Foto: Dan MacMedan/Getty Images

Ana Kinukawa para a Cobertura Colaborativa Cine.NINJA do Oscar 2023

“Viola Davis e a moça diretora têm que se sentar, calar a boca e relaxar”, diz um dos comentários anônimos de um membro votante da Academia publicados pela revista Entertainment Weekly (EW)  três dias antes da cerimônia do Oscar. 

Se para quem está fora desse universo a premiação é o ápice da chiqueza e do glamour, a EW escancarou a farsa das boas aparências, revelando falas machistas, racistas e cheias de todo tipo de preconceito feitas por um ator, um marketeiro, um diretor e um figurinista enquanto comentavam suas apostas para cada categoria no conforto do anonimato. Já é tradição do Oscar revelar essas opiniões anônimas dos membros da Academia sobre as indicações, porém normalmente são acompanhadas de um mínimo de filtro e se limitam a aspectos mais técnicos ou a um deboche saudável, como nos artigos divulgados pela The Hollywood Reporter e pela IndieWire.

Dessa vez nada, nem ninguém foi poupado do caráter duvidoso das falas, principalmente do ator. Desde o desprezo pela atuação e pela importância de uma atriz como Viola Davis à frustração com a edição do ano passado do Oscar, por trazer mais apresentadores negros do que brancos, ou à atenção recebida pelo ator de “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”, Ke Huy Quan, que seria motivada não pelo seu talento, mas pelo sentimentalismo de ver uma criança que ficou sumida por 100 anos reaparecer. Jamie Lee Curtis em “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” foi classificada como uma “farsa”, já que a atriz é parte da realeza de Hollywood e pode se dar o luxo de não usar roupas justas, colocar uma peruca e “mostrar o quão gorda ela é” só para provocar risos. O diretor concorda e acrescenta que, na realidade, votou em Stephanie Hsu simplesmente porque queria que uma asiática ganhasse. 

Outros veículos, influenciadores e vozes ativistas prontamente se posicionaram para condenar as declarações desses quatro profissionais, que compõem os quase 9,5 mil membros votantes da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. O portal Av Club termina seu artigo se perguntando se de fato a misoginia e o racismo do ator anônimo são representativas de uma geração mais velha dos membros da Academia e que ainda exercem influência por onde passam. 

A verdade é que o total de zero pessoas ficou surpresa com o teor e a leviandade dos comentários. Se 81% dos membros da Academia se declaram como brancos e 67%, como homens, é de se imaginar que no backstage devem ocorrer as conversas mais asquerosas e impublicáveis. Porém, ter esses números refletidos em palavras é concretizar sentimentos e denúncias de grupos minoritários e ostracizados na indústria cinematográfica. Uma notícia dessas deve ser confrontada não apenas com revolta, como também com tomadas de ações mais profundas, já que o ator anônimo, ainda que parte da mesma Academia que nos últimos anos vêm anunciando uma série de mudanças voltadas à inclusão e à diversidade, segue com a mesma, senão pior postura. Por mais que sejam entendidos como apenas uma forma divertida de celebrar o Oscar, os comentários anônimos de membros votantes da Academia servem de termômetro para os resultados práticos das medidas tomadas pela organização mais influente nas indústrias cinematográficas de todo o mundo. 

Com informações de EW, Buzzfeed, AvClub, WorldoFreel, NPR e Awards Daily.

Texto produzido em cobertura colaborativa da Cine NINJA – Especial Oscar 2023