Jean Wyllys: Quem é realmente rico?
Defender o direito de todo trabalhador (inclusive os servidores federais com salários melhores) a um reajuste acima da inflação não é defender rico!
Essa semana, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, concedeu uma liminar solicitada pelo PSOL contra uma medida provisória do governo golpista, que adiava o reajuste dos salários dos servidores públicos federais e aumentava sua contribuição à previdência. O caso deverá agora ser analisado pelo plenário do Supremo.
Esta importante vitória do PSOL contra a decisão de Temer, que quer prejudicar os trabalhadores do setor público, ao mesmo tempo que concede uma isenção fiscal de mais de 1 trilhão de reais às empresas petrolíferas estrangeiras, foi atacada rapidamente num conhecido jornal paulistano por um colunista de ultradireita que adora falar mal do nosso partido. De acordo com o colunista, o PSOL “defende os ricos”, já que, ele diz, 7 de cada 10 servidores públicos federais estão entre os 10% mais ricos da população. Haja deturpação da realidade!
O colunista parte de um dado estatístico real, mas distorce seu significado no contexto mais amplo da economia brasileira e, sobretudo, dos dados sobre a distribuição da renda. Acontece que o Brasil é um país tão injusto, tão desigual (0,525 no índice Gini) e com tanta pobreza que um salário de 3.800 reais basta para, estatisticamente, fazer parte dos 10% mais ricos da população. Afinal, segundo os últimos dados do PNAD, publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 44,4 milhões de brasileiros vivem com uma renda média de 747 reais por mês. Esse valor representa 36,6 vezes menos que a renda média dos 1% mais ricos, que é de 27.085 reais.
Ora, isso significa que aqueles que recebem 27 mil reais por mês são, de fato, “os mais ricos”? Essa quantia pode parecer uma fortuna para a imensa maioria do povo brasileiro, mas não representa a verdadeira riqueza. Muito menos um ingresso de 4 mil reais, que é o menor rendimento dos “8% mais ricos” na estatística citada de forma muito simplificada e enviesada pelo colunista.
De fato, segundo o DIESSE, que elaborara mensalmente o índice, o mínimo de que uma família precisa para custear suas necessidades básicas é 3.899,66 reais por mês. Sim, o mínimo, que a maioria da população não recebe! Ou seja, quem ganha isso não é “rico”, mesmo que sua situação seja muito melhor que a da maioria num país extremamente injusto. É apenas alguém que tem o mínimo para garantir a subsistência de sua família!
Por outro lado, quando se fala em “média” salarial, estamos na verdade falando de uma realidade muito diversa: a média entre 10 e 2 é 6, mas há muita diferença entre receber 10 ou receber 2. Entre os servidores públicos federais, temos o funcionário concursado do Judiciário que recebe mais de 17 mil reais, mas também o professor do ensino médio que recebe menos de 3 mil. O salário “médio” é um cálculo matemático que não explica a realidade diversa de cada um desses servidores. E nenhum deles é verdadeiramente “rico”.
Os ricos geralmente não têm salário, muito menos salário público. Sua renda vem de outras fontes e têm benefícios que nenhum servidor público poderia ter. Não pagam imposto de renda, nem o IPVA por seus jatinhos e iates, lucram milhões na bolsa e têm parte da sua fortuna em paraísos fiscais. Não precisam de ADI para ganhar um reajuste.
Defender o direito de todo trabalhador (inclusive os servidores federais com salários melhores) a um reajuste acima da inflação não é defender rico!
Pena que o colunista, que toma o exemplo dessa ADI do PSOL para tergiversar, não tenha lido nossos projetos para mudar o índice de atualização do salário mínimo e revogar a reforma trabalhista de Temer. Pena que ele não comente a atuação do PSOL em apoio às mais diversas categorias, nosso trabalho junto aos sem terra e aos sem teto e nosso compromisso programático com uma mudança radical do sistema econômico.
Mudança, essa sim, que deverá afetar os interesses dos verdadeiros “mais ricos”, para que as maiorias exploradas possam um dia viver melhor, num país mais justo.