O Brasil, em 2022, testemunhou um triste recorde de feminicídios, com 1.437 vítimas, um aumento de 6,1% em relação ao ano anterior, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Mas, por trás desses números alarmantes, encontra-se uma realidade ainda mais devastadora: 17 crianças presenciaram o assassinato de suas próprias mães, vítimas de violência doméstica.

“A criança que presencia o assassinato da mãe sofre um trauma enorme. Além disso, fica órfã porque perde a mãe e o pai de uma só vez. Quando esse homem não é preso, acontece uma morte simbólica pela dimensão da violência. Crianças e adolescentes que presenciam violência no ambiente doméstico podem desenvolver transtorno de depressão, ansiedade e fobia social”, alerta o Instituto de Segurança Pública (ISP).

Além disso, a pesquisa revelou que, entre as 111 mulheres assassinadas no ano passado, 70 delas já haviam sido vítimas de algum tipo de violência anteriormente, mas não buscaram ajuda policial para registrar o caso.

Essa triste realidade reforça a necessidade de melhorias no acesso das vítimas à justiça e aos sistemas de proteção, especialmente para mulheres negras, que enfrentam barreiras adicionais para denunciar abusos.

Flávia Nascimento, coordenadora de defesa da mulher da Defensoria do Rio, explica: “Como a maioria das vítimas são mulheres negras, não é possível ignorar que elas têm mais dificuldades de acessar os sistemas de garantia da Lei Maria da Penha. A mulher negra sofre diversos entraves que prejudicam seu acesso à polícia e à justiça. São as que mais sofrem violência e as que mais enfrentam dificuldades para denunciar”.

Para combater esse grave problema, projetos de lei estão sendo discutidos no âmbito federal. Alguns deles pretendem garantir atendimento prioritário a crianças e adolescentes órfãos devido ao feminicídio no Sistema Único de Saúde (SUS), no acesso à Justiça, na matrícula em escolas, entre outros serviços públicos.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sanciona nesta terça-feira (31) lei que determina o pagamento de pensão especial para filhos de vítimas de feminicídio. O Projeto de Lei (PL) 976/2022, aprovado pelo Senado no início do mês, prevê que o benefício, no valor de um salário mínimo, seja pago a menores de 18 anos pertencentes a famílias de baixa renda.

“É preciso garantir que as pessoas que são vítimas da violência não tenham seus filhos abandonados pelo Estado. Se o Estado não cuidou da pessoa e permitiu que ela fosse vítima, o Estado precisa, pelo menos, assumir a responsabilidade de cuidar das crianças. Então, a gente quer criar uma bolsa para garantir que essas crianças possam estudar e se formar e, amanhã, poder ter o direito de viver, ter cidadania plena nesse Brasil”.

No programa semanal Conversa com o Presidente, Lula parabenizou o Congresso Nacional pela aprovação do texto. “Aos poucos, a gente vai conseguindo conquistar espaços”, disse.

Entenda

O PL 976/2022 prevê que a pensão pode ser paga antes da conclusão do julgamento do crime. Caso a Justiça não considere que houve feminicídio, o pagamento é suspenso, sendo que os beneficiários não serão obrigados a devolver os valores recebidos, desde que não seja comprovada má-fé.

O texto também impede que o suspeito de cometer feminicídio ou de coautoria do crime receba ou administre a pensão em nome dos filhos. Outra proibição prevista é acumular a pensão com demais benefícios da Previdência Social.

Dados

Em 2022, o número de feminicídios aumentou 6,1% em comparação ao ano anterior – 1.437 mulheres mortas. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, houve crescimento de todas as formas de violência contra a mulher.

*Com informações da Agência Brasil