Por Israel Costa e João Ricardo

O Teatro Arthur Azevedo foi palco da abertura da 47ª edição do Festival Guarnicê de Cinema, um dos mais longevos e prestigiados festivais de cinema do Brasil. Com uma programação variada e a participação de mais de 200 filmes, o evento celebra a cultura maranhense e brasileira, destacando a importância do audiovisual para a sociedade. Ocorrendo desde 1977, o Festival é realizado em São Luís, capital do Maranhão, pela Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PROEC) da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), com a contribuição de órgãos públicos e privados. Tradicionalmente realizado durante o período junino, o festival celebra as tradições folclóricas maranhenses, refletidas em seu nome.

O termo “Guarnicê”, de origem indígena, significa “preparar-se para as festividades tradicionais juninas da região”. Este ano, o festival ocorreu de 7 a 14 de junho e apresentou uma programação diversificada, incluindo oficinas, mostras infantojuvenis, seminários, entre outras atividades. A grande novidade desta edição foi a exibição de mais de 200 filmes fora do circuito competitivo, ampliando o alcance e a diversidade das obras apresentadas.

A cerimônia de abertura foi marcada por homenagens e apresentações culturais, contou com a presença das renomadas atrizes Bete Mendes e Zahy Tentehar. Bete Mendes, conhecida por seus papéis em produções como “O Rei do Gado” e “Tieta”, expressou sua emoção ao ser homenageada: “Estou muito feliz, pois estive aqui há 26 anos fazendo parte do júri. Retornar ao festival Guarnicê e ser uma das atrizes homenageadas é um prêmio para o meu trabalho, para o nosso cinema e para nossa cultura”.

Zahy Tentehar, atriz, roteirista e diretora de origem indígena, conhecida por produções como “Cidade Invisível”, também foi homenageada e destacou a importância de ser reconhecida em sua terra natal: “Uma das coisas que mais me chama atenção e me deixa emocionada é ouvir o nosso sotaque, ouvir tudo que eu levei para fora e que em algum momento da minha vida era visto como mal gosto, como se eu não soubesse me expressar, me comunicar bem, porque eu tinha um jeito diferente de falar. Isso, por muito tempo, foi visto como algo que não fosse bonito… a gente chama isso de preconceito, né. E hoje eu sou homenageada e vi tanta gente falando com nosso sotaque, tantas pessoas falando “mermã” ou “mermão”, é tão bom, fico tão feliz. Eu sou o resultado daqui, desse lugar, aqui é que estão minhas origens, então, hoje, tudo que eu alcancei na minha vida como artista também é resultado de tudo que eu levei daqui”.

Zefinha Bentivi, Pró-Reitora de Extensão e Cultura (PROEC), ressaltou a importância do festival para a comunidade: “Trata-se de uma democratização do acesso à cultura, a melhor forma de cultura que é o audiovisual, que é mais acessível às comunidades. Além do mais, o período em que ocorre o Guarnicê é um momento em que a economia gira muito fortemente, economia criativa e economia outra que não é criativa. É um momento de formação, de discussão acadêmica. Muitos que passaram por aqui, hoje fazem cinema e são profissionais de cinema por conta do Guarnicê”.

Roselis de Jesus, Diretora de Assuntos Culturais (PROEC), expressou suas expectativas para o evento: “As expectativas são as melhores possíveis. Nós trabalhamos muito para entregar uma programação super bonita e diversificada. São mais de 200 produções fílmicas que serão exibidas ao longo desses oito dias de celebração do audiovisual maranhense e brasileiro”.

A noite de abertura contou ainda com a exibição do longa “Estranho Caminho” de Guto Parente que conta a história de um jovem cineasta que visita sua cidade natal que se surpreende pelo rápido avanço da pandemia e precisa encontrar seu pai, com quem não fala há mais de dez anos. O diretor expressou sua paixão pelo cinema: “O cinema para mim é quase uma religião, é um lugar em que a gente pode transcender, se conectar com o mistério, o absurdo, a fantasia. Essa possibilidade de você chegar numa sala escura, sentado com diversas pessoas, as quais umas você conhece, outras não, e embarcar num filme, sentir emoções… ter essa experiência coletiva é um ritual importantíssimo para gente. Precisamos ter a consciência de que em uma sociedade cada vez mais individualizada, o ritual de ir para uma sala de cinema, assistir a um filme, é um ato de resistência”.

O evento deste ano continuou a tradição de oferecer uma programação diversificada, em um formato híbrido que combina a experiência presencial com a comodidade do streaming. Os filmes da mostra competitiva, que englobam longas nacionais, curtas nacionais, longas maranhenses, curtas maranhenses, videoclipes e filmes publicitários, estiveram disponíveis tanto fisicamente no Cineteatro Aldo Leite quanto online no site guarnice.ufma.br. Já os filmes que englobam a mostra universitária e a mostra paralela ‘Cinema Não Tem Idade’ aconteceram no CineSesc Deodoro e em acesso online a partir de sábado (08/06) às 00h01, até a quinta-feira (13/06) às 23h. Mais uma novidade dessa edição foi uma mostra competitiva de Jogos Digitais em parceria com Associação Maranhense de Desenvolvedores de Jogos (AMAGAMES), focada na divulgação e premiação de jogos desenvolvidos na região nordeste.

Para a seleção dos premiados dessa edição o festival contou com um júri nacional com nomes relevantes para cinema nacional e na crítica cinematográfica como Rose Panet: Professora, pesquisadora e cineasta, Fabricio Duque: Jornalista, crítico de cinema e fundador do site ‘Vertentes do Cinema’ e Zienhe Castro: dirigente da ZFilmes Produções e curadora do Festival PanAmazônico de Cinema e um júri maranhense que também reúne importantes personalidades do cinema regional como Pedro Severien: Roteirista e diretor de cinema, Lúcio Vilar: Jornalista, documentarista e coordenador Fest Aruanda do Audiovisual Brasileiro e Fabiana Lima: Crítica de cinema, fundadora da página Cinemafilia, membro da Critics Choice Association e a primeira mulher maranhense a integrar a Associação Brasileira de Críticos de Cinema.

Para a noite de encerramento, além de premiar todos os selecionados pelo júri e pelo voto popular, o festival terá o privilégio de apresentar a exibição especial do longa-metragem ‘Betânia’ de Marcello Botta que teve sua estreia no prestigiado Festival de Berlim 2024 retorna para o seu estado de origem para uma exibição especial com todos os ingressos esgotados. O longa, narra a história de Betânia, uma mulher de 65 anos e matriarca de uma grande família, que, após a morte de seu marido, é convencida por suas filhas a retornar à aldeia onde nasceu. Situada na beira do parque nacional dos Lençóis Maranhenses, a trama se desenrola em um cenário de beleza natural impressionante, contrastando com os complexos dramas pessoais e familiares que Betânia enfrenta. O filme explora temas universais como a memória, a saudade e a redescoberta de raízes, enquanto Betânia confronta seu passado e se reconecta com sua origem. A atuação poderosa e sensível da protagonista traz à tona as nuances de uma mulher que, apesar das adversidades, busca renovar seu senso de pertencimento e propósito.