Foto: Victor Ostetti

A vereadora Edna Sampaio (PT) vem sendo acusada injustamente pela imprensa tradicional de Mato Grosso, e por colegas da Câmara Municipal de Cuiabá, de uso indevido de verba indenizatória. Edna, que é conhecida por atuar em defesa dos direitos humanos, das mulheres e contra o racismo, agora tenta se defender das acusações ao tempo em que é vítima de ataques à honra e difamação. Ela tem recebido apoio público de outros colegas e também, nas redes sociais.

“Estou sendo acusada de fazer ‘rachadinha’ por ter movimentado o recurso na conta para executar as despesas. Mas não é sobre verba indenizatória, não é sobre verdade, é sobre mentira. É sobre uma política extremamente conservadora, num estado que elegeu Bolsonaro com 65% dos votos, não permitir que nós, da classe trabalhadora, ocupemos um espaço legítimo, eleito pelo voto popular, eleito sem distribuir cesta básica, sem dar dinheiro, enganar, nem mentir para ninguém”, disse a vereadora.

A vereadora contestou também a informação de que estaria havendo uma investigação do Ministério Público Estadual sobre o caso, destacando que apresentou uma certidão negativa do órgão. Nega também que a denúncia tenha partido de sua própria ex-chefe de gabinete, informando que sua equipe fez contato com a ex-servidora, e que a mesma negou que tenha enviado ao site ou ao MP, prints de conversa e áudios. Ambas acusações foram feitas por um jornal local e vêm sendo refutadas pela vereadora.

Em vídeo divulgado na internet, a ex-chefe de gabinete Laura Abreu, negou as acusações feitas pelas reportagens e disse ainda que não denunciou a vereadora como os sites vinham afirmando: “Eu não participo de esquema de rachadinha, nunca devolvi meu salário para Edna. Eu não tenho nada contra Edna. Não fui eu que expus esses prints, o áudio para a imprensa, não fui eu”.

Em entrevista para a Mídia NINJA, Edna se diz abalada com a decisão do juiz que não aceitou suas acusações de fake news contra o jornal que constantemente a acusa de forma irresponsável. “Eu fiquei muito abalada, muito triste porque não se trata de direito à liberdade de imprensa, informação, nada disso, se trata de uma fake news.”

Prestação de contas

No dia 11 de maio Edna chegou a apresentar demonstrativo das despesas do seu mandato em sessão na Câmara. Ela enfatiza que essa foi a primeira vez que um vereador fez isso. Ela destaca que por exigência legal a prestação de contas das verbas indenizatórias são realizadas através de relatórios de atividades, sem a apresentação detalhada dos gastos.

 A vereadora Edna Sampaio afirmou que espera o fim deste episódio que se revelou uma tentativa de parte da mídia e adversários políticos, de cercear o seu mandato e sua atuação enquanto vereadora, pois afinal, foi instaurado um processo na Comissão de Ética e Decoro Parlamentar para investigá-la. 

“Quando você é uma mulher, e uma mulher negra, que esta pessoa não corresponde a nenhum desses estereótipos que a sociedade coloca como certo, natural. É isto que incomoda os poderosos. Sobretudo, dentro de um processo bem desgastado que é a legitimidade dos políticos Assim, é fácil acusar uma vereadora com fake news rasteiras, aliás, gigantesca, a pior que eu vivi até agora”. 

 Violência de gênero

Além dos ataques da imprensa, a vereadora também vem sofrendo ataques dentro do seu local de trabalho. A Polícia abriu um inquérito contra o vereador Dilemário Alencar (Podemos) pela suspeita de crime de violência política contra a mulher. A decisão foi baseada na notícia-crime protocolada em março pela vereadora Edna Sampaio (PT) junto à Superintendência Regional da Polícia Federal em Mato Grosso na qual ela denuncia que o vereador reiteradamente tem tentado, por meio de calúnias, desconstruir sua imagem como mulher e defensora dos direitos humanos e das mulheres. O caso está sob responsabilidade do Delegado Célio Henrique Souza dos Santos.

