Mais da metade dos mais de 360 pedidos de exploração ou estudo de recursos naturais autorizados pela Agência Nacional de Mineração (ANM) se concentra nos estados do Pará e do Mato Grosso. A substância mais procurada nesses pedidos é o minério de ouro, e o povo mais afetado por essas autorizações é o Kayapó.

Entre os grupos indígenas afetados está o povo Parakanã, Xavante, Nambikwára e Pataxó Hã-Hã-Hãe. Dos mais de 360 pedidos autorizados pela ANM, a maioria, 308, refere-se à pesquisa, à primeira etapa dos processos, que envolve estudos de viabilidade, mas já impacta o meio ambiente e a vida dos indígenas. Além disso, há quase 40 permissões para garimpo ou mineração dentro de terras indígenas.

As mineradoras Vale e Belo Sun lideram a lista de empresas com pedidos autorizados, com a Vale tendo 12 pedidos, principalmente no Pará, e a Belo Sun com 11 pedidos, também no Pará. Substâncias como ouro, prata, minério de ouro, estanho, cobre, berílio, minério de cobre e diamante estão envolvidas.

É importante observar que a existência de autorizações não implica necessariamente em exploração efetiva dos recursos ou mesmo em pesquisa, o que pode ser resultado de erro no processo da ANM. No entanto, as autorizações não foram anuladas pela agência reguladora, e a manutenção desses requerimentos sobrepostos a TIs, mesmo sem atividade, exerce pressão para que a exploração seja legalizada, permitindo que a empresa detentora da autorização inicie o empreendimento.

Uma investigação detalhada conduzida pela Folha cruzou as coordenadas geográficas dos requerimentos feitos à ANM com informações geográficas fornecidas pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Esses pedidos incluem autorizações para pesquisa (a maioria), concessões de lavra para mineração e permissões de lavra garimpeira, todos em territórios homologados, ou seja, terras oficialmente reconhecidas como indígenas.

A Vale alega que não possui títulos em sobreposição com terras indígenas desde 2021, enquanto a Belo Sun afirma desconhecer sobreposições com suas autorizações. A pesquisa da Folha focou exclusivamente em áreas de sobreposição, sem incluir adjacências. Atualmente, de acordo com o Instituto Socioambiental (ISA), o Brasil possui 500 terras indígenas regularizadas.

Marco temporal abre brechas

A legislação vigente proíbe pesquisa, lavra e garimpo em terras indígenas. No entanto, o projeto de lei do marco temporal, aprovado pelo Congresso em setembro, continha brechas que permitiam atividades como garimpo e a construção de usinas hidrelétricas em terras indígenas, além de parcerias entre indígenas e não indígenas para tais finalidades. O texto foi parcialmente vetado pelo presidente Lula, mas a bancada ruralista busca derrubar a decisão e retomar o texto original.

Enquanto isso, o governo busca alternativas para evitar a queda do veto, como a criação de regras claras para indenizar os proprietários das áreas que se tornem territórios indígenas.

O ponto central do projeto se baseia no conceito do marco temporal, que estabelece que a ocupação indígena deve ser considerada a partir de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, para a demarcação de territórios. Os indígenas contestam essa ideia, argumentando que, de acordo com a Constituição, o direito à terra é anterior à criação do Estado.

*Com informações da Folha