Por Áurea Carolina

Vivemos também uma pandemia de horror. ⠀

Os assassinatos brutais do americano George Floyd, 46, e do nosso menino João Pedro, 14, pela violência policial nos Estados Unidos e no Brasil são flagrantes da desumanização de corpos negros, fruto de resquícios ainda vivos da escravização, bem como do racismo estrutural presente em muitos dos países que receberam africanos negros na diáspora forçada. Esse ódio é herança colonial!⠀

Floyd nasceu em Houston, no estado do Texas, mas se mudou para Minneapolis, no Minnesota, onde trabalhava como segurança em um restaurante. Foi abordado pela polícia local acusado de tentar pagar uma compra com uma cédula falsa de US$ 20. No registro em vídeo, feito por Darnella Frazier, é possível testemunhar que seu algoz, o policial Derek Chauvin, conduziu a abordagem de forma extremamente violenta, enquanto o colega de patrulha tentou obstruir a visão de quem passava pelo local.⠀

“I can’t breathe” (não consigo respirar) foram as últimas palavras de George ao ser sufocado até a morte por Chauvin, que em 19 anos de serviço policial foi denunciado 20 vezes por abordagens violentas, em sua maioria contra pessoas não brancas. Há três dias, a cidade de Minneapolis tem sido palco de protestos e confrontos contra a polícia, em revolta pelo assassinato de GeoRge Floyd.⠀

O menino João Pedro é mais uma vítima do Estado brasileiro – nossa ferida aberta que sangra diariamente. Foi morto dentro de casa, com um tiro nas costas, durante operação policial no morro do Salgueiro, em São Gonçalo, no Rio de Janeiro. Ações policiais no período das medidas de isolamento para conter o espalhamento do coronavírus têm sido denunciadas por ativistas, pois provocam aglomerações e aumentam o risco de contaminação pela covid-19 nas comunidades periféricas. Mas a política genocida em curso não se importa, se alimenta de mortes.⠀

No Brasil, além de toda a atuação histórica do Movimento Negro Brasileiro para que o Estado se comprometa a cessar o extermínio de jovens negros, na última quarta-feira, 27/5, mais de 800 entidades da sociedade civil se uniram num ato virtual, organizado pela Coalizão Negra por Direitos, denunciando a violência contra nossos corpos e exigindo justiça para todas as nossas vítimas.⠀

Pela crueza dos acontecimentos, percebo que não é o momento para comparações vazias entre os formatos de luta, que se elaboram a partir das construções para a emancipação da população negra nesses dois países. São ações distintas, uma não é mais importante ou eficaz do que a outra para o enfrentamento ao racismo, pela igualdade racial e o fim da violência do Estado contra a população negra que vive em regiões periféricas.⠀

É necessário ter em mente que as manifestações americanas nos servem de exemplo pela capacidade de reunir diversas lutas, de pessoas brancas e não negras, contra a violência policial e o modelo de segurança pública repressivo que não dá conta de reduzir a criminalidade, aumenta brutalmente a população carcerária e ainda deixa um rastro de vítimas mortas e famílias destruídas, majoritariamente, pretas e pobres.⠀

O racismo é um problema estrutural, que atinge principalmente a população negra, mas impõe prejuízos a toda a sociedade. Acredito que é chegada a hora das pessoas não negras brasileiras se somarem verdadeiramente à luta antirracista e ajudarem a reverberar o pensamento das nossas intelectuais negras que vieram antes, já apontando os caminhos para a igualdade.⠀

Nosso país está tomado por ideais autoritários, que aprofundaram os preconceitos e as desigualdades raciais. Lutar pela democracia e contra o fascismo é também se somar à luta de 56% da população para salvar as vidas negras.⠀

Contra o racismo e o genocídio, todas as vozes importam!

Áurea Carolina é mineira, cientista política, educadora popular e ativista de movimentos feministas, negros, juvenis. Foi vereadora em Belo Horizonte (MG) pelas Muitas/PSOL e hoje é deputada federal.

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