Na noite de 3 de fevereiro de 2017, um pequeno grupo de pessoas faziam uma campana no Porto de Santos. Espreitando o vai e vem de embarcações, aguardavam um barco de nove esquisito: NADA.

O NADA, em si, não tem mesmo nada de especial. É a missão do NADA que, literalmente, carrega todo o problema. O NADA aportou nessa noite de verão para carregar em si 25,6 mil bois vivos, sim vivos, até a longínqua Turquia. O NADA pertence à maior empresa de venda de boi vivo do mundo, a Minerva Foods.

Quando finalmente o monstro azul e branco estacionou no porto, e os caminhões em que se encontravam a mercadoria deram partida, o grupo entrou em ação. Com cartazes e faixas pularam na frente dos caminhões, interrompendo a operação.

Foto: Mini Veg

O que encontraram nos caminhões e no navio? Locais completamente abarrotados de animais, sem qualquer estrutura, sujos a caminhar em seus próprios excrementos. Aqueles que morrem pela falta de alimentação são triturados no caminho e os que sobrevivem podem ter um destino ainda pior.

Sob esse cenário, a justiça em decisão liminar aceitou a ação civil pública do Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, e proibiu a exportação de gado vivo em todo o território nacional, e a devolução dos 25,6 mil gados aos seus locais de origem.

A vitória inédita para o movimento de proteção aos direitos dos animais ainda foi confirmada em segunda instância. No entanto, a decisão foi revertida pela desembargadora Cecília Maria Piedra Marcondes. Na sentença, Marcondes aceita o argumento da Advocacia Geral da União (AGU) sobre o impacto financeiro que a medida terá na economia, capaz até de aumentar a crise.

“O mercado de animais vivos jamais movimenta valores de US$ 170 milhões por ano. Cuida-se de valor significativo, que jamais poderia ser desprezado. Numa época crítica como a atual, com escassez de recursos, abrir mão de tamanha quantia beiraria o escárnio e agravaria ainda mais a crise econômica”, apontou a juíza em sua sentença.

Em entrevista, o Ministro da Agricultura Blairo Maggi ressaltou que o Brasil é o maior exportador do mundo de gado vivo, e somente no ano passado vendeu mais de 600 mil bois para fora do país. Quem mais ganhou com esse mercado? A Minerva, dona dos 25,6 mil bois comprimidos no NADA.

Pecuarista, o deputado federal Beto Mansur (PRB-SP), gravou um vídeo em sua rede social a fim de desmentir as denúncias de maus tratos registrados no NADA. Em um andar previamente limpo, ele caminhou com profissionais da imprensa, enquanto mostrava para o cameraman a bela estrutura do navio.

Mercado

O principal mercado de gado vivo são os países islâmicos. Nessas culturas, o corte de carne segue rígidas condutos ligadas aos costumes religiosos, que é regulado através do certificado halal. Entre as regras, é exigido que o abatedor seja muçulmano, pronuncie o nome allah no momento do abate e faça todo o procedimento voltado para Meca.

Muitas empresas brasileiras possuem certificado halal, porém devido à estrutura de transporte ou mesmo de conservação de diversos países, a venda de carne halal no Brasil vem crescendo ano a ano. Somente em 2017, o comércio entre o Brasil e as 22 nações da Liga Árabe aumentou 16%, com destaque para a venda de carne e frango.