Por Alexandre Cunha

A democratização dos meios de comunicação foi pauta no festival É Tudo Verdade, nesta sexta-feira (5), em São Paulo. Dentro da Competição Brasileira de Curtas-metragens, o enérgico filme Utopia Muda (2023) arrancou aplausos acalorados do público presente no Espaço Itaú de Cinema da Augusta. 

Dirigido por Júlio Matos, o curta resgata a trajetória da lendária Rádio Muda, uma das mais expoentes rádios livres do Brasil, fundada na década de 90 no interior da torre da caixa d’água da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Uma iniciativa despretensiosa que, em pouco tempo, se tornou um dos principais pontos de encontro não apenas da comunidade acadêmica, mas de toda a região.

O filme foi feito a partir de 150 fitas de vídeo do arquivo pessoal do diretor. Durante a pandemia, Matos mergulhou por horas no conteúdo gravado, no intuito de redescobrir o que havia de interessante nas imagens. Com uma montagem ágil e extremamente dinâmica, Utopia Muda é um relato de quem viveu a experiência comunitária da Rádio Muda desde o seu início, até os confrontos com o Estado que via na iniciativa uma rádio ilegal, pirata. 

Liberdade de expressão em tempos de pós-verdades

As imagens de arquivo do curta-metragem anteciparam o que viria a se tornar uma problemática global dos últimos anos: o uso da liberdade de expressão como escudo para ataque a grupos minoritários e aos direitos humanos. O filme mostra como um episódio de antissemitismo obrigou aos produtores a tomarem a decisão de cortar determinado programa da grade de exibição.

Inteligentemente, o diretor traz a discussão para o cenário político do país recente, utilizando recortes de falas racistas e criminosas de determinadas “personalidades” brasileiras. Estes que clamam por liberdade de expressão apenas para terem a liberdade de cometerem crimes são os mesmos que festejaram o sepultamento (literalmente com concreto) do espaço da Rádio Muda no campus da Unicamp, em 2017.

Mesmo com as tentativas de silenciamento e extinção da sua “sede”, a Rádio Muda segue viva nos ideais de todas e todos que, diariamente, lutam por uma sociedade verdadeiramente livre, onde o direito à comunicação e à informação se tornem realidade. Podem tentar, mas jamais nos calarão.

Texto produzido em cobertura colaborativa da Cine NINJA – Festival É Tudo Verdade 2024

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