Brilhar e Transcender: projeto acolhe mulheres trans e travestis no RJ
Confira entrevista com Thaylla Varggas, educadora de saúde e ativista do BeT
Por Kaio Phelipe
Voltado para mulheres trans e travestis de 18 a 24 anos, residentes no Rio de Janeiro, que não vivem com HIV, recém descobertas soropositivas ou que não tenham iniciado o tratamento, o BeT – Brilhar e Transcender, oferece o acolhimento que as unidades de saúde não proporcionam. Além de prevenção e tratamento do HIV, o BeT disponibiliza acompanhamento hormonal para suas voluntárias. O projeto é idealizado pela Fiocruz e acompanhado por Thaylla Varggas como assistente de pesquisa.
“A primeira fase do projeto, iniciada em 2019, compreendeu 10 mulheres. Atualmente, na fase 2, abrange 150. Existe também o projeto HPTN (HIV Prevention Trials Network), voltado para mulheres trans e travestis a partir dos 18 anos e sem limite de idade, que inclui 110 mulheres que não vivem com HIV, para uso de PrEP (Profilaxia Pré-Exposição)”, explica Thaylla, à frente do BeT desde que se iniciou a segunda fase.
“É importante uma mulher trans ou uma travesti ser atendida por outra. Isso nos dá esperança, incentiva”, continua Thaylla. “Não gosto de romantizar, dizendo que todas nós iremos conseguir, porque não é bem assim, a gente sabe que não é. Um fator importante é que na presença de outra mulher trans, a gente se sente muito mais à vontade para falar o que é preciso. As unidades de saúde, muitas vezes, assumem preconceitos. Muitos evangélicos trabalham nesses espaços e, querendo ou não, isso acaba impedindo que pessoas trans busquem melhores condições de saúde”.
Thaylla Varggas é travesti preta e entrou para o ativismo em 2018, através do Grupo Pela Vidda – RJ, como educadora de saúde. Em seguida, foi coordenadora da Rede Jovem Rio + e trabalhou com Mauro Schechter, médico infectologista referência no país. Também acompanhou Victor Madrigal, diretor da ONU, em sua vinda ao Rio de Janeiro, e foi quando Thaylla teve contato com profissionais da Fiocruz e recebeu o convite de trabalho, a princípio por três meses, período que foi estendido e onde está até hoje, há mais de dois anos.
“Não escolhi ser ativista, ao contrário, o ativismo me escolheu. Com o BeT, foco muito na parte administrativa, mas gosto muito de estar em contato direto com as pessoas, conversar, escutar. É importante que as pessoas que chegam aqui se sintam confortáveis comigo, fica muito mais leve para depois responderem um questionário. Amo o que faço, mas é importante ressaltar que não é fácil, lidar com gente é complicado e preciso prestar atenção e lidar com as minhas próprias demandas também”.
Outra característica do BeT e do atendimento de Thaylla são os espaços de convivência, como o bazar, as rodas de conversa e os cafés em encontros mensais ou trimestrais, quando é preciso fazer algum exame. “Conversamos muito sobre gênero, raça, violência contra a mulher, saúde sexual. Os espaços de convivência servem para elas se conhecerem, trocarem experiências, se aproximarem”.
O BeT é inteiramente pensado para a inclusão de pessoas trans, considerando todas as suas questões para que permaneçam no projeto. Por motivos que vão de enjoo à situações de maior vulnerabilidade, pode acontecer da medicação ser interrompida por conta das voluntárias. Com o trabalho de assistência, Thaylla, semanalmente, entra em contato com todas para verificar a continuidade do processo, tanto preventivo quanto para tratamento.
“Homens gays cisgêneros e brancos sempre se colocam na dianteira do movimento, mas quem está na rua, quem tem os acessos privados, quem está morrendo são as pessoas trans. Casamento igualitário, adoção e algumas leis, para acontecer, dependem que corpos trans estejam morrendo. Dentro do próprio movimento LGBTI+, ainda é preciso que algumas pessoas entendam o que é respeito. A bandeira ainda é GLS, não inclui todas as siglas. A comunidade LGBTI+ que a sociedade aceita ainda tem um perfil cis e precisa corresponder a vários estereótipos. Mas a gente não está esperando um convite para ser aceita, a gente quer ser respeitada”.
A próxima proposta de Thaylla Varggas é a criação de um podcast para falar de assuntos ligados à mulher, sejam trans, cis, lésbicas, bissexuais ou heterossexuais. “Venho me aprofundando em alguns assuntos e estudando. Agora, estou fazendo um curso de mulheres pretas e periféricas e estou para começar um de oratória. Aprendo muito trabalhando no BeT também”.
Thaylla Varggas é assistente de pesquisa, educadora de saúde e ativista. Clicando aqui, é possível encontrar seu perfil no Instagram. É possível encontrar mais informações sobre o BeT, neste perfil.