Vamos aos fatos. Na manhã dessa quinta-feira, 07 de novembro de 2019, o jornalista Glenn Greenwald, editor do site The Intercept Brasil foi aos estúdios da Rádio Jovem Pan, em São Paulo para participar do programa Pânico.

Ao chegar lá, ele descobre que o outro entrevistado é o jornalista Augusto Nunes, que no início de setembro havia atacado a sua família. Na ocasião, Nunes disse que: um juiz de menores deveria investigar quem é que cuida dos filhos dele e do deputado David Miranda.

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De forma educada e corajosa, Glenn aproveita o encontro com Nunes para dizer, ao vivo, que considerou o ataque contra sua família algo covarde, que nunca na sua vida como jornalista foi alvo de uma atitude tão feia, principalmente vinda de outro jornalista. Augusto Nunes ouve e parte novamente para o ataque e finalmente para a agressão. Claro, ao ser agredido, Glenn levanta e se defende. Então uma pessoa da equipe afasta Nunes de Glenn. Basta assistir ao vídeo, o relato — sempre um relato já que eu escolhi as palavras e os lances do acontecimento para resumir o que ocorreu — é mais ou menos esse.

Que manchete um jornalista daria para essa notícia? Não dá para dizer que há uma única manchete possível, mas há algumas mais evidentes. Glenn é agredido por Augusto Nunes em entrevista. Ou Augusto Nunes agride Glenn durante entrevista.

Mas não foi exatamente assim que Folha e Estadão fizeram.

Chamada de Capa do site do Estadão – Augusto Nunes e Gleenwald brigam em programa ao vivo.

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Folha no Twitter – Jornalistas Augusto Nunes e Glenn Greewald trocam socos em programa.

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Como uma agência de checagem de fatos etiquetaria essas manchetes?

Vamos usar as classificações de duas agências de checagem – Lupa e Aos Fatos. As etiquetas da Lupa são: verdadeiro, verdadeiro mas, ainda é cedo para dizer, exagerado, contraditório, subestimado, insustentável, falso. Já, a Aos Fatos trabalha com as seguintes classificações: verdadeiro, impreciso, exagerado, contraditório, insustentável e falso.

Já falamos aqui nessa coluna que é muito difícil dizer o que é verdade, na perspectiva filosófica. Mas uma verdade factual, a descrição de um acontecimento, pode e deve ser o mais fiel possível ao fato.

A manchete do Estadão talvez possa ser classificada em algum lugar entre insustentável ou falso. Não é de forma nenhuma verdade, nem verdade mas, (gente o que é isso mesmo?), cedo para dizer nem se fale e não é contraditório nem subestimado. Na tarjeta da Aos Fatos talvez coubesse também o impreciso…. talvez.

Já, a manchete da Folha, na melhor das hipóteses é insustentável. Ela é falsa, porque eles não trocaram socos.

Mas eu queria mesmo é criar uma nova tarjeta de checagem: As duas manchetes são INDECENTES!

Elas escancaram como essas empresas não têm respeito com a informação, nem com os personagens da notícia – neste caso o jornalista Glenn Greenwald – nem com o leitor.

E eis que o tal do “jornalismo profissional” se mostra como verdadeiramente é: um jornalismo sem respeito à objetividade ao relatar um fato, que deveria ser a meta de toda notícia. Não, não neutro ou imparcial, porque isso, sabemos muito bem, é história da carochinha criada pela mídia hegemônica para vender jornal/audiência e para manipular a opinião pública.

Vale dizer, para ser precisa e fiel aos fatos, que ao clicar nas chamadas de capa e twitter e ir para a notícia, encontramos títulos diferentes e uma notícia mais condizente aos fatos. No entanto, essa situação não muda o contexto. A busca do clique, a espetacularização do jornalismo sensacionalista, a escolha dos termos, constrói uma narrativa social. Principalmente num contexto no qual a maioria das pessoas não clica para ler a notícia. Repassa o twitte sem entrar no conteúdo, faz um print-screen e joga no Instagram ou manda para o grupo de WhatsApp. Sem contexto, sem relato, só as manchetes indecentes.

Essas manchetes alimentam a máquina de disseminação de ódio e preconceito, a milícia digital bolsonarista, que se ancora neste tipo de manchete irresponsável para espalhar as tais fake news.

Toda solidariedade ao jornalista Glenn Greenwald pela agressão covarde sofrida. Todo respeito pelo excelente trabalho jornalístico que tem realizado. Todo repúdio ao programa Pânico e ao agressor Augusto Nunes!