As vozes do Sul estão povoando os pavilhões e salões da Conferência sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas. Cada preta, quilombola, afrolatina, africana e indígena que escuto faz o chão tremer nos pés de alguns e causa estranheza no olhar de outros. Mas cada palavra que ecoa delas é repleta de potência. Elas não falam só por elas. O som é encorpado das lutas das que vieram antes e tem mira certa no futuro das que virão depois. Essa potência se vê na COP26.

Dentro dos salões e mesas de negociação política e acordos mundiais a voz que pesa é a das lideranças brancas, ricas, envelhecidas na ganância colonial. No clubinho deles, tem muita purpurina pra pouco carnaval. Sim, porque carnaval é identidade cultural e conexão responsável com o tempo histórico e as pessoas. Lá, eles se vangloriam de um poder mofado, fadado ao fracasso do mundo às custas das nossas vidas.

Semana passada, uma mulher negra teve os 8 minutos mais fundamentais da COP até agora. A Primeira Ministra de Barbados, Mia Mottley, vestida de branco, com seu black solto e argolas prateadas, parecia segurar a espada de Xangô ao colocar o dedo na ferida do dizer que “o fracasso em fornecer financiamento crítico suficiente para pequenas nações insulares é medido em vidas e meios de subsistência em nossas comunidades. Isso é imoral e é injusto”. Nós, do lado de fora, escutamos isso como um abraço de luta antirracista.

A COP em Glasgow precisa cumprir a promessa do Acordo de Paris fechando lacunas. Mas o que vemos até agora é covardia e desconexão com a história dos nossos povos. Não há liderança. Há ganância. 

Neste salve-se quem puder, ontem, outro preto subiu à tribuna e soltou o verbo por 1h. O ex-presidente dos EUA, Barack Obama, de forma descontraída e firme, disse em alto e bom tom o que estamos gritando há tempos: reduzir as emissões de gases de efeito estufa não é suficiente, é preciso ter coragem para erradicar as injustiças sociais, reconhecendo as emergências que o próprio desenvolvimento gerou. Talvez Obama fique frustrado com o resultado da COP26 na próxima sexta-feira 12, pois o chamado para que as lideranças assumam a responsabilidade histórica não está reverberando muito nas mesas de negociação.

 Hoje, terça-feira 9, teremos mais um dia de denúncias, promessas e propostas. As poucas que conseguimos estar porque contamos com a cooperação e solidariedade vamos pesar a luta por justiça onde nosso pé pisar. A decisão precisa ser radical, porque vem da raiz. Desmatamento zero, fome zero, desemprego zero, violência zero. É tudo pra ontem porque nós, mulheres do Sul e do front das lutas territoriais,  aqui em Glasgow, estamos continuando a história da nossa ancestralidade e abrindo caminho para que as nossas verdadeiras lideranças ocupem esses espaços muito em breve.

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