O Supremo Tribunal Federal (STF) debate neste instante, nesta quarta-feira (30), o julgamento do processo que trata da constitucionalidade do marco temporal para demarcação de terras indígenas.

O PL 2903 é uma tese política patrocinada pelo agronegócio e pretende mudar o rumo da história dos povos indígenas e agravar a crise climática.

A tese, antes de tudo, põe em risco o processo de demarcações de terras indígenas no país, tanto as que já foram demarcadas quanto os futuros territórios.

Em parecer publicado dia 16 de agosto, a Advocacia Geral da União (AGU ) alertou para a necessidade de alteração no texto, por conta de pontos de inconstitucionalidade que poderiam resultar “em claro prejuízo à segurança jurídica”.

Dentre os pontos, AGU aponta que o texto do PL distorce as disposições do artigo 231 da Constituição ao colocar uma data para delimitar as demarcações das Terras Indígenas (TI´s).

De acordo com o PL, só teriam direito à demarcação de seus territórios os povos que estivessem ocupando aquelas terras em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição.

Em texto para a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Marcos Sabaru, indígena da aldeia Tingui-Botó e assessor político do órgão, afirma que o Marco Temporal inverte a lógica:

“Parece que quem chegou nas caravelas foram os indígenas”

Para além de datar o direito à terra por parte dos indígenas o PL também traz outros pontos alarmantes que separamos aqui:

1 – Risco à vida, cultura e saúde dos povos isolados

A AGU aponta ainda que, de acordo com o artigo 28 do PL 2903, caso seja aprovado, haverá uma violação ao respeito do modo de vida indígena, já que o texto altera a política de não contato com povos isolados, permitindo até mesmo empresas e missões religiosas em seus territórios.

2 – Indígenas sem voz: o texto prevê construções, explorações e obras em TIs, sem consulta prévia

Segundo a AGU, o artigo viola a resolução 169 da OIT, que estabelece o direito dos povos indígenas à consulta livre, prévia e informada. Se aprovado, o PL daria abertura para que territórios até então protegidos, fossem invadidos e explorados sem que os povos indígenas que ali vivem fossem informados ou consultados.

3 – Legalizar a invasão de terras, mas somente as terras indígenas

O PL ainda prevê que invasores de TI´s ainda não demarcadas possam permanecer nos territórios “sem limite de uso e gozo” das terras, o que põe em risco a segurança e a saúde dos povos indígenas.

Muitas TI´s seguem sem demarcação, pois além de longo, os processos ficaram parados durante todo o governo Bolsonaro, que terminou seu mandato sem demarcar nenhuma TI.

Mesmo assim, essas terras são ocupadas por povos originários, que mantém ali não somente seu sustento e modo de vida, como vêm aquele território como parte de sua família.

Mais de 8 mil indígenas se mobilizaram na 18ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL) em Brasília. Foto: Mídia NINJA

4 – A tese proíbe a ampliação de terras indígenas já demarcadas

Segundo o parecer, a Constituição estabeleceu o direito indígena às terras como originário e, por isso, “o procedimento demarcatório é meramente declaratório. em reconhecimento de direito preexistente”.  Para a AGU, o artigo 13 “restringe o alcance protetivo constitucional, incidindo, uma vez mais, em ineficiência protetiva”.

5 – O texto fala sobre reaver TI´s por alterações culturais

“As terras indígenas são objeto de declaração, não de constituição. Assim, não estão sujeitas a revisão por alegadas constatações de alteração dos traços culturais da comunidade.

É inadequado, assim, se falar em retomada pelo estado de terras indígenas, pela adoção por estes de um específico modo de vida”, aponta o parecer da AGU.

Em outras palavras, o texto do PL quer manter a ideia de que a identidade indígena é a mesma desde a colonização, sem levar em conta o contato com diferentes povos, as mudanças e evoluções do tempo, além das diversidades de povos indígenas existentes, cerceando a liberdade de expressão desses povos.

Cientistas, pesquisadores e ambientalistas do mundo todo têm alertado para as consequências que o Marco Temporal pode trazer também para a crise climática.

Afinal, demarcar as Terras Indígenas e mantê-las protegidas de invasores ilegais, garimpeiros, madeireiros e o avanço do agronegócio é garantir que o estoque de carbono nessa área seja mantido e os direitos dos povos indígenas respeitados.

Com informações da APIB