Deputada Zuleyha Gulum, do Partido Democrático dos Povos (HDP) segura placa dizendo ‘A verdade não pode ser obscurecida’, durante votação de projeto sobre notícias falsas, em Ancara. Foto: Adem Altan / AFP

Por Larissa Castro

Nesta quinta-feira (14), o parlamento turco aprovou uma lei que pode condenar com pena de até três anos de prisão pela divulgação de informações falsas, enganação e desinformação. A lei se aplica a jornais, emissoras de televisão e rádio. Portais digitais e redes sociais também se encaixam na regra e deverão entregar dados de usuários que são acusados de disseminar notícias falsas.

A lei possui 40 artigos e define até três anos de prisão por propagar informações falsas sobre a segurança doméstica e internacional da Turquia, ordem pública e saúde com o propósito de gerar “preocupação, medo e pânico público”.

A legislação foi uma proposta do presidente Recep Tayyip Erdogan e enfatiza o controle do governo sobre os meios de comunicação. A aprovação ocorreu com votos do partido do presidente e dos aliados nacionalistas há menos de um ano para as eleições que acontecerão em julho de 2023.

Opositores ao partido de Erdogan, ativistas e países europeus acreditam que a decisão pode destruir a liberdade de expressão. Segundo a ONG Repórteres Sem Fronteiras, o sistema de hiperpresidência de Erdogan não hesita em atacar jornalistas para esconder o declínio econômico e democrático do país e consolidar sua base política. Há relatos de grupos ultranacionalistas, incentivados por discursos políticos contra a imprensa, que atacam, no meio da rua, repórteres, colunistas, comentaristas ou jornalistas cidadãos que cobrem assuntos políticos e evocam a crise econômica.

Oposição

O Partido Popular Republicano afirmou que vai buscar a anulação da lei no Tribunal Constitucional. Os partidos da oposição declaram que essa legislação pode ser utilizada de forma abusiva, o que pode gerar a censura nas redações. O legislador Saruhan Oluc do Partido Democrático do Povo pró-curdo disse: “Vocês estão trazendo a lei de censura antes das eleições de 2023 para que possam silenciar a voz (do público) e da oposição política”.

Após a votação, a Anistia Internacional disse que era “mais um dia sombrio para a liberdade de expressão on-line e a liberdade de imprensa na Turquia”. Segundo Guney Yildiz, pesquisador regional da Anistia “Essas novas medidas permitem que (o governo) censure e silencie ainda mais vozes críticas antes das próximas eleições na Turquia e além, sob o pretexto de combater a desinformação”.

“Prisão para jornalistas”

Durante os anos de poder de Erdoğan, a Turquia tem consistentemente reforçado a natureza restritiva de sua política de liberdade de informação e, portanto, tem levantado muitas críticas de ONGs internacionais. Entre 72 e 97 jornalistas turcos estão presos em 2012, contra 13 no final de 2002, ano em que o AKP, partido do presidente, chegou ao poder. A Repórteres sem Fronteiras (RSF) chegou a descrever o país como a “primeira prisão do mundo para jornalistas“.

Segundo o Ranking Mundial da Liberdade de Imprensa da Repórteres Sem Fronteiras (RSF) a Turquia ocupa a 149ª posição entre 180 países. A lista leva em consideração os indicadores: contexto político, arcabouço jurídico, contexto econômico, contexto sociocultural e segurança. De acordo com a organização, com o autoritarismo ganhando terreno no país, o pluralismo da mídia está mais do que nunca em risco e o país enfrenta um vale tudo para enfraquecer os mais críticos.

Cenário Brasileiro

No Brasil, a liberdade de imprensa também tem sido alvo de ataques. O ano de 2020 foi o mais violento para os jornalistas brasileiros, desde o início da série histórica dos registros dos ataques à liberdade de imprensa feitos pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), iniciada na década de 1990. Foram 428 casos de violência, 105,77% a mais que o já alarmante número de 208 ocorrências, registradas em 2019.

No relatório “Violência Contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil – 2020”, a Fenaj chama a atenção que esta explosão de casos está associada à sistemática ação do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), para descredibilizar a imprensa e à ação de seus apoiadores contra veículos de comunicação social e contra os jornalistas. Ele repete a mesma posição ocupada no ano anterior, quando assumiu a Presidência da República.