Por Giovani Falcão

Segundo uma pesquisa pré-pandemia; 47% dos homens e 32% das mulheres afirmam que não deixariam seus filhos meninos brincarem de boneca de jeito nenhum, porque boneca é brinquedo de menina. Os números apresentados pelo Instituto Avon/Locomotiva em 2016 são base de análise e compõem a recente pesquisa nacional “Pais em casa” realizada pela plataforma 4daddy, em parceria com as pesquisadoras de gênero Camila Pires (mestranda em Paternidades pela Universidade de Paris) e Tayná Leite (Mestranda em Sociologia na Universidade Federal do Paraná). Foi realizado durante o período de pandemia (maio – agosto de 2020) com casais heterossexuais, de classes A e B, em que apresenta no seu resultado uma possível mudança no comportamento social em família, e a conscientização da responsabilidade paterna.

“Via de regra, em nossa sociedade imersa numa cultura machista e lgbtfóbica, o maior medo dos pais que vêem seus garotos brincando de casinha ou de boneca é de que eles se tornem homossexuais” comenta Leandro Ziotto, fundador da plataforma 4Daddy. “São os adultos que esperam de meninos e meninas comportamentos específicos. Os pequenos não estão nem um pouco preocupados com as regras que definem papéis diferentes para eles ou elas. O que querem é se divertir!”, afirma.

Recentemente nas redes sociais a publicação de Laís Fernanda (33), mãe do Pietro (7) viralizou compartilhando sua alegria em finalmente: “ter a oportunidade de deixar seu filho entrar na loja e escolher um jogo, uma boneca e a tão sonhada fantasia de sereia”. Seu relato no Facebook já ultrapassa 193 mil curtidas com mais de 61 mil compartilhamentos. “Talvez você que está vendo essa publicação não concorde com a nossa decisão, mas sua opinião não me importa. O importante pra mim é o sorriso dele”, disse Laís no seu desabafo, encorajado de respostas positivas, e relatos emocionantes de pessoas que a respondem.

Voltando à pesquisa “Pais em casa”, a falta da referência paterna (seja por falecimento ou separação associada à ausência física) é apontada como um dos principais fatores percebidos para esse desenvolvimento social, que em sua maioria relata dessa experiência: “referências do que não fazer”. “A convivência com meu pai sempre foi praia, futebol e almoço. Na minha criação nunca falamos sobre orientação sexual ou liberdade de expressão, aprendi com a vida; mas quando ainda criança eu brincava de boneca com minha prima. E hoje, prestes a me tornar pai, meu filho não terá problema nenhum com isso”, diz Marlon Peixoto (25) que espera seu primeiro filho com Barbara Dias (24), agendado para daqui a dois dias (14/10).

O report ressalta que 71 % das famílias avaliam a pandemia e o isolamento como um momento de descobertas e conexões em família, nos quais 47% dos pais têm dividido mais as atividades educacionais dos filhos e 52% o cuidado e higiene das crianças, com suas parceiras. “Os principais obstáculos para o envolvimento dos homens nesse papel são: a forte cultura machista, a falta de referência de homens nesse lugar de aprender apenas a serem cuidados, sobrecarregando as mulheres fisicamente, mentalmente e emocionalmente desde a infância”, orienta Ziotto. “Então papai, mamãe ou qualquer adulto que tenha sob a sua responsabilidade o cuidado de uma criança, saiba que meninos que brincam de boneca podem virar: pais, médico, tio, professor, afetuoso, responsável. Brincar de boneca é exercitar o cuidado, que culturalmente atribuiu-se à mulher – não sendo um fator genético. E por fim podem virar uma pessoa heterossexual, homossexual, bissexual e até assexual. E está tudo bem!”, conclui.

A pesquisa completa está disponível gratuitamente no site: https://www.paisemcasa.4daddy.com.br/