“Contemplação & Emancipação”, com Geoneide Brandão
Diretamente do sertão de Alagoas, conheça a artista plástica Geoneide Brandão, #ArtistaFOdA desta semana.
Por Amanda Olbel / @planetafoda
Conheça nesta semana a artista plástica, do sertão de Alagoas, Geoneide Brandão, na seção #ArtistaFOdA. Com pinturas quentíssimas e afetuosas, aos 21 anos se prepara para ter uma exposição em Londres, pela Brick Lane Gallery, que ocorrerá em outubro deste ano. Ela nos conta que seu objetivo com o trabalho de técnica óleo é construir uma perspectiva imagética da sexualidade feminina a partir do olhar das próprias mulheres LGBTQIAP+, com suas histórias e narrativas pessoais.
Geoneide revela que começou a pintar aos 15 anos, após aventuras pelo mundo do Instagram, quando a rede ainda era utilizada apenas por fotógrafos profissionais e aspirantes. Na época, advinda de Ouro Branco, não havia contato nenhum com arte, mas a conexão com a web abriu portas para investigação expressiva, partindo da fotografia. Após perder o celular que tinha comprado, se viu sem a possibilidade de criar registros com o aparelho e mergulhou nos materiais de desenho como rota de fuga. E foi dessa forma que entendeu que seu desejo era ser artista plástica mesmo, lhe enfatizando o ímpeto de iniciar estudos de técnica para chegar onde se encontra hoje.
Não sei explicar o que me atrai tanto na pintura, ou o que me encanta tanto nela. Sempre quis ser pintora e me entender nesse lugar, mas tinha muito medo de me assumir dessa forma por achar que eu não sabia pintar.
Cursando atualmente o 2° período de Artes Visuais pela UFRN, em Natal, teve seus quadros em uma mostra em Ponta Verde, em fevereiro, e se prepara para a uma exposição em Londres, que ocorrerá em outubro, após ter sido selecionada para uma chamada aberta da Brick Lane Gallery. A série de pinturas que participará da exposição coletiva se deu início a partir de desenhos de um caderninho, dentre eles a obra intitulada de “Azul não é a cor mais quente”. Esta acabou se tornando a primeira feita nos parâmetros de cor e composição que a artista desenvolve agora, como uma resposta crítica ao filme, – que apesar de ter sua importância, surge a partir de uma perspectiva masculina.
“Estou querendo construir uma perspectiva imagética de sexualidade feminina, a partir da nossa perspectiva, que nós mulheres, lgbtqiap+, contemos nossas próprias história e nossas próprias narrativas. Acho que o que eu posso dizer sobre o “amorARDOR”, é meu desejo de colocar esse corpo em evidência, mostrando a beleza desse corpo, a beleza que tem por trás dessa vivência, que não é toda linda: sabemos o peso que é ser lgbtqiap+ no Brasil. Aqui em Alagoas é o estado em que mais se mata lgbt no país então, principalmente em Maceió, isso é bem forte, com a LGBTfobia. E meu trabalho quer colocar esses corpos em evidência, trazer narrativas e contar a história dessas pessoas, dando dignidade para esses corpos, e consequentemente dar dignidade para minha existência também”.
Ela diz entender o corpo de uma pessoa LGBT como não normativo e que por conta disso causa estranhamento. Dessa forma, quando nos colocamos no mundo, nos tornamos alvo de agressões verbais, físicas, fatais. Logo, deseja justamente colocar esses corpos dentro de um espaço de poder, onde a pintura e o mundo da arte, (assim como estar em uma galeria em Maceió, em São Paulo e Londres), se manifestam como um espaço de poder.
“Eu tenho o poder de contar novas histórias: nossas histórias. Das pessoas trans, de mulheres bissexuais, mulheres lésbicas. E quero que esses corpos sejam contemplados e tenham suas belezas exaltadas. O que tento propor é uma contemplação e emancipação desses corpos. Emancipação das suas existências, da sexualidade, da expressão de gênero: desse prazer. E questionar as normatividades”.
Cita como grandes referências na sua trajetória os trabalhos dos fotógrafos Robert Mapplethorpe, Nan Golding e Ren Hang , e dos pintores Georgia O’keeffe e Fefa Lins. Todavia, hoje busca ela própria construir suas imagens de referência fotográfica, dando caráter de mais autenticidade para seu projeto.
Geoneide enfatiza de que não há como falar sobre esses corpos se não falarmos também sobre o prazer, assim como falar sobre a dor. Porque acredita terem quase mesmo peso e medida, enquanto pessoa LGBT, a dor, a delícia e a beleza de sermos exatamente quem somos. Já diria Paulo Leminski, que isso “ainda irá nos levar além”. E que nos leve mesmo.
A artista diz também ter chegado nesse lugar por querer a princípio abordar sua história, como uma mulher que ama outras mulheres, e de resto, o conceito foi se expandindo. Acredita que mesmo retratando um corpo que não seja o seu, mas que esta pessoa se compreenda com identidades de gênero e sexualidade diferentes da héteronormativa, acaba por falar sobre si própria também.
“Não quero me sentir marginalizada por ser quem eu sou, e encontrei na pintura, na arte, um lugar que me confere dignidade. Onde minha existência é digna e válida”
Quando questionada a respeito de sua paleta cromática relata que sente uma importância muito grande na presença do espectro das cores quentes:
“Sempre gostei muito de vermelho e, meio a experimentação, cheguei nessa estética com paleta do vermelho, amarelo, preto e branco – e suas variações. Crio a partir dela os meios-tons e o claro e escuro. E para mim fez sentido dentro do meu discurso: o vermelho tem um atrativo, tem uma característica excitante, e junto com o amarelo mais ainda. Queria trazer esse calor, porque ele tem uma importância, com o corpo, com o toque, então esse monocromático provoca o que eu desejo, porque traz essas camadas de significado. Ele aquece e queima. O amorARDOR é esse calor”.
Geoneide Brandão diz não estar nos grandes polos de arte, mas tem a internet como um espaço que utiliza para poder explorar o máximo que puder as suas possibilidades. Em outubro estreia em Londres por conta disso, e ainda não sabe se será possível, por toda a conjuntura mundial, mas seu desejo é comparecer à Vernissage. Ela pretende também, tornar de seu trabalho um projeto itinerante, que passe por outras Galerias, de vários outros Estados do Brasil, possibilitando alcançar e afetar um público cada vez maior.
Para ficar por dentro de suas próximas pinturas, assim como os próximos passos da artista, siga @geocentrismo pelo Instagram. E para as próximas entrevistas, siga o perfil @planetafoda, frente de mobilização LGBTQIAP+ do Mídia Ninja, e acompanhe a hashtag #ArtistaFOdA, para entrevistas publicadas semanalmente com artistas diversos de todo o país.