O Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado no final de 2022, mostra que, no ano de 2021, 1.341 mulheres foram vítimas de feminicídio no Brasil, sendo que a grande maioria das vítimas, 68,7%, estavam em seu momento mais produtivo, entre 18 e 44 anos, no auge da sua vida profissional. Além disso, 65,6% morreram dentro de suas casas e, em 81,7% dos casos, os autores do crime foram o companheiro ou o ex-companheiro. Outro dado alarmante é que 62% das mulheres que perderam a vida por feminicídio eram negras.

Números expostos dessa barbárie social, vamos a outro dado que revela mais uma face cruel do feminicídio: onde estão e como vivem os filhos dessas mães assassinadas pelas mãos do machismo, incrustado na sociedade?

Considerando que cada mulher que perdeu a vida tenha apenas um filho, são outras 1.341 vidas que foram devastadas diretamente, sem contar familiares, irmãos, mães, pais e outros entes.

Além disso, precisamos pensar nos números como um termômetro dos “órfãos de pais vivos”. Em mais de 80% dos assassinatos, o companheiro ou ex-companheiro é o algoz, fazendo com que as crianças ou adolescentes percam a mãe, pela morte em si, e o pai ou padrasto pelas mãos da justiça. Este cenário é visto por especialistas como desolador para esses jovens que veem o pai se tornar um assassino da mãe, que não verão mais.

Esses jovens passam a viver com tios, avós, primos que, mesmo sendo um seio familiar, não é o ambiente em que eles estavam habituados e, ainda mais, a neuropsicóloga e especialista em desenvolvimento infantil e intervenção precoce Janaína Lobo, em entrevista à jornalista Fernanda Nascimento, do Sul21, reforça que o feminicídio não é um trauma superável. Ela afirma ainda que é uma situação administrável, e que a sociedade pode ensinar a esse indivíduo, através da psicoterapia e da reconfiguração de um novo lar, a lidar com aquilo que aconteceu. Mas o trauma será carregado por esse indivíduo o resto da vida, será uma pessoa com uma marca emocional muito traumática.

É preciso olhar para esses “filhos da mãe” que não terão mais contatos com elas e que também, provavelmente, não terão pais presentes.