AutorAS de ficção científica no Brasil? Temos sim!
Imagina um futuro que o luto não é permitido, no Brasil do ano de 2121 de uma São Paulo futurista, pessoas agonizam um tempo sem passado, sem dor e sem direito ao próprio legado.
Imagina um futuro que o luto não é permitido, no Brasil do ano de 2121 de uma São Paulo futurista, pessoas agonizam um tempo sem passado, sem dor e sem direito ao próprio legado.
Soa familiar?
Não Esqueça é o primeiro livro de ficção científica da autora Carol Façanha, doutoranda de literatura de língua inglesa da UERJ, pesquisando sobre a reincidência da Poética Gótica na Distopia Contemporânea.
A jornada de ser escritora começou antes da faculdade, escrevendo em meio a aulas que ela deveria estar prestando atenção. O primeiro pseudônimo se chamou “caderno azul”, ironicamente a mesma cor da pílula que o personagem Neo em Matrix (1999) se recusa a tomar, negando uma ignorância abençoada e abraçando a realidade, por mais dolorosa que ela venha a ser.
A pílula azul foi o disparador para as primeiras ideias.
E se um governo proibisse as pessoas de passarem pelo processo do luto por causa da chamada “patologia do apego”? Se você acha isso estranho, é porque deve ter pulado alguma aula de História: nos povos colonizados, a cultura regional era apagada e a língua da metrópole sobrepunha desde a comunicação até a forma de “sentir” dos nativos. Se na realidade, temos um histórico para revisitar, no romance distópico de George Orwell, 1984, a temática pode ser vista, por exemplo, na criação da Novafala, linguagem que promete estreitar as possibilidades do pensamento ao banir certas palavras revolucionárias, como se com isso pudesse banir também o próprio caráter humano questionador.
Voltamos à pílula azul: em 2121, a maior metrópole da América Latina é uma São Paulo Sem Passado (Sem Paulo, para os íntimos).
A História não autorizada de como isso se tornou uma realidade está trancada em Alexandria, hórula instalada nos subsolos do metrô da cidade, onde a resistência sobrevive.
Na superfície, à primeira vista a sociedade não parece ter mudado tanto assim: ainda temos jornais noticiando casos de crimes, ainda possuímos uma prisão para colocar os desordeiros e nos divertimos assistindo outras pessoas viverem suas vidas enquanto nós ficamos atrás das telas. Entretanto, no universo de Não Esqueça, memória aprisiona e esquecimento liberta.
É por isso que aqui convivemos com relógios futuristas que podem armazenar suas memórias pessoais [as chamadas hórulas]. Lançamos mão de substâncias que reduzem atividade cerebral e ocasionalmente nos perdemos com seu uso [os chamados inibidores de emoção]. Para além disso, quando alguém que conhecemos morre, precisamos passar pela reintegração e zerar a lembrança de que aquela pessoa existiu e participou de nossas vidas, através da cirurgia de remoção de memórias [a reintegração].
Assista aqui ao trailer do “Não esqueça”.
Ser escritora no Brasil de ficção científica é passar por um legado de mulheres que começa a ser reconhecido hoje por trazer outras formas de pensar o futuro, sob as lentes da experiência de vivência de uma mulher no século XXI.
Entender como o ser humano vai usar a tecnologia é tão importante quanto entender as novas tendências. Se a ciência nos mostra o que está chegando de novidade palpável, os livros e filmes já antecipam possíveis questões éticas e políticas envolvendo o uso dessa mesma tecnologia. Nesse sentido, ser mulher escrevendo história é necessariamente passar essa discussão pela chave de certas violências estruturais já bem conhecidas por nós, que poderiam crescer exponencialmente com as armas certas nas mãos erradas.
“Torço para que a liberdade que senti neste percurso possa alcançar os olhos de quem percorrer esta narrativa também. Como dizia Valter Hugo Mãe ao tratar do poder da memória no processo de luto, não sei se isso vai ajudar alguém, mas é um esforço.” Carol Façanha
Conheça também outras autoras brasileiras: Ana Rüsche, autora de A Telepatia são os outros, da Monomito Editorial [finalista do Prêmio Jabuti de Romance de Entretenimento, do Prêmio Argos e vencedora do Prêmio Odisseia de Literatura Fantástica], Nikelen Witter, autora do steampunk Viajantes do Abismo da Editora Avec [finalista do Prêmio Jabuti de Romance de Entretenimento e Vencedora do Prêmio Odisseia de Literatura Fantástica] e Carol Chiovatto, autora de Porém Bruxa [vencedora do Prêmio de Literatura Odisseia Fantástica] e lançando a novela space opera Senciente Nível 5, ambos publicados pela Avec Editora.
IGs das autoras:
@nikelenwitter
@anarusche
@carolchiovatto
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