Pós Fernanda MARIA Young
Uma jornada para redescobrir Maria & Fernanda em forma da peça
Estar no lugar que alguém que você conhece queria estar, não é fácil.
Fazer isso tendo passado uma semana imersa com essa pessoa num apartamento, menos ainda.
Essa pessoa ser Fernanda Young coloca isso em outro patamar.
Mas quem assumiu o desafio foi Maria Ribeiro. Que, segundo a Wikipédia, é uma “atriz, escritora e diretora de cinema brasileira. Ela já ganhou vários prêmios em sua carreira, incluindo um Grande Otelo, um Prêmio Guarani, um Prêmio Qualidade Brasil e um Kikito do Festival de Gramado”, mas no palco, Maria foi mais que isso. E outras coisas.
Maria foi Fernanda, foi ela mesma, foi mulheres marchantes, foi mulheres frustradas e bem resolvidas sexualmente, foi mãe, foi dançarina, foi maiô e calça arrastão e foi calça e bota rosa. Foi uma pessoa complexa, cheia de camadas e por isso, uma mulher real.
Em certa altura da peça, Maria também foi contra Fernanda – e se deliciem comigo pelo fato de que o 2º nome de Fernanda é Maria, então Maria era parte de Fernanda também. MAS, Maria foi contra Fernanda porque Fernanda também era contra si mesma. E agora as duas (em partes) reconheciam a existência de pessoas trans sem questioná-las. Quando Maria disse à Fernanda que queria adaptar o livro de sua autoria “Pós-F: Para além do masculino e feminino”, para um monólogo, ela topou falando que inclusive haviam partes do livro que ela mesma já discordava. Foi inclusive ventilado que as duas interpretariam Fernanda no palco, uma discordando da outra. Me senti representada.
Fisicamente, a parte mais engraçada e agoniante, é como termina a cena/capítulo sobre a maternidade. Maria tem dois meninos. Fernanda tinha três meninas e um menino. No palco, a atriz parecia ter os 6. E eu me senti tendo 7. 8. 9. 10. Apesar de saber que para mães que almejavam ser a mãe do paninho estendido na praça, ou para mães solos negras, apenas 1 filho/a é o suficiente para fazer a gente dar uma surtada.
Meu momento favorito musical foi “Creep” de Radiohead, talvez induzido pelas várias versões que já ouvi da música, como a de Postmodern Jukebox, que inclusive ouço enquanto escrevo. Mas talvez a música não tenha nada a ver com o motivo de ter gostado. Eu, como uma pessoa instigada por cores, fiquei a peça toda esperando que ela pegasse a capa vermelha que estava exposta no cenário. Eu sentia que seria um dos momentos mais emocionantes. Ou engraçados. Ou explosivos. Senti que seria. Só não sabia porque.
E, se bem me lembro, foi depois/durante Creep que ela pegou a capa (ou só juntei meus dois momentos favoritos na cabeça, Fernanda era rebelde e me entenderia). Ao vestir a peça Maria parecia uma super heroína. Depois de tanto construir, destruir e reconstruir a imagem do que era ser mulher do lugar que Young era mulher, ser uma super heroína parecia contraditório. Eu ri disso depois porque ela justamente adoraria que fosse contraditório.
Mas quem estava errada era eu. Fernanda já havia falado sobre porque teve a cabeça raspada. Já havia gritado que o prazer feminino não dependia de um pau (apesar de que, de mulheres que os tem, pode ser que sim). Já havia falado sobre proteger o indivíduo para exercer sua maternidade. E agora…. Agora a capa vermelha era só a parte de dentro e na verdade o que estava bordado nas costas era uma imagem de Nossa Senhora. Maria Aparecida. Preta. Com adornos coloridos. Não era uma capa de super heroína, era um manto sagrado. Tudo bem que ser santa não é melhor que ser super heroína. Mas naquele exato momento, ela não era nenhuma dessas coisas. Maria do Amaral Ribeiro homenageava as mulheres. Fernanda Maria Young de Carvalho Machado era homenageada.
No Brasil nasceram (em 2016) 11.734.129 Marias. Já Fernanda era o 35º nome mais escolhido para batizar as designadas mulheres ao nascer. Mas para mim, no fim, era impossível saber se era Maria, Fernanda, Maria Fernanda ou Fernanda Maria.
Você pode tentar descobrir todas as sextas e sábados, até 26/06 no Teatro Porto Seguro em São Paulo. E quando descobrir, me conte.