A vereadora cita como exemplo o pronunciamento feito pelo vereador no mês de fevereiro, onde ele utilizou seu tempo integral na Câmara para comentar notícias falsas sobre a exoneração da ex-chefe de gabinete da vereadora. Ela afirma ainda que na ocasião ele utilizou linguagem ofensiva para tentar imputar a ela uma possível rixa com sua ex-funcionária. “Ele é uma pessoa que quer representar o Bolsonaro aqui e ele avalia que sai ganhando quando ataca uma petista”, afirma Edna.

A violência política não é algo inédito na trajetória de parlamentares democraticamente eleitas. De acordo com um levantamento realizado pela Terra de Direitos e Justiça Global, a violência política de gênero acontece em maior parte pelos oponentes ou colegas das mulheres por meio de ameaças massivas virtuais. A violência política de gênero acontece, na maioria dos casos, não em forma de agressão física, mas em ameaças, intimidação psicológica, humilhações e ofensas.

Racismo aprofunda crise

Ainda segundo o mesmo levantamento, a violência política pode ser definida como: “Atos físicos, de intimidação psicológica e/ou discriminatórios, agressões, disseminação de discursos de ódio e conteúdo ofensivo contra grupos historicamente discriminados, em especial pessoas eleitas, candidatas, pré-candidatas ou designadas para exercer papel de representação pública e/ou política, com o objetivo de suspender, interromper, restringir, ou desestabilizar seu exercício livre e pleno de representação e participação política”.

A vereadora conta que se sente impedida de cumprir o seu trabalho enquanto vereadora, já que mesmo depois dela ter aberto publicamente todas as contas que possui, as acusações continuam e vão se agravando. “Eu parei de ver as notícias, não é fácil ver toda a imprensa te chamando de corrupta. De repente eu passei a ser a vereadora da rachadinha, eu tive que parar as atividades do mandato”. A vereadora conta que sua família também vêm sofrendo com isso, e que ela se sente responsável em cuidar da saúde mental das pessoas que a cercam, que também sofrem com a situação

“É uma violência política, é óbvio que visa interromper minhas atividades, me constranger (…) desestabiliza o exercício do meu mandato.”

Para Edna, além da violência de gênero há também a questão da raça e das ideologias que ela defende. Um exemplo disso é o caso da vereadora Marielle Franco, uma mulher negra que também defendia os direitos humanos assim como Edna, e que acabou sendo assassinada sem ter ainda o mandante de seu crime revelado ou punido até hoje, quatro anos depois do crime que tirou sua vida e a de seu motorista Anderson Gomes.

A violência política é um dos principais obstáculos para a participação de pessoas negras na política, indica pesquisa realizada pelo Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). A análise quantitativa foi baseada nos dados dos candidatos a cargos proporcionais nas eleições de 2014 e 2018, disponibilizados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

“Há relatos de pessoas já eleitas que sofreram violência política dentro das suas próprias câmaras legislativas. Mas não só isso. Há casos de ameaça física durante atos de campanha e de cyberbullying, que é outra maneira de constranger”, diz João Feres, cientista político que liderou a pesquisa.

E a vereadora corrobora com o que foi concluído na pesquisa, pois vive essa realidade “Na mesma semana em que o juiz negou meu pedido de tirar do ar as fake news, duas mulheres brancas, a mulher do governador e uma deputada, Janaína Riva, tiveram o mesmo pedido aceito” contou. Edna relata que sente que somente tem suas falas validadas quando uma pessoa branca interfere e concorda com ela.

Diante de tantos ataques, a parlamentar faz planos para se defender: está reunido um grupo de advogados para encaminhar juridicamente os próximos passos. “Aqui a imprensa é totalmente comprometida com a direita, com o bolsonarismo, nós temos muita dificuldade” conta. Mesmo assim, Edna fala sobre resistir para continuar fazendo o que acredita “É muito importante a solidariedade das pessoas que confiam em mim, que acham que eu sou inocente, que é uma injustiça, uma armação e de fato é, a gente vai provar isso.”