Renda Cidadã: sacrificando a educação para a promoção da autoimagem de Bolsonaro
A fórmula de Paulo Guedes para a criação do Programa Renda Cidadã obedece ao receituário falido de um neoliberalismo capenga e obtuso, que apenas gera mais desigualdade e esmaga a qualidade de vida da classe trabalhadora.
Por Arnaldo de Castro / História Oral
A fórmula de Paulo Guedes para a criação do Programa Renda Cidadã obedece ao receituário falido de um neoliberalismo capenga e obtuso, que apenas gera mais desigualdade e esmaga a qualidade de vida da classe trabalhadora.
Indiscutivelmente, o Bolsa Família foi o mais amplo e efetivo programa de redução da pobreza e redistribuição de renda implementado no Brasil, não por acaso Luís Inácio Lula da Silva encerrou seu mandato com recorde de aprovação. Precisamente por isso um dos objetivos centrais da propaganda bolsonarista é acabar com o Bolsa Família. Se não é possível descontinuar o programa (pelo alto custo político eleitoral), Jair Bolsonaro busca ao menos que tal programa seja associado à sua imagem.
O grande impasse é: como usar a dimensão do Bolsa Família para a construção da autoimagem do neofascismo brasileiro sem construir resistência entre os interesses da elite econômica e sua lógica neoliberal arcaica e genocida?
Se existe déficit fiscal e o discurso da grande imprensa aliada ao bolosnarismo dá como receita a redução de gastos públicos e do próprio Estado, evidentemente o Bolsa Família se viu ameaçado. Desde o começo da desastrosa gestão Bolsonaro esse é ponto de conflito. Para contornar o problema, Paulo Guedes apresenta (novamente) a origem dos recursos para a ampliação do Bolsa Família 2.0, as verbas do Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB).
A manobra já foi rejeitada anteriormente pela Câmara dos Deputados e Senado Federal quando a equipe econômica apresentou o fracassado Renda Brasil. O Legislativo deu um recado claro, mas Paulo Guedes agora tenta a tática da “água mole, pedra dura, tanto bate até que fura”. Isso não é fruto somente da incompetência econômica neoliberal, mas também resultado da armadilha orçamentária imposta por Michel Temer em 2016 com a Emenda Constitucional 95 (uma das exigências da elite para a sustentação do golpe contra Dilma Rousseff), medida que contou com amplo apoio de Jair Bolsonaro quando ainda não passava de um medíocre deputado.
A EC 95 limitou os gastos públicos ao orçamento de 2016, corrigido apenas pela inflação. Advertida diversas vezes, a direita ignorou estudos, pareceres, recomendações, críticas e navegou sob as turbulentas águas do discurso de redução de gastos, que na prática tornariam o Brasil ingovernável e levaria o empobrecimento em massa da classe trabalhadora. Quando Guedes propõe o uso de recursos do FUNDEB para o Renda Cidadã, ele tenta uma perigosa manobra para furar o teto de gastos imposto pela EC95 (anteriormente por ele apoiada) sacrificando uma das pastas que mais precisa de investimentos para vislumbrarmos algum futuro melhor, a educação.
Os recursos do FUNDEB não estão limitados pela EC95, por isso Guedes tenta executar o orçamento para fins que ele não foi criado. Contudo, não se enganem, o legislativo em grande parte é contra essa destinação dos recursos, pois, tem consciência de que a implementação do Renda Cidadã não tem nenhum outro objetivo a não ser a construção da propaganda bolsonarista para tentativa de sua reeleição em 2022, e por que sacrificar um fundo que atende diretamente estados e municípios (o que beneficia eleitoralmente deputados e senadores) para a construção da auto imagem do governo? A EC95 não deixa brecha orçamentária para que o necropopulismo seja executado através do Renda Cidadã, além disso a diminuição da arrecadação, os amargos resultados de superávit, a pandemia da Covid-19 e a falência das medidas neoliberais em curtíssimo prazo deixa ainda mais distante a intenção do governo.
A saída para Guedes e Bolsonaro perpassa por um dilema que ambos não querem enfrentar caso decidam usar mais um programa petista para autopromoção: os recursos para o Renda Cidadã terão que vir do andar de cima. Um caminho seria diminuir a rentabilidade do sistema financeiro pago pelo contribuinte e aplicar dinheiro público onde sempre deveria estar, no Bem Estar do povo e não em pagamentos de juros abusivos em um distorcido sistema de concentração de renda, em que os mais pobres através de impostos (o principal deles incidente sobre o consumo) pagam o super enriquecimento de uma minoria riquíssima. Mas não apenas requisitar recursos do serviço da dívida será suficiente para a implementação do programa Renda Cidadã, podemos estar prestes a ver neoliberais lutarem pelo fim da EC95, pois estão entre a cruz e a espada (o orçamento e a reeleição).
De todo modo a situação é complexa, todas as tentativas de flexibilização do teto de gastos foram muito criticadas pela mídia hegemônica e os oligopólios econômicos. Enquanto perdura a insensatez e interesses particulares de pequenos núcleos políticos no interior das elites e facções criminosas, o povo se vê desamparado, vitimado pelo crescente desemprego e o desamparo completo do Estado, agora cada dia mais reduzido. Mais um tiro é dado contra a classe trabalhadora e Bolsonaro pretende sacrificar a educação básica, pilar do desenvolvimento em qualquer experiência no globo, para financiar a troca do nome de um programa de redução da pobreza criado por Lula e o PT.