Privacidade digital vs segurança pública: o que está em jogo no bloqueio do Telegram
A privacidade e a proteção de dados pessoais são direitos fundamentais e devem ser protegidos em qualquer ambiente. No entanto, quando se trata de segurança pública, a privacidade pessoal pode entrar em conflito com a necessidade de investigação.
A privacidade e a proteção de dados pessoais são direitos fundamentais e devem ser protegidos em qualquer ambiente, incluindo na internet. No entanto, quando se trata de investigações criminais e de segurança pública, a proteção da privacidade pessoal pode entrar em conflito com a necessidade das autoridades de acessar informações para fins de investigação.
Recentemente, o Telegram foi bloqueado no Brasil após se recusar a fornecer informações solicitadas pelas autoridades em relação a um grupo específico. O Telegram argumentou que o grupo havia sido deletado e que, portanto, eles não tinham como fornecer as informações solicitadas. Essa situação levanta questões importantes sobre a proteção da privacidade pessoal e a necessidade de acesso a informações para fins de investigação.
Por um lado, a privacidade pessoal é um direito fundamental protegido por lei e é importante garantir que as solicitações de informações estejam em conformidade com as leis e regulamentações aplicáveis e sejam justificadas e proporcionalmente necessárias para atingir seus objetivos. Por outro lado, a necessidade de investigações criminais e de segurança pública também devem ser consideradas e protegidas de acordo com a legislação aplicável.
Tecnicamente, é possível e desejável que haja ferramentas tecnológicas que garantam a privacidade dos usuários, o que inclui o direito e a capacidade de não ter seus dados e conversas armazenados pelos provedores, fornecedores e plataformas, ou de poder apagar dados armazenados a qualquer momento. Isso está garantido na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que estabelece regras para a coleta, armazenamento, processamento e compartilhamento de dados pessoais.
No entanto, a LGPD também prevê exceções para o compartilhamento de dados pessoais, incluindo em casos de investigações criminais e de segurança pública. Nesses casos, as autoridades podem solicitar o acesso a dados pessoais, desde que seja justificado e esteja em conformidade com as leis e regulamentações aplicáveis.
Essa questão levanta importantes debates. A polêmica não é nova no Brasil e remonta ao debate em torno do Marco Civil da Internet, aprovado em 2014. Naquela época, houve intenso debate sobre a obrigação de “guarda de dados por provedores de acesso”, para garantir a rastreabilidade dos usuários.
Vale lembrar que a LGPD foi aprovada depois do Marco Civil, e isso aprofundou ainda mais esse conflito de interesses entre a privacidade e o direito de cidadãos se comunicarem e se organizarem livremente, sem risco de vigilância ou controle por governos de plantão, salvo quando sob investigação com autorização judicial.
O bloqueio do Telegram no país levanta importantes questões sobre a proteção de dados pessoais e a necessidade de acesso a informações para fins de investigação. É importante equilibrar esses interesses e garantir que as autoridades de segurança pública cumpram as leis aplicáveis e atuem de forma justa e proporcional para proteger a segurança pública e os direitos dos indivíduos à privacidade de dados.
O Brasil é reconhecido mundialmente por sua posição de liderança na construção da cultura digital global. O país tem uma longa tradição de contribuir em temas como software livre, generosidade intelectual, colaboração em rede, governança colaborativa e inovação pública por meio de políticas digitais. Essas características formam uma Cultura Digital Brasileira, que é a perspectiva e proposta do país para a construção da internet e da era digital do planeta.
No entanto, para enfrentar os desafios atuais e futuros, é importante retomar o debate, reflexão, pesquisa e elaboração de novos regramentos, estratégias, ações e ferramentas para lidar com todas as questões da democracia na era digital. No primeiro governo Lula, houve uma aliança entre Cultura, Comunicações, Planejamento, Presidência e Justiça, sob as pautas do software livre, da inclusão digital e da governança colaborativa. Agora, no novo governo Lula, esse movimento precisa ser retomado para reconectar a rede de especialistas e organizações com as diversas frentes do governo e retomar a potência da cultura digital brasileira.