Moradores de São Sebastião, no litoral de São Paulo, temem que o cenário de abandono e as chuvas recentes provoquem novas tragédias em um dos locais duramente atingidos em fevereiro deste ano, quando registrou 64 mortes em deslizamentos e enxurradas.

Além das estruturas atingidas, como casas e comércios, que voltaram a serem ocupadas após decisão controversa da Defesa Civil, o projeto de construção de casas populares em uma área que alaga constamente é duramente criticado pelos moradores.

O prefeito do município, Felipe Augusto (PSDB), faz propaganda nas redes sociais como algo positivo o conjunto Baleia Verde. São 518 unidades habitacionais que estão sendo construídas em uma área afastada da cidade, e que acumula uma série de contradições, e pode até mesmo reforçar o racismo ambiental.

Na última terça-feira, encostas próximas à praia da Barra do Sahy, epicentro da tragédia de fevereiro, voltou a registrar deslizamentos de terra por causa da chuva e do mal planejamento, que persiste.  Segundo o INMET, foi registrado um acumulado de 100 milímetros de chuva em um período de 6h em São Sebastião. O município segue em alerta máximo de deslizamentos.

Foto: reprodução

A deputada Ediane Maria (PSOL-SP), autora da primeira ação popular que obrigou a prefeitura a prestar contas sobre valores recebidos, e como eles estavam sendo aplicados, questiona a ausência de uma política pública adequada, urgente e eficaz que atenda as demandas da população, que se vê diante de mais uma ameaça.

“O terreno que alaga foi entregue para receber as novas casas. E isso é perigoso. Além de distanciar as pessoas da área central da cidade, coloca elas em risco de novo”, afirmou a deputada à NINJA.

Deputada Ediene Maria (PSOL-SP)

Uma das moradores registrou em vídeo o momento em que o terreno de construção das casas é alagado. “Aí, ó, R$ 93 milhões investidos. Se for CDHU [conjunto habitacional], beleza. Mas está mais para piscinão, viu”, afirmou o morador, em terreno onde serão construídas as moradias na região do bairro Baleia Verde.

Na Rodovia Rio-Santos, que corta o litoral norte, a situação também é de risco iminente. Já houve deslizamentos de terra em Toque-Toque Pequeno, na serra de Juquehy e no trevo de Barra do Sahy e Vila do Sahy, segundo a Defesa Civil de São Sebastião.

Atualmente, de acordo com informações que chegaram ao gabinete da deputada, 1,5 mil famílias ainda lutam para receber o auxílio aluguel. Embora a prefeitura alegue que os repasses estaduais e federais estão sendo aplicados, são centenas de denúncias de descaso para inclusão das famílias no cadastro.

“Houve recurso do estado, o presidente foi lá, depois o governador foi lá, Mas agora existe um abandono, olhar para os sobreviventes preocupados com o retorno para as suas casas, que foram liberadas pela Defesa Civil sem condição de moradria, gera aflição. Uma delas caiu na última semana”, afirmou Ediane Maria, que integra a Comissão de Habitação, Desenvolvimento e Reforma Urbana da Assembleia Legislativa de São Paulo.

O mandato da deputada estadual Ediane Maria acompanha a população atingida e esteve presente em ato público realizado em 19 de abril em frente à prefeitura de São Sebastião. Na ocasião, o prefeito Felipe Augusto não compareceu e, na tentativa de criminalizar o movimento, acionou a polícia militar para contê-los.

O prefeito também esteve ausente na audiência pública que marcou os três meses da tragédia. Organizada pela Comissão de Habitação, Desenvolvimento e Reforma Urbana da Alesp, a atividade reuniu cerca de 200 pessoas no dia 31 de maio. Os atingidos e familiares das vítimas vieram a São Paulo para denunciar o descaso e exigir a criação de políticas públicas voltadas as necessidades emergenciais.

“Não existe portal de transparência eficiente, com dados completos. Como a prefeitura dialoga com o povo? tem que prestar conta”, afirmou Ediane.

União dos atingidos é o nome da articulação que une moradores de São Sebastião que mantém a luta pela moradia, contra o racismo ambiental e por melhores condições de vida no estado mais rico da federação.

“É uma total desumanização. Estamos falando do abandono de mulheres negras, mães solos e migrantes, que é a maioria dos atingidos. Existem pessoas tomando água com barro. Os moradores que participaram da audiência trouxeram a água turva que saia das torneiras e mostraram que adultos e crianças estão sendo obrigados a tomar aquela água. A gente vai continuar em cima, buscando soluções para essas famílias”, afirmou.

A audiência pública que ouviu moradores aconteceu no dia 31 de maio, com ausência do prefeito de São Sebastião. Diante do aumento expressivo de alertas da Defesa Civil nos últimos dias, as autoridades municipais não podem deixar que ocorra uma nova tragédia. “Ele tem que falar com quem foi atingido”, concluiu a deputada.