O desmate (e o boi) avançam. Dados apontam nova fronteira do desmatamento no Acre
Após ficar concentrado nos últimos 40 anos mais na porção leste do Acre, o desmatamento agora avança sobre as áreas de floresta que ficaram quase intocáveis desde a intensificação da entrada da pecuária na região, processo este iniciado durante a ditadura militar brasileira (1964-1985).
Por Fábio Pontes
Após ficar concentrado nos últimos 40 anos mais na porção leste do Acre, o desmatamento agora avança sobre as áreas de floresta que ficaram quase intocáveis desde a intensificação da entrada da pecuária na região, processo este iniciado durante a ditadura militar brasileira (1964-1985).
Essa nova fronteira do desmatamento no Acre – observada nos últimos três anos – coloca em risco a preservação de unidades de conservação e, sobretudo, as terras indígenas.
Atualmente, o Acre ainda mantém preservada 87% de sua cobertura florestal original, estando grande parte dela concentrada nos municípios que lideram o ranking de desmatamento e queimadas de 2016 para cá. Ambos os dados são do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Um dos casos que chamam a atenção é o do município de Feijó, banhado pelo rio Envira. Em 2018, Feijó foi o campeão do desmatamento no Acre, com 77 km2 de floresta derrubada. Em agosto deste ano, também foi o líder em incêndios: 685 focos, segundo o Programa Queimadas do Inpe.
Feijó é um dos municípios com a maior concentração de terras indígenas demarcadas do Acre, incluindo a Kampa e Isolados do rio Envira. Localizada na fronteira com o Peru, ela abriga os índios isolados cujas imagens de um recente contato com os Ashaninka ganharam o mundo.
Vizinho a Feijó, Tarauacá é outro município com expressivas áreas de floresta intacta, e que também tem sofrido com o desmate e o fogo. Nos 31 dias de agosto, registrou 443 focos de queimada. Em 2018, o desmatamento ficou em 42 km2, o terceiro maior do Acre.
Uma das áreas mais atingidas está às margens do rio Gregório, no entorno da Terra Indígena do Rio Gregório, que abriga o povo Yawanawá. Ao se navegar pelo manancial durante a segunda metade de agosto, foi possível observar grandes áreas desmatadas e queimadas antes de se chegar ao território Yawanawá.
Dono de uma extensa porção de floresta preservada e rica em madeira nobre, Sena Madureira teve desmatamento de 52 km2 em 2018, com 349 registros de fogo em agosto de 2019. O terceiro lugar em desmate ficou com Manoel Urbano (47 km2), banhado pelo rio Purus. No último mês, registrou 281 focos de incêndios florestais.
Manoel Urbano, Feijó e Tarauacá são municípios que há até bem pouco tempo ficavam praticamente isolados da capital Rio Branco durante os seis meses de chuva na região. Com a pavimentação da BR-364 – mesmo que hoje com parte de seu trecho em péssimas condições – os três municípios saíram do isolamento, e com a rodovia também ocasionando impactos ambientais.
Os dados atestam o estudo feito pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) mostrando uma estreita relação entre aumento do desmatamento com o uso do fogo na Amazônia, sendo o Acre um dos principais exemplos disso.
Essa nova fronteira do desmatamento ocorre no momento que o atual governo acreano faz do agronegócio sua principal política econômica, enfraquecendo as diretrizes ambientais do estado.
Antes concentrada na região da bacia do rio Acre – conhecida como Alto e Baixo Acre – a pecuária vai ampliando suas fronteiras no estado – não importando a distância ou o grau de dificuldade para se abrir novas pastagens.