O combate à pobreza menstrual como política pública municipal
Confira coluna da vereadora Amanda Gondim
A pobreza menstrual é um problema real para adolescentes que menstruam. A falta de acesso a produtos de higiene para lidar com o período menstrual traz enormes riscos à saúde, muitas vezes em virtude das medidas precárias e insalubres a que os jovens recorrem. Na falta de absorventes higiênicos, muitos estudantes perdem dias letivos ou abandonam os estudos como forma de evitar os constrangimentos vividos.
Dados da ONU apontam que um em cada dez jovens falta às aulas durante o período menstrual em todo o mundo. No Brasil, esse número é ainda maior: um entre quatro estudantes já deixou de ir à escola por não ter absorventes. Ao enfrentar esta realidade, esses estudantes perdem, em média, até 45 dias de aula por ano letivo, como revela o levantamento “Impacto da Pobreza Menstrual no Brasil”.
De acordo com o estudo “Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos”, divulgado pelo Unicef e pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), os riscos para a saúde de um manejo inadequado da menstruação relacionam-se à possibilidade de alergia, irritação da pele e mucosas, infecções urogenitais (como cistite e a candidíase) e até uma condição conhecida como Síndrome do Choque Tóxico, que pode levar à morte. Acrescenta-se aos riscos o dano emocional provocado pela pobreza menstrual.
De acordo com Dandara Santos, integrante do “Girl Up” (movimento de luta pela igualdade de gênero em 125 países, fundado pela ONU), “muitos adolescentes começam a menstruar entre os 10 e 13 anos e esse é um período que a socialização importa bastante, para formar laços e ajudá-las a conhecer o mundo. Além disso, perder aulas por conta da menstruação prejudica o processo de aprendizado e gera impactos em sua vida adulta”.
É notório o estigma que a menstruação ainda suscita na sociedade, bem como a necessidade de políticas públicas que diminuam as dificuldades enfrentadas pela população que menstrua, sobretudo a jovem. O Sistema Único de Saúde (SUS), por exemplo, distribui gratuitamente preservativos como medida de prevenção às doenças sexualmente transmissíveis, mas não desenvolve política semelhante para o enfrentamento da pobreza menstrual. Recentemente, inclusive, esse tema foi objeto de discussão nacional, quando o presidente Bolsonaro vetou projeto de lei da deputada federal Marília Arraes (e outres 34 deputades), o qual visava a distribuição de absorventes para estudantes dos ensinos fundamental e médio que estão em vulnerabilidade social. Agora, o Congresso discute, mantém ou derruba este veto.
Considerando os referidos prejuízos sociais, no contexto do descaso bolsonarista com políticas públicas de combate à pobreza menstrual, o poder público local deve surgir como um contrapeso ao atual Governo Federal. Estas iniciativas, inclusive, podem partir das casas legislativas dos municípios, seja como provocação do debate no Parlamento, fiscalização das ações do Executivo sobre o tema ou proposição de emendas junto aos projetos de leis orçamentárias municipais.
A proposição de emendas às Leis de Diretrizes Orçamentárias e ao Plano Plurianual dos municípios são instrumentos que as vereadoras e os vereadores têm para articular recursos que garantam os direitos à saúde, à educação e viabilizem o acesso gratuito aos absorventes menstruais para estudantes das redes municipais de ensino. Políticas públicas pautadas na prevenção de doenças e da evasão escolar, garantindo os direitos fundamentais à educação e saúde.
Tenho trabalhado neste sentido em meu mandato na Câmara Municipal de Uberlândia e apresentamos estas emendas aos Projetos de Leis Orçamentárias para vigência nos próximos 4 anos. Antes da votação na Câmara, a Prefeitura a assinou decreto para o fornecimento de absorventes na rede municipal de ensino. Diante da inércia de um governo federal – e em muitas vezes também nos estados e nas cidades – que só reproduz e reforça uma cultura misógina e patriarcal, torna-se importante mobilizarmos redes de parlamentares progressistas e provocar este movimento de construção das políticas nos municípios. Se eles não fazem, a gente pode (e deve ter o compromisso de) pressionar para que façam!