Por Jhessyka L. P. Fernandes, para Cobertura Colaborativa Paris 2024

Com o fim das Olimpíadas e a chegada das Paralimpíadas, uma coisa ficou clara: o brasileiro enfrentou uma montanha-russa de emoções. Alegria, orgulho, desespero, tristeza e uma empatia imensa pelos atletas que, em 16 dias, experimentaram a perda de controle sobre suas emoções. A saúde mental, tanto dos torcedores quanto dos competidores, foi testada ao limite.

Embora recente, a discussão sobre saúde mental já permeia todos os nichos, e no esporte não é diferente. A prática esportiva é amplamente reconhecida como benéfica para a saúde física e mental, promovendo um envelhecimento saudável, prevenindo doenças e melhorando a socialização. No entanto, no esporte de alto rendimento, a pressão constante exige mais do que uma vida ativa; demanda um preparo psicológico robusto.

Dados da Pesquisa Nacional da Saúde de 2019, realizada pelo IBGE, revelam que mais de 10,2% dos brasileiros adultos foram diagnosticados com depressão, um aumento de 34,2% desde 2013. Os maiores índices estão no Sul e Sudeste, e a prevalência é maior entre as mulheres (14,7%) do que entre os homens (5,1%). A prática de atividades físicas pode ajudar a equilibrar a saúde mental, reduzindo o estresse e a ansiedade, melhorando o sono e prevenindo doenças como a depressão. Mas no esporte de alto rendimento, essa equação é ainda mais complexa.

Durante os Jogos Olímpicos de Tóquio em 2021, Simone Biles, ginasta norte-americana, chocou o mundo ao se retirar das competições para focar em sua saúde mental. Pressionada por resultados, com pouco tempo de recuperação e sem o acompanhamento psicológico necessário, Biles enfrentou uma sobrecarga mental e ansiedade extrema. Sua decisão gerou controvérsia, mas também abriu espaço para uma discussão global sobre a saúde mental no esporte.

Foto: LOIC VENANCE/AFP/Getty Images

No portal do Jornal Unicamp, o pedagogo e profissional de educação física Alexandre Conttato Colagrai, pesquisador do Grupo de Estudos em Psicologia do Esporte e Neurociências (Gepen), explica que muitos atletas podem fugir de questões emocionais e buscar refúgio no esporte, mas o tiro sai pela culatra quando inevitavelmente ocorrem problemas, como lesões ou falhas, dificultando ainda mais a atuação profissional. “A saúde mental é um componente importante para o desempenho no esporte de alto rendimento e é algo que deve existir anteriormente a ele. Se você não tem boas condições mentais, sua preparação pode ser muito complexa”, afirma Colagrai.

Colagrai, que possui especialização no tema, desenvolveu uma pesquisa junto ao Gepen, na Faculdade de Educação Física (FEF) da UNICAMP. Os resultados, obtidos a partir de avaliações de atletas que competem nacional e internacionalmente, mostraram que 3% dos participantes apresentavam sintomas graves de depressão e outros 30% tinham sintomas leves. Além disso, problemas como ansiedade, insônia e até pensamentos suicidas também foram registrados, revelando o impacto profundo que a saúde mental pode ter no desempenho e na vida dos atletas.

O assunto tomou imensa repercussão durante os Jogos Olímpicos de Tóquio em 2021, quando Simone Biles, ginasta norte-americana, chocou o mundo ao se retirar das competições para focar em sua saúde mental. Pressionada por resultados, com pouco tempo de recuperação e sem o acompanhamento psicológico necessário, Biles enfrentou uma sobrecarga mental e ansiedade extrema. Sua decisão gerou controvérsia, mas também abriu espaço para uma discussão global sobre a saúde mental no esporte.

A pressão sobre os atletas não se limita ao desempenho. Nos Jogos Olímpicos de Paris 2024, Biles relatou sentir ansiedade em espaços públicos, como a cafeteria da Vila Olímpica, e experimentou os “twisties”, apagões mentais que atrapalham a execução de movimentos na ginástica e aumentam o risco de lesões graves. Mesmo com acompanhamento psicológico, a expectativa do público pode amplificar esses fenômenos.

Foto: Reuters/Kim Hyung-Hoon

A atleta japonesa Uta Abe, nas oitavas de final da categoria 52kg em Paris, ao ser derrotada por Diyora Keldiyorova, do Uzbequistão, deixou a competição em lágrimas, sendo consolada por seu técnico. A cena, amplamente compartilhada nas redes sociais, gerou empatia e levantou questões sobre a falta de apoio psicológico para atletas de alto nível.

Rebeca Andrade, ginasta brasileira, revelou em uma entrevista que durante as competições pensa em receitas que gostaria de fazer ao voltar ao Brasil. O comentário, que pareceu cômico, na verdade, reflete o preparo mental sólido da atleta, que é acompanhada há mais de 10 anos pela psicóloga Aline Wolff, coordenadora do preparo mental do Comitê Olímpico do Brasil (COB). Para Wolff, o sucesso de Andrade é prova de um acompanhamento psicológico eficaz, que respeita a individualidade e fortalece a autoconfiança.

Mesmo saindo aplaudida pelo público comovido, fica claro como a saúde mental ainda é um tabu entre atletas de alto rendimento, e como a falta de acompanhamento adequado pode ser prejudicial tanto para a carreira quanto para a saúde pessoal. Em entrevista ao portal Kyodo News, Abe expressou seu desejo de voltar às competições com mais força, visando reconquistar o ouro.

Em outra ocasião, Rebeca Andrade viralizou nas redes ao ser perguntada sobre o que pensa durante as competições. A resposta da ginasta, que revelou passar grande parte do tempo imaginando receitas que gostaria de fazer ao retornar ao Brasil, pode parecer cômica. No entanto, para os fãs da paulista de 25 anos, essa resposta foi um sinal claro de seu sólido preparo mental.

Foto: Reuters/Amanda Perobelli

Por trás do sucesso de Rebeca Andrade está a psicóloga Aline Wolff, coordenadora do preparo mental do COB e mentora da atleta há mais de 10 anos. Wolff acredita não haver fórmula mágica; o preparo psicológico eficaz vem de um acompanhamento profundo e individualizado.

Recentemente, Andrade revelou que não planeja participar de competições solo no futuro. Embora possa parecer uma decisão difícil após suas conquistas em Paris, 1 ouro, 2 pratas e 1 bronze, para Wolff, isso é uma prova do sucesso do acompanhamento psicológico. “Ela é uma atleta que se respeita e conhece seus limites”, afirmou Wolff ao programa Paris é Delas, do portal Terra.