Como as ocupações urbanas de BH estão enfrentando o coronavírus? Onde está o Poder Público?
Confira a entrevista com lideranças de ocupações urbanas de Belo Horizonte para saber como estão lidando com a pandemia do coronavírus.
Por Gabriel Lopo, militante da Unidade Popular e do Fórum das Juventudes da Grande BH
Belo Horizonte é uma cidade com muitas ocupações urbanas. Nelas, moram em milhares de famílias trabalhadoras e pobres. A maioria das famílias lideradas por mulheres negras, mães solo, que enfrentam todos os dias as mazelas do sistema. A falta de acesso a direitos básicos já é uma realidade cruel e agora, com a situação do coronavírus, as ocupações urbanas enfrentam mais um grave e arriscado problema!
Entrevistei lideranças do Movimento de Luta nos Bairros Vilas e Favelas (MLB) e que atuam em diferentes ocupações urbanas lembrando que é urgente dar visibilidade à situação de falta de acesso a direitos básicos dos moradores de ocupação. Além disso, cobrar que o Poder Público tome mais ações de amparo e proteção as pessoas pobres e trabalhadoras.
Nenhum caso de Coronavírus nas Ocupações com MLB e o Poder Público ficará omisso! As ruas seguem sem asfalto e as pessoas têm que sair para trabalhar na Ocupação Eliana Silva e Paulo Freire no Barreiro.
Poliana Souza, coordenadora nacional do MLB e militante do partido Unidade Popular mora na Ocupação Eliana Silva, que fica na região do Barreiro em BH. Segundo ela não foi registrado nenhum caso do vírus. Porém, existem suspeitas e muitas pessoas que fazem parte dos grupos de risco.
A atitude dos moradores vai do oito a oitenta. Por um lado, há quem acredita 100% nos grandes veículos de comunicação. Muitas pessoas têm acesso à informação e não sabem o que fazer com ela. Já outras pessoas estão desconsiderando o que está acontecendo e acreditando que essa é uma situação “só de gente rica que viajou para o exterior”. “Não tem atuação do Poder Publico, a não se de forma precária no posto de saúde”. O Poder Publico não visitou as ocupações e não distribuiu kits de saúde. As pessoas não higienizam as mãos, a Ocupação Paulo Freire, que fica ao lado da Ocupação Eliana Silva, no Barreiro está sem água desde o último dia 20 de março.
“As famílias não estão em quarentena”. Só uma parte das famílias estão em recolhimento porque a grande maioria ainda tem que sair para trabalhar em situação informal, como domésticas, pedreiros, vendedores e serviços sem amparo ou com pouco amparo para direitos. Isso é extremamente cruel e desumano!
“Isso é extremamente cruel e desumano!”, Poliana Souza, Ocupação Eliana Silva.
Na Ocupação Carolina Maria de Jesus, que é um prédio no Centro de BH, a preocupação do MLB é maior.
Edinho é cineasta e coordenador do MLB e mora na Ocupação Carolina Maria de Jesus. Segundo ele, a preocupação do movimento é maior por ser um prédio. O ambiente é fechado, a ventilação é menor, o contato das pessoas é maior. Como o prédio não tem elevador todas as pessoas passam pela mesma escada.
As medidas estão sendo tomadas como uma planilha de dados sobre moradores para levantamento das pessoas em grupo de risco. Além disso, foram canceladas atividades coletivas como assembleias e reuniões por andar, aula de teatro, aula de Muay-tai. Os espaços coletivos como cozinha, auditório e creche e estão suspensos por enquanto. O MLB está orientado as pessoas a não ficarem pelos corredores.
A Ocupação Carolina é marcada pela forte presença de jovens e crianças. Por mais que o coronavírus não cause grandes problemas para os jovens, o principal problema é a transmissão do vírus. Por isso, o MLB está fazendo uma campanha de comunicação com vídeos, cards, áudios direcionados para as famílias e também para jovens e crianças. A conscientização é a principal estratégia do movimento nas ocupações.
“A conscientização é a principal estratégia do movimento nas ocupações.” Edinho, Ocupação Carolina Maria de Jesus.
Na Ocupação Esperança, que fica no conjunto de ocupações da Izidora, em Belo Horizonte na divisa com o município de Santa Luzia, o povo está desesperado, sofrendo e pagando a conta!
Edna Souza, liderança da Ocupação Esperança, militante do MLB e da UP denuncia que o povo está desesperado e pagando essa conta. A burguesia está vivendo bem com saúde paga e o povo pobre está desesperado, sem alternativa, sendo assassinado pelo abandono e pelo vírus!
Muitas pessoas da Esperança têm trabalhos informais, são domesticas, catadores de recicláveis e não sabem o que fazer. A saúde das ocupações já é precária. O povo não tem acesso a álcool em gel, o povo não tem acesso à máscara. Álcool em gel está caro: “qual pobre consegue um álcool em gel? Qual pobre consegue uma máscara?”. Coisas que deveriam ser produzidas e com preços reduzidos pelo governo ficaram totalmente inacessíveis. “Como é esse negócio do pobre ficar confinado dentro de uma casa? Sabendo que muitas vezes a pessoa vive em dois cômodos com uma família grande?”. Edna questiona como que é possível pensar um confinamento com essa situação. O Poder Público não olha para essas famílias. O que se vê hoje é o gargalo: a burguesia, onde quem tem muito fica bem e quem é pobre sofre!
“O leite das crianças está no preço de um ouro, a comida está cara”, Edna denuncia. O vírus está atacando os pobres, porque os ricos têm comida, máscara, álcool em gel e uma saúde paga. Edna denuncia que quem morreu até então foi uma “Doméstica, um faxineiro e um Porteiro” que são trabalhadores!
“Qual pobre consegue um álcool em gel? Qual pobre consegue uma máscara?”, Edna Souza, Ocupação Esperança – Izidora.
Irresponsabilidade do Bolsonaro e Governos! Organizar o povo pobre e trabalhador para lutar por saúde!
Poliana reforça que o Governo Bolsonaro é extremamente irresponsável quando vai à mídia dizer que é uma gripinha a infecção com o coronavírus. Ao minimizar a situação crítica, Bolsonaro joga contra o direito à saúde da maioria do povo pobre e trabalhador no Brasil. Além disso, o Governador Romeu Zema demorou muito para apresentar medidas. Sem contar o prefeito Alexandre Kalil, que reduziu a frota de ônibus em BH causando o super-lotação das linhas. A falta de trocadores expõe ainda mais os motoristas que tem que manipular dinheiro de muitas pessoas em uma única viagem.
Tanto Poliana quanto Edinho e Edna reforçam que os trabalhadores não estão podendo se proteger. Vários patrões pensando apenas nos lucros não estão liberando os trabalhadores. Existe uma parte que está sendo demitida com essa situação. Outra parte está trabalhando em locais sem a devida proteção. E somado a isso, existe uma grande parcela de trabalhadores informais que estão expostos. As medidas do poder publico não dão conta dessa situação porque não enfrentam as grandes empresas privadas.
O caminho é a luta! Como em vários lugares do país, trabalhadores têm se organizado em greve e paralisação para cobrar que as empresas reforcem a segurança no ambiente do trabalho. Que as empresas privadas sejam responsáveis com a saúde publica e coletiva. A vida deve estar acima do lucro nesse momento e somente a luta pode garantir essas conquistas que parecem pequenas mas são fundamentais no combate ao coronavírus.