu consegui. Fiz a minha parte e todes podemos conseguir!”.
Carreira esportiva vitoriosa e reverência à Lea T e Tiffany
Até 2018, Valentina atendia por seu nome de registro, Fabrizio, casou-se, teve um filho e já tinha uma carreira vitoriosa no atletismo masculino com diversos títulos. Em 2019, deu adeus à antiga identidade, com quem não se identificou por mais de quatro décadas e fez a transição de gênero, ocasião em que recebeu apoio de seu treinador, Luca Giacometti, e de entidades como a União Italiana Esportes Para Todos (UISP), o Comitê Italiano Paralímpico e a Federação Italiana de Esportes Paralímpicos e Experimentais (FISPES) durante o processo de terapia hormonal obrigatório para continuar competindo.
No esporte feminino seguiu conquistando torneios e teve sua idoneidade questionada por outras competidoras. Ela quase alcançou a classificação para os Jogos Paralímpicos de Tóquio e viu seu nome ser alvo de um abaixo-assinado endereçado à Federação Italiana de Atletismo, endossado por mais de trinta atletas, solicitando sua exclusão das competições femininas, mesmo cumprindo estritamente as regras em vigor.
A Federação Internacional de Atletismo Paralímpica, ao contrário da Federação Internacional de Atletismo, permite a participação de atletas trans que estejam sob controle hormonal em suas competições, mesmo as que tenham concluído a puberdade antes da transição de gênero, como no caso de Petrillo. Sobre ser alvo de questionamentos e transfobia, ela declarou em 2021, ao portal RFI, se inspirar em duas brasileiras para lidar com tudo isso:
“Para mim, o Brasil representava e representa uma pátria das pessoas transgêneros. Nunca vou me esquecer que Lea T, filha de Toninho Cerezo, participou da cerimônia de abertura das Olimpíadas do Rio. Foi lindo! Eu pensava que no Brasil não houvesse preconceito. Quando vi Tifanny e todas as críticas contra ela, me senti no seu lugar. Sinto o mesmo que ela sente, as mesmas dificuldades, as mesmas acusações que ela enfrenta. É muito difícil. Quero expressar minha grande solidariedade. Ser uma pessoa trans no esporte é muito difícil porque o esporte é competição. O esporte é um ambiente sexista, no qual existem só duas categorias, masculina e feminina”.
Valentina voltará às pistas do Stade de France na próxima sexta-feira (6/9), quando irá correr a prova classificatória dos 200m (T12). Sua história pode ser conferida no documentário 5 nanomoles – The Olympic Dream of a Trans Woman (5 nanomoles – o sonho olímpico de uma mulher trans), dirigido por Elisa Mereghetti e Marco Mensa.