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No interior de Minas Gerais, uma jovem de 21 anos ficou algemada no leito de um hospital após procurar ajuda por complicações decorrentes de um aborto. O médico responsável pelo atendimento, contrariando o sigilo profissional e as normas éticas da medicina, denunciou a paciente à polícia, resultando em seu interrogatório. Atualmente, a jovem é acusada de homicídio duplamente qualificado, tentativa de aborto e ocultação de cadáver.

O caso ocorreu em outubro de 2020, quando a paciente foi encaminhada à Santa Casa de Araguari, a 574 km de Belo Horizonte, apresentando dor abdominal, sangramento e expelindo coágulos. O médico responsável pelo seu atendimento, o ginecologista Roberto Laurents de Sousa, suspeitou de aborto e acionou a Polícia Militar. O caso foi revelado pelo jornalista Wanderley Sobrinho, no UOL.

De acordo com o boletim de ocorrência, três policiais militares confirmaram que foram chamados pelo médico. Durante o interrogatório, a paciente, pressionada, confessou o aborto, sendo imediatamente detida e algemada no leito hospitalar. Ela permaneceu algemada por três dias, sendo dois na UTI e outro no quarto. O pedido de prisão preventiva após a alta hospitalar foi negado pelo juiz.

A denúncia feita pelo médico configura uma violação do Código de Ética Médica, que proíbe explicitamente a revelação de informações obtidas durante o exercício profissional, exceto em casos de motivo justo, dever legal ou consentimento do paciente por escrito. Além disso, a ação do médico também viola o Código de Processo Penal, que considera como crime a revelação de segredos profissionais que possam causar dano a terceiros.

Em março deste ano, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou provas em um processo semelhante, em que uma mulher foi denunciada por seu médico por ter realizado um aborto. O relator do caso, ministro Sebastião Reis Júnior, destacou que o médico é proibido de revelar segredos obtidos em razão de sua profissão, de acordo com o Código Penal.

No entanto, na época da denúncia, estava em vigor uma portaria emitida pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), revogada posteriormente pelo governo de Luís Inácio Lula da Silva (PT), que recomendava aos profissionais de saúde que denunciassem casos de aborto. No entanto, é válido lembrar que portarias não podem se sobrepor às leis já em vigor.